O LÓBI DE TRUMP EM ANGOLA,
PETRÓLEO E “SABOTAGEM”
Recentemente, o
diário norte-americano The New York Times publicou
uma investigação sobre um contrato entre o governo angolano e um
lobista próximo do presidente Trump. Esse contrato, no valor de 64 milhões de
dólares, daria acesso à Casa Branca e a vários negócios.
Maka Angola aprofundou
a investigação. O chefe do Serviço de Inteligência Externa (SIE),
tenente-general André de Oliveira Sango, responsabilizou-se pelo dossiê e, ao
que apurámos, envolve a “sabotagem” interna da ida de João Lourenço ao
empossamento de Trump, promessas de financiamento de 50 mil milhões de dólares
e acesso ao petróleo angolano.
O americano em causa
é o lobista Elliott Broidy, e o caso remonta a 2016, quando Donald Trump foi
eleito presidente dos Estados Unidos e, um mês depois, João Lourenço foi
escolhido como sucessor de José Eduardo dos Santos.
Segundo o New
York Times, Broidy “ofereceu” acesso aos eventos VIP para celebração da
tomada de posse de Donald Trump. O pacote incluía o encontro com senadores
republicanos e uma viagem à instância turística privada de Donald Trump,
Mar-a-Lago, na Flórida.
De acordo com o
jornal, “esse tipo de acesso tem valor na arena internacional, onde a percepção
de apoio de um presidente americano – ou mesmo uma foto com este – pode
beneficiar os líderes estrangeiros nos seus respectivos países”.
Conforme a
investigação publicada, a 3 de Janeiro de 2017 Elliott Broidy enviou um email a
dois altos dirigentes angolanos, informando-os sobre o envio de um convite para
as festividades de empossamento e uma proposta de lobbying. O New York
Times identificou um dos dirigentes como sendo João Lourenço, na altura
ministro da Defesa. Na sua investigação, o Maka Angola apurou o
segundo como sendo o director do Serviço de Inteligência Externa (SIE),
tenente-general André de Oliveira Sango.
A proposta de lobby
indicava que a Circinus prestaria serviços de segurança a Angola pela soma de
64 milhões de dólares, durante um período de cinco anos.
Três dias antes do
empossamento de Trump, o governo angolano, de acordo com o New York Times,
efectuou um pagamento de seis milhões de dólares à Circinus, aparentemente dois
milhões a menos do que havia sido previamente acordado. “No mesmo dia, os
angolanos e Broidy encontraram-no no senado com os senadores republicanos Tom
Cotton, do Arkansas, e Ron Johnson, do Winsconsin”.
Entretanto, João
Lourenço não marcou presença na tomada de posse de Trump nem no encontro com os
senadores. A sua viagem aos Estados Unidos foi “sabotada” pela presidência da
República de Angola, conforme apurou o Maka Angola e adiante se
revelará.
Em Fevereiro,
seguindo o New York Times, Broidy escreveu novamente a João Lourenço,
informando-o sobre os seus planos para que este se deslocasse ao complexo
turístico privado de Trump, para um encontro com o presidente dos Estados
Unidos. Broidy falava nos preparativos para a visita, que incluíam encontros no
Capitol Hill (Congresso e Senado) e o departamento do Tesouro. Para o efeito,
exigia o “pagamento imediato” pelos serviços da Circinus.
João Lourenço
deslocou-se aos Estados Unidos em Maio de 2017, onde foi recebido pelo
secretário de Defesa James Mattis.
Já depois de ter
sido empossado, em Setembro do mesmo ano, Lourenço recebeu nova mensagem de
Broidy, em que este se propunha a organizar encontros com Donald Trump e Mike
Pence, para a promoção de melhores relações entre os dois países.
O jornal nota que
Lourenço não se deslocou a Mar-a-Lago e nunca respondeu às mensagens de Broidy.
Por sua vez, a Circinus, empresa de Broidy, não recebeu pagamentos adicionais
para além dos seis milhões de dólares iniciais.
A maka do Sango
O artigo do New
York Times inspirou o Maka Angola a expandir a investigação para
melhor contextualização junto dos leitores angolanos.
Segundo fontes
angolanas familiares com o negócio, Elliott Broidy estabeleceu contacto com o
chefe do SIE, tenente-general André de Oliveira Sango, ainda durante a campanha
eleitoral nos Estados Unidos.
Broidy propunha
acesso privilegiado de Angola, em África, ao poder politico de Trump:
investimentos no valor dos 50 biliões de dólares. Em troca, solicitava acesso
ao petróleo angolano para os interesses privados que representava.
Informado da
proposta, o presidente José Eduardo dos Santos encorajou Sango a prosseguir com
as negociações, tendo passado uma autorização formal para ser presente aos
lobistas associados a Trump.
Para além da
exploração petrolífera, o chefe da inteligência externa angolana discorreu
sobre a importância estratégica de Angola como o baluarte do cristianismo em
África, devido à onda crescente do Islão. Referiu também que Angola é o país
africano que mais assimilou a civilização ocidental, o que lhe confere uma
relação vantajosa com o Ocidente.
Entretanto, a equipa
de Elliott Broidy foi clara em afirmar que a condição sine qua non para
o apoio à futura administração Trump seria a reforma política de José Eduardo
do Santos.
Sango, segundo as
fontes familiares com o dossiê, revelou a intenção de José Eduardo dos Santos
em abandonar voluntariamente o poder, comunicando que já havia um sucessor na
calha.
Foi nesse encontro,
já depois da eleição de Trump, que Sango foi convidado a participar na
cerimónia de empossamento. Um segundo convite foi formulado ao então putativo
sucessor de Dos Santos.
José Eduardo dos
Santos aprovou a representação de Angola na cerimónia de tomada de posse de
Trump, e indicou João Lourenço como o mais alto representante do país.
Por sua vez, as
mesmas fontes enfatizam, João Lourenço mostrou-se bastante animado com o
convite e com a perspectiva de um encontro com Trump.
Uma semana depois,
os convites chegaram a Angola, e Sango cuidou de informar o presidente. Por sua
vez, José Eduardo dos Santos pediu-lhe para trabalhar com o então chefe da Casa
de Segurança do PR, general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”. A
partir daqui, começa a cabala.
Kopelipa duvidou da
autenticidade dos convites. Nessa altura, Kopelipa animava um grupo que
considerava errada a potencial escolha de João Lourenço como candidato do MPLA
e sucessor de Dos Santos.
“O Kopelipa chamou o
Aldemiro Vaz da Conceição para criar confusão. Este, por sua vez, chamou o
embaixador-itinerante António Luvualu de Carvalho, para ir transmitir a João
Lourenço que os convites eram falsos”, relata a fonte.
Luvualu transmitiu o
sucesso da operação a Kopelipa e a Aldemiro, este repescado pelo presidente
João Lourenço como director do Gabinete de Acção Psicológica da Casa de Segurança
do PR.
Contactado por Maka
Angola, o embaixador Luvualu de Carvalho preferiu não comentar a questão.
Sango na ribalta
Na conversa
seguinte, antes da viagem de Sango para a tomada de posse de Trump, José
Eduardo dos Santos transmitiu-lhe o memorando de Kopelipa sobre a “falsidade”
dos convites. Sango seguiu para Washington, onde teve de explicar que João
Lourenço ficou em terra por imperativos da pré-campanha eleitoral.
Sango sentou-se
“três ou quatro mesas depois de Trump”, numa das cerimónias inaugurais do
presidente dos Estados Unidos da América.
Em Luanda, Sango não
só comunicou a João Lourenço os estragos causados pela “sabotagem”, como foi
“discutir” com o seu chefe.
“JES disse apenas
que houve falha do general Kopelipa e que a sua filha Isabel dos Santos
resolveria o assunto, na sua qualidade de amiga da filha de Trump”, revela uma
das fontes.
“Sango disse que o
presidente não devia confundir assuntos pessoais com assuntos de Estado. Falou
da oportunidade desperdiçada devido ao acto de sabotagem de Kopelipa e de
Aldemiro Vaz da Conceição. Colocou o seu cargo à disposição e retirou-se da
sala sem se despedir do presidente”, continua.
Em reacção, Dos
Santos ligou ao general Leopoldino Fragoso do Nascimento, seu indefectível,
para ir falar com o Sango e acalmá-lo. Nessa noite, contam as fontes, Sango
assistiu ao telejornal da Televisão Pública de Angola(TPA), à espera de
ouvir a notícia da sua demissão. Mas a verdade é que se mantém no posto no
actual governo.
João Lourenço
visitou Washington em Maio de 2017, durante a pré-campanha eleitoral, e teve
encontros com o secretário de Defesa dos EUA, James Mattis, assim como com
senadores. Não se sabe, no entanto, se essa viagem fez parte dos esforços de
Elliott Broidy ou de outros lóbis norte-americanos.