ALTO ZAMBEZE PERTENCE ANAÇÃO
LUNDA TCHOKWE
Hoje Angola comemora o Dia da Paz e da Reconciliação. Foi há 16 anos. Nem
de propósito, o bispo do Moxico alertou hoje para as condições de vida naquela
província, nomeadamente no Alto Zambeze, um dos municípios mais isolados de
Angola, maior do que a Holanda ou a Suíça, mas que não tem um só quilómetro de
estrada asfaltada.
Oargentino Tirso
Blanco lidera aquela diocese católica no leste de Angola há dez anos, mas ali
já tinha estado, na mesma função, em pleno período da guerra civil angolana, entre
1986 e 1991. Recorrendo às redes sociais, o bispo católico, criticou a rede
viária até ao Alto Zambeze, que no período colonial (há mais de 43 anos,
portanto) foi um dos maiores produtores de arroz em Angola, ilustrando com
fotos da única picada, totalmente esburacada e coberta de lama, que liga ao
centro daquele município.
Nestas condições, a
viagem facilmente se transforma num “martírio” de dois dias.
“Há 16 anos (4 de
Abril de 2002) que Angola recebeu a paz desde Moxico (fim da guerra civil).
Esta é a única via possível para chegar a Cazombo (comuna capital do Alto
Zambeze), que não tem aeroporto nem comboio”, apontou.
No extremo leste de
Angola, o Alto Zambeze tem 48.000 quilómetros quadrados e apenas 20.000
habitantes, ocupando uma área, por exemplo, semelhante à da Dinamarca. Sem
estradas, a alternativa, segundo o bispo Tirso Blanco, passa por recorrer a
serviços básicos do outro lado da fronteira, na República Democrática do Congo
e na Zâmbia.
O isolamento do
município é agravado nesta altura do ano, devido ao período das chuvas (Agosto
a Maio), com intensa precipitação, que habitualmente deixa várias comunidades
isoladas durante vários dias.
“Em todo esse
território não se encontra onde comprar uma arca, uma geleira, o único hospital
não tem mais que a boa vontade dos médicos. Raio X? Reagentes? Controlar a
glicémica? Só na Zâmbia, depois de uma penosa viagem”, criticou o bispo, que
regularmente usa as redes sociais para alertar para a situação de isolamento da
província do Moxico.
Recordando que foi
no Moxico que acabou a guerra civil angolana, em 2002, com a morte em combate
de Jonas Savimbi (UNITA) e a assinatura dos acordos de paz em Luena, capital da
província, Tirso Blanco diz que é tempo de as várias promessas dos últimos anos
serem cumpridas.
Isto porque, aponta,
a construção da estrada entre o Luena e o Cazombo, de mais de 400 quilómetros,
nunca saiu do papel, apesar de agora voltar a ser colocada em cima da mesa
pelas autoridades locais.
“No ano de 2009
‘ameaçaram’ asfaltar a estrada, mas sem dar explicação a ninguém, os
trabalhadores foram-se embora e até hoje não voltaram. No ano de 2013 outra
empresa começou e fez uma grande movimentação de equipamentos e pessoal
técnico, os trabalhadores foram-se embora e até hoje não voltaram. Agora novamente
escutamos o suave barulho das promessas”, criticou.
“Será desta vez? Até
quando este território, que ocupa uma superfície duas vezes maior que
Kuanza-Norte merecerá ter um pouco de asfalto, pois até agora, nem sequer um
quilómetro tem”, referiu Tirso Blanco.
A difícil situação
da rede viária do Moxico foi admitida também à Lusa, em Fevereiro passado, pelo
vice-governador da província, já que apenas 5% são estradas asfaltadas.
“Neste momento,
infelizmente, em termos de estradas, primárias e terciárias na província não
têm o melhor cenário. Mas nós acreditamos que com os esforços que estão sendo
feitos nós vamos poder reverter esta situação”, admitiu o vice-governador do
Moxico, Carlos Alberto Masseca.
Recorde-se, por
exemplo, que em Janeiro de 2017, quase 1.200 famílias ficaram desalojadas na
província do Moxico, sobretudo na vila de Cazombo, município do Alto Zambeze,
tendo as enxurradas provocado o desabamento de quase 400 casas de construção
artesanal em vários bairros.
Estas famílias –
1.195 – passaram a viver ao relento, em função da falta de meios da protecção
civil em quantidade suficiente para prestar apoio.
A protecção civil
angolana recebeu menos um milhão de euros em 2017, um corte de 5% face ao
Orçamento Geral do Estado (OGE) anterior.
De acordo com o OGE
para 2017, os Serviços de Protecção Civil deveriam receber este ano 3.092
milhões de kwanzas (17,5 milhões de euros), equivalente a 0,04% da total da
despesa do Estado.
O que dizia o Governo em 2014
“Omunicípio
do Alto-Zambeze, com sede na Vila de Cazombo (519 quilómetros a Leste da cidade
do Luena, capital da província do Moxico), está em franco desenvolvimento
social e económico, depois das mágoas do conflito armado.
Hoje,
quem vai ao Cazombo depara-se com uma outra realidade. Encontra construções em
quase todas as sedes comunais. A estrada que liga as sedes municipais do Luau e
Alto-Zambeze está a ser reabilitada e asfaltada, nos seus 260 quilómetros de
percurso, o que irá proporcionar maior fluidez na circulação de pessoas e
mercadorias.
Outra
estrada também em reabilitação e ampliação é a que vai à comuna de Lumbala –
Kaquengue, para depois ligar com o Chavuma (na vizinha República da Zâmbia),
troço com mais de 160 quilómetros.
A
imponente ponte de betão armado construída de raiz sobre o rio Zambeze (a maior
na região Leste do país), com 160 metros de comprimento e duas faixas de
rodagem, inaugurada este ano, facilita a ligação entre as duas margens.
Estas
duas estradas estão a receber obras de restauro e asfaltagem, no âmbito da
ligação rodoviária que se pretende entre os países da Comunidade de
Desenvolvimento da África Austral (SADC).
O
sector da educação também está a conhecer melhorias significativas, no que toca
à construção de novas escolas, para conferir melhores condições de aprendizagem
e de trabalho aos alunos e professores.
Segundo
o administrador adjunto do Alto-Zambeze, José Braz Cassessa, a circunscrição
irá ganhar 114 novas salas de aulas no início de 2015, fruto de várias
infra-estruturas escolares em construção em quase todas as seis sedes comunais
e em Cazombo.
No
próximo ano lectivo será aberto, na sede municipal (Cazombo), o II ciclo do
ensino secundário, cuja escola está na fase conclusiva, para que os jovens
terminem o ensino médio sem necessidades de deixarem as suas famílias.
No
total, o município terá 217 salas de aulas, que vão proporcionar melhores
condições de aprendizagem e absorver mais alunos no sistema de ensino, de
acordo com o director municipal da Educação, Fernando Mununga, que acredita que
há uma grande evolução no sector que dirige.
A
circunscrição dispõe, actualmente, de uma rede de 26 escolas de construção
definitiva para um universo de 27 mil e 744 alunos matriculados no presente ano
lectivo.
Para
a expansão da rede escolar são necessárias mais 96 novas salas de aulas e mais
de 200 professores para se juntarem aos 309 existentes.
Outro
sector imprescindível é o da saúde, onde o município conta com um hospital
municipal, que presta à população serviços de medicina geral, pediatria,
cirurgia, hemoterapia, análises clínicas, radiografia (Raio X) e ecografia, o
que permite aos pacientes tratarem-se localmente, deixando de percorrer
distâncias longas (à Zâmbia por exemplo) a procura dos serviços hospitalares.
Existem,
no município, quatro médicos (de nacionalidades coreana e cubana), coadjuvados
por 62 enfermeiros, distribuídos em 15 unidades sanitárias, entre centros
médicos, postos de saúde, maternidade e um hospital municipal, que prestam
serviços de assistência sanitária às populações.
O
programa de municipalização de saúde está a aproximar os serviços de saúde às
populações e a proporcionar o abastecimento oportuno de medicamentos e
construção de residências para os enfermeiros.
Para
a extensão dos serviços de saúde a todo o território deste município são
necessários outros 120 técnicos, segundo disse o director municipal da Saúde,
Jacinto Caumba Sandeze.
A
malária, doenças respiratórias agudas e parasitárias intestinais são as
patologias mais frequentes no município.
A
agricultura, como factor decisivo para a base alimentar das populações, também
está a conhecer um desenvolvimento rápido e considerável.
Por
exemplo, anos atrás, a população, que adquiria o bombo e o milho (principais
produtos de consumo da população local) nas vizinhas Repúblicas Democrática do
Congo e da Zâmbia, deixaram de o fazer agora, porque a produção local satisfaz
as necessidades alimentares.
Quanto
ao programa habitacional de iniciava Presidencial, 100 fogos estão em
construção, assim como 50 casas evolutivas, respectivamente, para acomodar
quadros administrativos lá colocados e pessoas vulneráveis.
Em
termos de telecomunicações, em Cazombo estão instaladas as redes de telefonia
móvel das principais operadoras nacionais, faltando apenas lojas de apoio aos
clientes.
Também
estão instaladas antenas repetidoras da Rádio Nacional de Angola (RNA) e da
Televisão Pública de Angola (TPA).
Falar
do Alto-Zambeze é igualmente falar dos Luvales ou Lwenas, um povo com uma
cultura rica em rituais, espelhada no Festival Tradicional realizado anualmente
na segunda quinzena do mês de Julho, reunindo pessoas até de países vizinhos,
como a Zâmbia e a RDC, onde também existem falantes do Luvale.
Tudo
isto são benefícios da paz definitiva que o país vive, há 12 anos, que tem como
arquitecto o Presidente da República, José Eduardo dos Santos.
Com
uma extensão territorial de 48.154 quilómetros quadrados e uma população
estimada em 125 mil e 550 habitantes, na sua maioria camponesa, o município do
Alto-Zambeze partilha fronteiras com as Repúblicas da Zâmbia e do Congo
Democrático.
Administrativamente
está subdividido em seis comunas, nomeadamente, Cavungo, Lumbala-Kaquengue,
Calunda, Caianda, Macondo e Lóvua.”
Folha
8 com Lusa