MARCOLINO MOCO E A POLÍTICA DE
CLEMÊNCIA
O político Marcolino José Carlos Moco é uma das figuras de proa da
política angolana e, se considerarmos o palco da mesma como um tabuleiro de
xadrez em que se movem peças para atacar o rei adverso, ele faz facilmente
figura de “bispo” das peças pretas sacrificado pelo seu “rei” na luta contra um
rei das peças “brancas” não identificado, mas suspeito, quiçá um clone do
próprio rei das peças pretas.
Por William Tonet
Aalegoria
vale o que vale mas reflecte bem o que se passou da sua “démarche”
contraditória, enquanto primeiro-ministro, contra o chefe de Estado, José
Eduardo dos Santos.
A
sua carreira política foi decidida por mérito próprio, a favor de uma carreira
académica brilhante. Em 1967, o jovem Moco foi seleccionado para o Seminário
Menor do Espirito Santo, no Huambo. Cinco anos depois, encontrava-se entre os
melhores estudantes, foi seleccionado para o Seminário Maior de Cristo Rei, na
mesma cidade e, alguns anos mais tarde, quando terminou os seus estudos no
secundário, decidiu renunciar à vocação sacerdotal e optou pelos estudos de
Direito, que nessa altura era uma das saídas mais prováveis para quem estivesse
preparado para integrar o ensino superior.
Acontece
que o Direito é uma das áreas que parece melhor combinar com a vocação política
e, uma vez que lhe foi reconhecido brilhantismo académico, o facto de ele ter
enveredado pela carreira política aconteceu o mais naturalmente possível.
Aderiu
ao MPLA nos anos de 1974/5, só que o Huambo, em pouco tempo, transformou-se no
maior bastião da UNITA, mas nem por isso ele abandonou a sua filiação
partidária. Em 1981 alcançou ao cargo, hoje correspondente a segundo secretário
provincial do partido, e em 1985 ascendeu ao Comité Central do MPLA. Foi
nomeado em 1986 governador do Bié e ao mesmo tempo primeiro secretário do
comité provincial do partido nessa província; em 1987 regressou ao Huambo com
as mesmas funções e em 1988 é nomeado ministro da Juventude e Desportos,
ministério do qual ele é o fundador. Depois deu-se o sprint final, em 1991 é
eleito secretário-geral do partido e em 1992 alcança o cargo de
primeiro-ministro.
Não
me vou atardar sobre o sobressalto ocasionado pela sua complicada relação com o
presidente José Eduardo dos Santos, toda a gente está ao corrente da vergonhosa
humilhação a que foi submetido, previsível de ginjeira, pois Moco encontrava-se
numa situação complicada, por um lado ter a necessidade de não colidir com as
vontades da hegemonia de um presidente totalitário, por outro, não dar a
entender perante a sociedade que era uma marionete sua.
Resultado: foi enviado às
urtigas e humilhado publicamente.
Do
político Marcolino José Carlos Moco muito se esperava e a verdade é que ele tem
estado a decepcionar um grande número de políticos, que acreditavam que esse
grande jurista poderia ser uma opção, quer para conservadores como para
renovadores, por ser o menos comprometido com os crimes de peculato e de
corrupção.
Ora
isso fracassou pois ele preferiu o caminho da aliança com um dos lados
contendores. João Lourenço nomeou-o para o apagado e insignificante, para a sua
dimensão, lugar de administrador não executivo da Sonangol.
Terá
Moco atirado a toalha ao chão, resignando-se, acomodando-se, no novo figurino
“lourenciano”? Sou incompetente para responder. Sou, também, um homem, um amigo
triste, pelo subaproveitamento intelectual deste monstro…
É,
por isso, estranho, para quem aguentou as agruras do deserto político sucumbir
ao chegar à praia.
O
lugar de administrador não executivo é uma acomodação e uma demonstração de que
João Lourenço também tem medo deste blindado político e que assim o pode
controlar e comprometer, quando ele poderia regressar ao partido pela porta
grande para fazer justiça à sua saída e aos órfãos que deixou.
A
Moco poderia ter sido dada a oportunidade para concorrer como juiz ao Tribunal
Constitucional, magistrado à Procuradoria-Geral da República ou, na melhor das
hipóteses liderar uma entidade judicial nova como a Alta Autoridade contra a
Corrupção ou ainda uma Provedoria de Fiscalização Jurídica das Entidades
Públicas, com o objectivo de escrutinar e analisar os contratos e dar
provimento a questões de índole jurídico-económica. A mais-valia de Marcolino
Moco não sendo aproveitada na capacidade académica e profissional demonstram o
temor que a sua “rentrée” gerou e gera.
Ademais,
Moco não pode ser considerado um político velho, porquanto ele, mesmo retirado
da política activa, tem uma base eleitoral que nele se revê(ia), não só no Sul,
mas também no Norte e no mundo académico. Por essa única razão não deveria
hipotecar a sua valência pelo simples facto de ter estado contra as práticas de
José Eduardo dos Santos.
Sim,
porque não se compreende de outro modo o facto de João Lourenço ter tratado
Moco como um “clementino”, ao ser acomodado como administrador não executivo,
quando poderia, reconhecendo a sua mais-valia, ter sido nomeado, no mínimo,
também, assessor jurídico da Presidência da República, pois JLo precisaria de
Moco, face à sua maturidade política, o bónus da idade, a relação com todas as
tribos partidárias, a competência académica, na sua qualidade de um dos
melhores constitucionalistas que o país tem (mas não se orgulha), nem o quer
aproveitar.
O
MPLA precisa de cientistas políticos, com projecção interna e externa, capazes
de aliar a matreirice política à capacidade, negocial e académica, por
atravessar várias correntes ideológicas da intelectualidade política da
oposição e sociedade civil.
A
Justiça e o direito ganhariam muito mais com Marcolino Moco, e João Lourenço
sabe-o se ele pudesse emprestar o seu cunho aí.