GRISOGONO, DOKOLO ISABEL DOS
SANTOS E OS DIAMANTES ROUBADOS NA LUNDA TCHOKWE, COLÓNIA CONSIDERADA TERRA
ANGOLANA
A
joalharia de luxo suíça De Grisogono, detida por Isabel dos Santos e o marido,
pretende cortar 41 postos de trabalho, que justifica com a quebra nas vendas,
decisão que surge depois de a estatal angolana Sodiam ter saído daquela
empresa.
Na informação
disponibilizada pela De Grisogono, criada por Fawaz Gruosi em 1993, a joalharia
de luxo que tem a filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos e o
marido, Sindika Dokolo, como investidores, refere que o corte no número de
trabalhadores, 31 na Suíça, num total de 104, e mais 10 noutras representações
internacionais da marca, deve-se à necessidade de reduzir a capacidade de
produção.
A marca de luxo
admite que as vendas ficaram aquém das expectativas e que terá de reduzir o
nível de produção interno, actualmente “excessivo”, tendo uma estrutura de
suporte “parcialmente sobredimensionada”, em face das “desafiantes condições em
alguns mercados-chave” para aquela joalharia.
O objectivo, refere
ainda, é “reduzir custos” e “reposicionar-se para um crescimento sustentável”.
A De Grisogono abriu
esta semana um processo de consulta aos trabalhadores, para o corte de 41
empregos, o qual termina a 23 de Abril. A 27 de Abril, a empresa pretende
anunciar se avança ou não com este plano, esclareceu ainda.
A 1 de Dezembro de
2017, a empresa pública angolana Sodiam, responsável pela comercialização dos
diamantes do país, anunciou a saída da sociedade que controla a holding do
grupo De Grisogono.
A informação foi
transmitida na altura, em comunicado, pelo Conselho de Administração da Sodiam,
que desde 6 de Novembro é liderado por Eugénio Bravo da Rosa, nomeado pelo novo
Presidente angolano, João Lourenço, que exonerou a anterior presidente, Beatriz
Jacinto de Sousa, nomeada seis meses antes por José Eduardo dos Santos.
A Sodiam, empresa
pública (EP), “comunica que por razões de interesse público e de legalidade” o
seu Conselho de Administração “adoptou hoje”, em reunião extraordinária, “um
conjunto de deliberações tendo em vista a sua saída da sociedade de direito
maltês Victoria Holding Limited”. Por via desta, a Sodiam refere que detém, de
forma indirecta “uma participação societária minoritária na sociedade holding
do grupo joalheiro De Grisogono”.
“A participação da
Sodiam EP na Victoria Holding Limited, e indirectamente no grupo De Grisogono,
gerou, desde a sua constituição, em 2011, exclusivamente custos para a Sodiam,
em virtude quer dos financiamentos bancários que contraiu, quer dos resultados
negativos que têm sido sistematicamente apresentados pelo grupo, decorrentes de
um modelo de gestão adoptado a que a Sodiam EP é e sempre foi alheia”, referiu
o comunicado de então.
A joalharia De
Grisogono é liderada pelo casal Isabel dos Santos e Sindika Dokolo, tendo
comprado em 2016 o maior diamante encontrado em Angola, que foi transformado
numa jóia rara de 163,41 quilates leiloado a 14 de Novembro pela Christie’s,
tendo rendido 33,7 milhões de dólares (28,3 milhões de euros).
Desde que foi
empossado no cargo, a 26 de Setembro, e entre outros sectores, João Lourenço
mexeu por completo nas administrações das empresas diamantíferas públicas.
Além da Sodiam,
exonerou Carlos Sumbula de Presidente do Conselho de Administração da Empresa
Nacional de Diamantes (Endiama), concessionária estatal do sector, cargo que
ocupava desde 2009, tendo nomeado para o seu lugar o economista José Manuel
Ganga Júnior, que até 2015 foi director-geral da Sociedade Mineira de Catoca,
responsável por 75% da produção diamantífera anual angolana.
“Acreditamos que os
empossados são pessoas à altura para organizar a comercialização dos nossos
diamantes, no sentido de melhor servir a nossa economia”, exortou João
Lourenço, a 3 de Novembro, quando deu posse à nova administração da Sodiam.
Queda vertiginosa? Talvez não
Fundada em 1993 e
com clientes como Sharon Stone ou Kim Kardashian, a compra da joalharia foi
feita em 2012 através da empresa “Victoria Holding Limited”, uma parceria entre
a empresa do regime Sodiam e uma empresa privada, “Melbourne Investments”, que
tem o marido de Isabel dos Santos, Sindika Dokolo, como o único proprietário.
Segundo a revista
Forbes, “não é claro que Dokolo tenha feito algum investimento financeiro na
Melbourne Investments ou se a Melbourne contribuiu com dinheiro para a compra”.
“A Sodiam, enquanto
empresa estatal (a sua equipa de gestão, o presidente e director-executivo são
todos nomeados pelo presidente José Eduardo dos Santos), é obrigada a declarar
publicamente todos os seus negócios no país e no estrangeiro, mas até agora a
parceria com Dokolo era um segredo”, escreveu a Forbes em 2014, dois anos
depois da compra.
Em 2016, a De
Grisogono comprou o diamante bruto mais caro do mundo, o Constellation, de 813
quilates, por 63.1 milhões de dólares (cerca de 60 milhões de euros). Também em
2016, comprou um diamante de 404 quilates e sete centímetros de comprimento, o
maior alguma vez encontrado em Angola, por uma quantia não divulgada. No mês em
que foi encontrada esta pedra, outros sete diamantes de grandes dimensões foram
descobertos numa mina na província da Lunda Norte, uma zona muito pobre onde
não existe electricidade ou ligações telefónicas em grande parte do território.
Na campanha
presidencial de 2012, no entanto, segundo o que foi divulgados publicamente,
também pelo Folha 8, o presidente José Eduardo dos Santos queixou-se de que as
receitas da extracção de diamantes na região não chegavam “sequer para pagar as
estradas”.
A De Grisogono até
há bem pouco tempo era uma pequena empresa onde trabalhavam 150 pessoas, em
Plan-les-Ouates, perto de Genebra, na Suíça.
Com boutique na
Madison Avenue, em Nova Iorque, mas PME de importância mediana no ramo da
joalharia e relógios de luxo, de repente, eis que ficamos a saber que essa
“cambuta” ambiciona ser líder mundial desse sector.
A razão foi (é) uma
pedra, grande, um diamante que aterrou na sua mesa como que caído do céu ou por
encanto, dando origem a uma mega festança que reuniu 700 VIP’s, modelos de
“passerelle” e actrizes, organizada em Maio de 2016 por ocasião do Festival de
Cinema de Cannes no Eden Roc e com ampla mediatização na imprensa
internacional.
O fundador, PCA e
director artístico da De Grisogono, Fawaz Gruosi, a partir daí começou a ver o
futuro da sua empresa em tons de azul e ouro, com notas verdes pelo meio,
depois de ter comprado a referida pedra, excepcional, um diamante angolano de
404 quilates, então recentemente encontrado na mina de Lucapa, província da
Lunda-Norte.
“Estou muito
nervoso, este diamante tira-me o sono, é a primeira vez que me preocupo por não
ser capaz de fazer o que tenho que fazer. A minha responsabilidade é enorme”,
disse Fawaz Gruosi, solicitado a comentar, na sua boutique de Nova Iorque, a
descoberta do pedregulho. Responsabilidade tão grande que Gruosi não se
aventurou a lapidar o mambo sozinho e recorreu aos serviços do prestigioso
lapidário nova-iorquino Ben Green.
Compreensível, pois
a verdade é que, com o “404”, a sua empresa e ele próprio mudavam de estatuto,
como alegou um especialista do ramo diamantífero em Genebra. “Em geral, este
tipo de aquisição é reservado às maiores empresas, como a Graff ou a Winston”,
disse ele.
Trata-se, de facto,
de um golpe de mestre. O “404” era o maior diamante jamais descoberto em Angola
e nunca a marca De Grisogono tinha obtido uma pedra deste calibre.
Mas vamos com calma…
por essa altura, o que de maior reboliço e irritação grassava na área
diamantífera entre os concorrentes da De Grisonogo, era o ciúme, a sua
meteórica ascensão e a exageradamente dispendiosa maneira de divulgar a
existência desse diamante na supra-citada gala VIP no Eden Roc, organizada no
em pleno Festival de Cinema de Cannes, em Maio de 2016.
Por outro lado,
sejamos francos, a De Grisogono podia dar-se ao luxo de ser generosa. Porque a
sua marca, contas bem feitas, tem aliados que lhe permitem desempenhar um papel
de liderança.
Recapitulemos. Em
2012, a empresa foi adquirida – por meio de uma montagem ad hoc, offshore –
pelo empresário Sindika Dokolo, marido de Isabel dos Santos.
Monsieur Dokolo
avançou com 100 milhões de francos suíços destinados a transformar a De
Grisogono num cliente privilegiado de diamantes angolanos destinados à
joalharia. Vai de si que, com a compra do “404”, esta visão estratégica se
concretizou na prática de maneira deveras espectacular.
Por outro lado,
Sindika Dokolo também está por trás da Nemesis, uma empresa de diamantes em
Dubai. De acordo com o seu director, Nicky Polak, foi ela, a Nemesis, que
comprou o “404” à empresa estatal angolana, Sodiam, antes de vender os seus
direitos à De Grisogono (que não pagou nem um Luei, só pagaria no final da
lapidação e receberá lucros que se contam em milhões de dólares).
Portanto, não é
preciso ser perito em economia para ver neste lance que o diamante passou de
uma empresa do Estado, controlada pela filha do então presidente da República,
Sodiam, para as empresas privadas, Nemesis e De Grisogono, que são propriedade
de Sindika Dokolo, marido da dita filha do ex-presidente.
Folha 8 com Lusa