“A QUESTÃO DA NAÇÃO LUNDA
TCHOKWE 1885 – 1894”
Do conflito entre
Portugal e a Bélgica de 1890 á convenção de Lisboa de 1891 sobre a LUNDA
Enquanto as expedições belgas e as expedições
portuguesas na LUNDA tratavam de
fazer ocupações e de justificá-las com TRATADOS
DE PROTECTORADOS assinados com os potentados ou Soberanos LUNDAS, decorria
em Lisboa a Conferência para solucionar a questão.
O Litígio foi-se resolvendo aos poucos: depois de
muitas diligências de ambos os Governos, assinou-se o ACORDO para a
negociação direita; veio depois a Conferência, e, finalmente, a Convenção,
que pôs fim ao diferento. É o que vamos descrever a continuação.
O ACORDO SOBRE A QUESTÃO
DA LUNDA, ANTECEDENTES.
No prosseguimento das diligências havidas entre
Portugal e o Estado Independente do Congo, e já descrita ao longo do dossier
que temos vindo a divulgar neste Blog, propôs o Governo Portugués que, antes de
tudo, fossem «EXAMINADOS DE BOA FÉ»,
e confrontados com ânimo conciliador, os títulos de “TRATADOS DE PROTECTORDOS CELEBRADOS ENTRE PORTUGAL E TODOS OS
POTENTADOS LUNDAS” e fundamentos do direito que Portugal possuia com
relações às terras do Muantiânvua, conjuntamente com aqueles que o Estado
Independente do Congo pudesse produzir para justificar a resolução de estender
a sua soberania, ou a sua esfera de influência, a esses territórios,
compreendidos entre o curso do Cuango e o limite descrito na declaração de 1 de
Agosto de 1885.
Para esse efeito poderiam reunir-se em conferência, em
Lisboa, num prazo que o governo portugues estimaria que fosse breve,
representantes devidamente autorizados de Portugal e do Estado Independente do
Congo, assistidos por delegados técnicos particularmente versados nos assuntos
relativos àqueles territórios.
No dia 12 de Novembro de 1890 o delegado de Portugal em
HAIA Holanda, Visconde de Pindela,
mandou ao ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros um
telegrama em que lhe comunicava que um director da Companhia Africana do
Roterdão, A de Bloeme, que tinha estado na Conferência de Berlim como delegado
técnico da Holanda, se oferecia para prestar declarações sobre a questão de
limites do CUANGO, afirmando que os
limites do Estado Independente do Congo foram em Berlim determinados por ele e
pelo General Strauch, agora afastado da Administração do Estado Independente do
Congo.
Em resposta, no mesmo dia, o ministro dos Negócios
Estrangeiros autorizou-o a aceitar a declaração, na conveniência de guardar
absoluta reserva por causa das negociações em curso.
Em 15 do mesmo mês e ano de 1890, o Visconde de Pindela
escreveu a A. Bloeme a solicitar as ditas declarações.
No dia 24 respondeu este, afirmando que em Berlim não
houve qualquer questão para considerar « OS
TERRITÓRIOS DO MUATIÂNVUA» dentro do Estado Independente do Congo.
No dia 17 de Dezembro de 1890, Barbosa du Bocage fez
comunicar a todas as Legações de Portugal o conteúdo da questão e a posição
Portuguesa. Esta decisão de informar os ministros de Portugal era de conveniência
e necessidade.
Na verdade, até pelo menos aos fins de Agosto 1890, o
ministro da FRANÇA e o encarregado
de negócios da ALEMANHA em Bruxelas
eram completamente alheios e ignorantes da questão e desprovidos de quaisquer
instruções especiais, no tocante ao assunto, dos respectivos governos.
O encarregado de negócios da Alemanha em Bruxelas,
chegou a procurar o ministro dos negócios estrangeiros de Portugal naquela
cidade, com o fim ostensivo de lhe pedir informações e esclarecimentos acerca
da pendência para os enviar ao seu Governo.
No dia 20 de Dezembro de 1890, um telegrama de Legações
de Portugal em Bruxelas para Lisboa informava que o ministro da Bélgica tinha
dado PLENOS PODERES e entregue nota,
declarando, em nome do Governo do Estado Independente do Congo, aceitar a
negóciação direita acerca da “QUESTÃO DA
NAÇÃO LUNDA TCHOKWE”, nos termos da proposta de Portugal.
Idêntica comunicação fazia Eduardo de Grelle Rogier,
ministro da Bélgica em Lisboa, a Barbosa du Bocage, em que dizia:
«(...)
Le gouvernement de Sa Majesté Le Roi Souverain accept le mode d’arrangement
auquelle gouvernement de Sa Majesté Très-Fidèle a exprimé le désir de recourrir
aplanir le différend qui s’est élevé au sujet de l’interpretation de la
convention conclue le 14 février 1885 entre le Portugal et l’Association
International Africaine pour la délimitation des frontiéres respectives.
Le
Roi Souverain a daigné me confier la mision de signer, en qualité de
plénipotentiaire de Sa Majesté, tout acte préalable aux négotiations qui
devront s’ouvrir à Lisbonne eu vue de discuter les bases d’une entente de
nature à mettre fin au conflit.
Les
pleins pouvoirs que j’ai reçus à cet effet et que j’ai l’honneur de communiquer,
sous ce pli, à V.E. m’autorisent en méme teps à représenter le gouvernement de
l’Etat Indépendent du Congo dans la conférence à instituer dans le but
d’examiner les droits de deux puissances à la possession du territoire du
LUNDA, comme aussi à signer, sous réserve de l’approbation de Sa Majesté le Roi
Souverain, les actes arrétés à la suite des négotiation poursuivies dans le
cours de cette conférence.(...)
DOS ANTECEDENTES AO
ACORDO, CONFERÊNCIA DE LISBOA
Antes de falarmos da conferência de Lisboa e das suas
sessões de trabalho, gostaria resumir os resultados da conferência e o
acordo entre os Governos de Portugal e do Estado Independente do Congo
sobre a QUESTÃO DA NAÇÃO LUNDA TCHOKWE,
assinado em Lisboa em 31 de Dezembro de 1890 por Barbosa du Bocage e Eduardo de
Grelle Rogier.
PELO
ARTIGO 1.º - ambos os governos
diligenciariam « resolver por meio de uma negóciação directa, que teria lugar
em Lisboa, a divergência acerca da interpretação da Convenção celebrada em
Berlim em 14 de Fevereiro de 1885 entre Portugal e a Associação Internacional
Africana, quando decorria a conferência da partilha de África, no que respeita
ao exercicio da influência e ao direito da soberania nos territórios
compreendidos entre o curso do Cuango e o 6º paralelo de latitude sul e a linha
divisoria das águas que pertencem á bacia do rio Cassai entre os paralelos 6º e
12º de latitude sul».
«No caso dos (sic) plenipotenciarios
respectivos não poderem chegar directamente a um acordo, o governo de Sua
Majestade Fidelissima e o governo do Estado Independente do Congo
comprometem-se á mediação de Sua Santidade o Sumo Pontifice Leão III» (artigo
2.º).
No caso de não se chegar por vía de mediação a
estabelecer o acordo sobre o ponto em lítigio, comprotem-se os dois governos a
submeter a questão à arbitragem de uma potência amiga (artigo 3º).
– Luciano Cordeiro em carta ao
ministro e secretário dos Négocios Estrangeiros manifestou o seu desagrado
deste modo (...) A notícia de se ter acedido a submeter esse direito a uma
revisão arbitral, que lança a incerteza sobre os interesses da nossa quase
exclusiva exploração e influência comercial naquela região, não pode deixar de
sugerir inquietação (...).
A PRIMEIRA SESSÃO DA
CONFERÊNCIA «o status quo»
Foi no dia 19 de Fevereiro de 1891 a primeira sessão da
Conferência de LISBOA SOBRE A QUESTÃO DA
NAÇÃO LUNDA TCHOKWE. Abriu-a Carlos Roma du Bocage, que começou por saudar
os delegados belgas, e exprimiu o desejo « de
ver as negóciações chegar a um resultado de natureza a estreitar os laços de
amizade e de boa vizinhança entre Portugal e o Estado Independente do Congo».
Edouardo de Grelle Rogier agradeceu e declarou «que, por seu lado, o Governo do Rei Soberano, animado
dos mais amigaveis sentimentos para com Portugal, desejava chegar a uma solução
conciliadora».
A primeira questão de que se ocupou a Conferência foi a
do “STATUSQUO”. O Plenipotenciario
do Estado Independente do Congo propós o de 30 de Dezembro de 1890.
Roma du Bocage não concordou, por ser desconhecido o estado
de coisas da NAÇÃO LUNDA TCHOKWE naquela data, e propós o “STATUS QUO” de 10 de Junho. Édouard de Grelle propós, então, a data
do dia em que a Conferência tivera inicio, proposta com que o plenipotenciário
de Portugal concordou AD REFERENDUM
dos dois Governos, e acordou-se em que estes telegrafassem ás suas autoridades
em AFRICA para que as expedições
respectivas cessassem todos os actos ulteriores de OCUPAÇÃO.
Carlos Roma du
Bocage declarou em seguida que o
Governo Português não deixaria «de declarar formalmente que não reconhecia
validade alguma, em matéria de direito, a nenhum acto que tivesse sido
praticado nos (...) territórios da NAÇÃO LUNDA TCHOKWE em data posterior à do decreto de
Sua Majestade o Rei Soberano de 10 de Junho de 1890 (...)», e que, «
considerando o decreto precitado contrário ao espirito da (...) Convenção de 14
de Fevereiro de 1885, não poderia admitir como fundados em direitos factos que
resultassem de um documento contra o qual protestou (...)».
Édouard de Grelle defendeu-se, dizendo que o valor dos actos de
possessões do Estado Independente do Congo que visava a declaração do
plenipotenciário de Portugal, assim como dos actos anteriores a 10 de Junho de
1890, não podia ser contestado, qualquer que fosse a interpretação da convenção
de 14 de Fevereiro de 1885.
Porquanto, a validade destes actos podia ser discutida
se, como sustentava o Estado Independente do Congo, os limites das suas
possessões haviam sido fixados em todo o CURSO
DO CUANGO; válidos seriam ainda se, como pretendia Portugal, a fronteira
deste Estado demorasse no paralelo 6º de latitude sul, «porque, nesta hipotese,
nenhuma razão impediria o Estado do Congo de, ao mesmo título que qualquer
outra potência, fazer actos de ocupação nestes territórios como em todos os
outros ainda não ocupados.
Pelo contrário, os actos de ocupação de Portugal
seriam, aos olhos do Estado do Congo, absolutamente nulos, visto que, segundo a
sua interpretação da Convenção de 1885, ele os considerava como violação dos
direitos que lhe reconhecia esta convenção».
Na sua opinião, não podia, portanto, o Governo
Português contestar a validade dos actos de ocupação levados a cabo pelo Estado
do Congo na Lunda, e não reconhecia este, por seu lado, qualquer valor aos que
Portugal praticou anteriormente à data do STATUS
QUO.
Carlos Roma du Bocage respondeu a Édouard de Grelle que
só estavam em causa, na sua anterior declaração, os actos de ocupação
realizados por via do decreto de 10 de Junho de 1890, publicados no dia 10 de
Agosto do mesmo ano pelo jornal L’edependence.
Seguidamente, o plenipotenciário Português apresentou
um projecto de instruções a fim de serem expedidas pelos dois Governos aos seus
representantes em AFRICA, para
suspenderem toda a ulterior ocupação na LUNDA,
projecto esse que, no caso de aprovação pelos Governos, os plenipotenciários
dos dois Estados acordariam na data da sua comunicação simultánea e telegrafica
para a AFRICA.
(...)«Veuillez ordonner
immédiatement au lieutenant Sarmento, représentant du Gouvernement Portugais
dans les territories du Muatianvo, qu’il a’abstienne d’entreprendre, soit de
nouvaux actes de souveraineté, soit de nouvelles occupations de territoires
dans le PAYS DE LUNDA, afin d’éviter tout conflit, autant qu’il sera en son
pouvoir, pendant la durée des négotiations qui viennent de commencer entre le
Gouvernement de Sa Majesté et l’Administration Génerale de l’Etat Indépendant
du Congo au sujet de l’exercise de la Souveraineté dans les dits territoires»
(Livro Branco sobre a Questão da Lunda, doc. N.º 26, protocolo nº 1 pg.39) Era assim o projecto português.(...)