quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Dossiers LUNDA X - CONFLITO ENTRE PORTUGAL E BÉLGICA, SURGIMENTO DA QUESTÃO DA LUNDA 1890 – 1894.


CONFLITO ENTRE PORTUGAL E BÉLGICA, SURGIMENTO DA QUESTÃO DA LUNDA 1890 – 1894.

Os problemas de África são, e serão, ainda, por muito tempo, o pesadelo da Europa e do Mundo.
A conferência de Berlim ( 14 de Novembro de 1884 – 26 de Fevereiro de 1885), com o acto Geral assinado por todos os participantes no próprio dia da clausura, traçou as linhas gerais da maquinação da África. Portugal, após o tratado do Zaire com a Inglaterra, a 26 de Fevereiro de 1884, promovera-a para acautelar alguns dos seus interesses, fortemente contestados pela França e pela Alemanha.
As conferências de Berlim (1884-1885) e de Bruxelas (1889-1890), com o acordo de Paris (9 de Fevereiro de 1891) nada mais fizeram que pô-lo de manifesto, sem cerimónia. É, neste ambiente de competições desenfreada dos grandes à custa dos pequenos, que se situa a chamada « QUESTÃO DA LUNDA» (1885 – 1894).
Portugal celebrara com a Associação Internacional Africana a Convenção de 14 de Fevereiro de 1885, que permitiu ao Estado Independente do Congo, sucessor da Associação, defender que, nos termos do artigo 3.°, Angola tinha as suas fronteiras ao longo do Rio Cuango.

Artigo III (Convenção de 14/02/1885)

“ Sua Magestade El-Rei de Portugal e dos Algarves e a Associação Internacional do Congo adoptam para fronteiras entre as suas possessões respectivas na Africa occidental a saber:
Ao norte do Zaire (Congo), a recta que une a embocadura do rio que se lança no oceano Atlântico, ao sul da bahia de Cabinda, junto de Ponta Vermelha, a Cabo Lombo; o parallelo d’este ultimo ponto prolongado até à sua intersecção com o meridiano da confluência do Cula-Calla com o Luculla; o meridiano assim determinado até ao seu encontro com o rio Luculla, o curso do Luculla até à sua confluência com o Chiloango (Loango-Luce).
O curso do rio Zaire (Congo), desde a sua foz até á confluência do pequeno rio Uango-Uango; o meridiano que passa pela foz do pequeno rio Uango-Uango entre a feitoria hollandeza e a feitoria portugueza, de modo que deixe esta ultima em território portuguez, até ao encontro d’este meridiano com o parallelo de Noqui; o parallelo de Noqui até á sua intersecção com o rio Cuango (Kuango); a partir d’este ponto na direcção do sul curso do Cuango (Kuango).”
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Para lá deste rio, os Portugueses pisavam há muito as terras da LUNDA, os domínios do Muatiânvua, com quem haviam celebrado tratados de Protectorado.

Se é certo que, da parte de Portugal, não havia ali uma ocupação efectiva, também a não havia do Estado Independente do Congo. Pesados os direitos de ocupação e domínio ali de ambas as Potências, a balança pendia evidentemente para Portugal.

O Estado Independente, porém, atido à interpretação de que o curso do Cuango era, na Convenção celebrada, a fronteira entre Angola e o seu território, publicou no seu Boletim Oficial de 9 de Agosto de 1890 um decreto assinado por Leopoldo II em 10 de Junho, que criava o distrito do Cuango Oriental, com as terras situadas para lá do Cuango até aos distritos do Cassai e Lualaba.

A NOTÍCIA SURPREENDE PORTUGAL
Surpreendidos com o artigo da edição da noite de domingo dia 10 de Agosto de 1890, n.º 221 de L’Independence Belge de Bruxelles, 5 anos após a conferência de Berlim...
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AFFAIRES DU CONGO
«Le siécle a publié hier un entrefilet disant: qu’il serait question d’attribuer à L’Etat du Congo toule la region du Haut Kassai connue sous les noms Lunda ou Muta-Yamvo, qui figure sur les cartes portugaises comme appartenant à la colonie portugaise de Lianda.
Suivant nos renseignemants, la constatation du siécle ne révélé, a proprement dire, rien de nouveau et il est inexact de présenter comme un «agranddissement de L’Etat du Congo», L’etat de choses comprenant le territoire de Lunda, autrement dit le royaume de Mouata Yamvo, dans le teritoire de L’Etat Libre.
La traité du 14 février 1885, entre le Portugal et L’Association Internacionale africaine, ayant désigné le cours du Kouango comme frontiere respective du Portugal et de L’etat Libre du Congo, L’Etat Libre a toujours considéré la région indiquée par le Siécle commo comprise dans sa spéhré d’activité.
Et en fait, déjá organisée administrativement, cette region est devenue, sous le nom de «Kouango oriental», le douziéme district de L’Etat Libre. Le district en question s’étend entre le Kouango et les distrits du Kassai et de Loualaba. Le lieutenant Dhanis, qui avait déjà rempli plusieurs mission au Congo, en est nommé commissaire.»
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Portugal protestou, por considerar a LUNDA zona sua de influência e expansão. O rei dos Belgas exaltou-se, indo ao ponto de mandar adquirir um velho barco de guerra nas docas de Londres para trazer a Lisboa um ultimatum... Assim nasceu a QUESTÃO DA LUNDA.
O bizarro projecto de Leopoldo II foi abandonado, mas o Estado Independente do Congo teimou nos seus intentos. Movimentou-se a diplomacia de ambos os lados, e, das diligências, chigou-se a Acordo, assinado em Lisboa no dia 31 de Dezembro de 1890, para dirimir o pleito por meio de uma negociação directa.
Daí adveio a conferência de Lisboa, de 25 de Maio de 1891, em que os delegados de ambas as partes tiveram ocasião de aduzir os seus argumentos.
Da conferência resultou a chamada Convenção de Lisboa, que afastou o Estado Independente do Congo para lá do Cassai.
Para dar execução a esta Convenção, cada um dos Estados contratantes nomeou o seu comissário de limites. A tarefa, aparentemente aplanada pelas negociações antes havidas, foi morosa e dificil: morosa, porque o Estado Independente do Congo adiou quanto pôde a nomeação do seu comissário; dificil, porque as condições politicas na LUNDA tinham sido substancialmente alteradas pelo predominio imposto pelos TCHOKWES aos seus SOBRINHOS LUNDAS, numa guerra de razias e queimadas. Quando a comissão de limite chegou ao rio Luchico, achou por bem retirar-se por não poder enfrentar os Tchokwes, que se manifestavam hostis. Além disso, temia-se grande mortandade provocada por uma epidemia de varíola, que, desde o rio Uhamba, vinha alastrando entre as expedições dos dois comissários. Em vista destes acontecimentos, houve necessidade de fixar fronteiras provisórias.
O tratado ou a ractificação da acta dos limites na Lunda, assinado pelos dois Comissários de limites no dia 26 de Junho de 1893 é uma prova eloquente, da separação do Estado da Lunda Tchokwe de Angola e do Congo de Leopoldo II. São provas que dispensam qualquer comentario, que o DOSSIERS LUNDA vai continuar a publicar neste Blog para o conhecimento profundo da nossa legitima defesa.

OBS: PROXIMOS DOSSIERS
1. Auto de concessão da Bandeira Nacional Portuguesa a Mona Quissuássua (Soberano Lunda Tchokwe)
2. Acordo entre os Governos de Portugal e do Estado Independente do Congo sobre a questão da Lunda
3. Convenção relativa á delimitação das espheras de soberania e de influencia de Portugal e do Estado Independente do Congo na região da Lunda, assinado em Lisboa a 25 de Maio de 1891, Ractificações em Bruxelas a 24 de Março de 1894, e trocadas as assinaturas a 1 de Agosto do mesmo ano
4. Ractificação da acta das fronteiras na Lunda
5. Auto de declarações prestadas pelos impungas da soba N’guri A’cama do Mussuco em 4 de Junho de 1891
6. Auto de declarações prestadas por Mona – N’guello, grande e herdeiro do Estado de Capenda Camulemba. Cabangue sobrinho do soba Quitupo-Cahando e Zenga sobrinho do soba Quizaze
7. Varios oficios trocados entre o Tenente Dhanis e Simão Candido Sarmento sobre a Lunda
8. O Decreto de 13 Junho de 1895, primeiro Governador Geral Português no Estado da Lunda
9. A fundação do ATCAR em 1951 e a Lei 8904 em 1955
10. Memorias da Lunda, por Henrique Augusto Dias de Carvalho, escritos em 1890
11. O Manifesto Jurídico Sociológico e a Reivindicação da Autonomia da Lunda Tchokwe 2006-2007
12. As prisões arbitrarias a luz do direito e as convenções internacionais sobre a causa do Estado da Lunda Tchokwe.