Afinal, o que aconteceu no Huambo?
A UNITA e a
associação Mãos Livres estão a conduzir investigações paralelas para tentar
perceber o que aconteceu no Huambo, após a morte de várias pessoas em
confrontos entre a polícia e fiéis da seita "A Luz do Mundo".
Enquanto uma
delegação Parlamentar da UNITA prossegue a sua missão na província angolana do
Huambo, onde na semana passada morreram vários polícias e fiéis da denominada
igreja "A Luz do Mundo", em Luanda, a associação angolana Mãos Livres
anunciou que está a realizar uma "investigação independente" face às
diferentes versões quanto aos acontecimentos e ao número de mortos.
A associação Mãos
Livres, uma ONG de defesa dos direitos humanos, quer fazer um levantamento real
de quantas pessoas morreram e em que circunstâncias, nos confrontos que tiveram
lugar entre a polícia e os seguidores da seita do 7° dia “A Luz do Mundo”, no
passado dia 16 de abril na Serra Sumé, na província angolana do Huambo.
Em entrevista à DW
África, o advogado David Mendes, que lidera a investigação lançada pela
associação Mãos Livres, falou das questões prévias que vão ser lançadas numa
audiência já solicitada ao Procurador Provincial do Huambo.
“Queremos que nos
seja garantido o acesso independente, sem qualquer coação para os locais, e que
nos permitam que contactemos as pessoas de ambos os lados: tanto da parte da
polícia como da parte do Governo, para que possamos então trabalhar sem
quaisquer constrangimentos. E a partir daí também garantimos que não passaremos
qualquer informação pública enquanto não concluirmos as investigações.”
“Onde houve mortes, não há como eliminar
todas as provas”
Os incidentes ocorreram há mais de uma semana e por isso as provas no terreno já poderão ter sido removidas. Ainda assim, David Mendes acredita que um trabalho de investigação independente é possível.
“Acreditamos que haverá provas indiretas. Podemos não ter provas diretas, por várias razões, mas teremos as provas testemunhais. Onde morreram pessoas não há como se ocultar os cadáveres, não há como eliminar as testemunhas. Acreditamos que onde houve mortes, houve feridos e houve pessoas que fugiram, e essas pessoas poderão dar o seu testemunho acerca do que ocorreu", declarou o advogado.
Quando questionado acerca da presença no terreno de uma delegação Parlamentar da UNITA, que também realiza a sua investigação sobre os acontecimentos de 16 de abril, e sobre se isso não seria uma duplicação de trabalho e de esforços, o advogado das Mãos Livres afirmou que: “A investigação da UNITA é uma investigação política. Nós queremos fazer uma investigação neutra, sem qualquer posicionamento prévio, sem qualquer posicionamento político. Queremos uma investigação de factos. São os factos que nos poderão levar à verdade acerca do que se passou.”
A delegação
Parlamentar da UNITA chegou na quinta-feira (23.04) ao Huambo, onde vai
permanecer até domingo (26.04). Raul Danda, o líder parlamentar do movimento do
Galo Negro, falou com a DW África.
“Estamos perante
informações bastante desencontradas. Nós recebemos informações públicas de que
para além do número já conhecido de nove polícias, se falava também em 13
civis. Este número foi confirmado pelo Segundo Comandante Geral da Polícia. Por
sua vez, o Secretário de Estado do Interior, Eugénio Laborinho, fala em 20
civis. Para um mesmo caso, não pode haver dois números diferentes: ou um deles
é falso, ou são os dois. Por isso, estamos a iniciar contactos para apurar
quantos civis terão realmente morrido. As informações que temos de diferentes
fontes são que terá havido um verdadeiro massacre, e que terão morrido centenas
de pessoas.”
UNITA ainda não conseguiu aceder ao local
dos confrontos
Raul Danda lamenta que a delegação ainda não tenha conseguido visitar a região onde se registaram os confrontos e as mortes: “A área continua a ter acesso limitado, pelo que temos tido dificuldade em obter acesso ao local, local esse que devia ter acesso facilitado. Queremos ir ver o sítio onde as coisas aconteceram, mas aquilo que nos dizem é que só estamos autorizados a ir visitar o local de acolhimento que foi feito, e onde estão a receber as pessoas que teriam saído da área deste líder religioso, mas não é isso que nós queremos. Já percebi que no local há sinais de que de facto terá havido este ataque contra a polícia.”
A DW África questionou Raul Danda acerca do porquê de a sua delegação não se poder deslocar à Serra Sumé: “Há receios de que de facto tenha havido um verdadeiro massacre, e como os sinais não podem ser apagados da noite para o dia, está-se a impedir que as pessoas possam ir lá, inclusive nós, os deputados. Já tivemos até a informação de que com o anúncio da nossa vinda aqui para Huambo, estar-se-ia a fazer uma trasladação de corpos daquele local para um outro, justamente para impedir que esses corpos possam ser localizados. Só que uma coisa é certa, ninguém pode esconder centenas de corpos assim tão facilmente”, declarou o deputado.
O
líder parlamentar da UNITA mostrou-se indignado por até agora a delegação que
chefia não ter conseguido realizar da melhor forma possível a sua missão,
precisamente por falta de colaboração por parte de determinadas entidades da
província.
“Está
toda a gente a viajar para Luanda sem que haja aqui alguém para poder fazer
seja o que for. Pensamos que talvez esta seja uma forma de dizer que quem tem o
poder não está presente, e que quem ficou não tem poder de decisão nem
capacidade para nos ajudar. Oxalá as nossas preocupações não sejam
fundamentadas.”