PARTE
II - EVOLUÇÃO POLÍTICA DE AFRICA E A NAÇÃO LUNDA TCHOKWE 1884 – 1891
2.- O TRATADO DO
ZAIRE
2.1.- SEU CONTEÚDO
Neste tratado, que
nunca chegou a ser ractificado nem a entrar em vigor, Portugal fazia á
Inglaterra, em contrapartida, importantes concessões: os navios Britânicos,
nesses territórios, não seriam «(…) de futuro obrigados ao pagamento de mais
elevados ou diversos direitos e impostos, nem (…) sujeitos a quaisquer outras
restrições, além do que fosse exigido aos navios portugueses; e as mercadorias,
quer fossem propriedade de súbditos britânicos, ou de origem ou manufactura
britânica, nunca seriam de futuro sujeitas a tratamento algum diferencial, e
seriam colocadas no mesmo pé, a todos os respeitos, que as mercadorias
pertencentes a súbditos portugueses, ou importadas em navios portugueses, ou de
produção ou manufactura de portuguesa» (artigo 9.º); os súbditos britânicos e o
seu comércio, «(…) em todas as possessões africanas de Portugal, além de
quaisquer outros direitos que eles pudessem já ter nas colónias portugueses,
receberiam o tratamento da terceira nação mais favorecida (…)» no tocante a
residência, ao exercício de qualquer oficio ou profissão, ao pagamento de
contribuições ou outros impostos, ao gozo de todos os direitos legais e
privilégios, no respeitante ao comércio e à navegação (artigo 10.º).
As partes contratuais
reconheciam a inteira liberdade do «(…) comércio e navegação dos rios Congo e
Zambeze e seus afluentes para os súbditos e bandeiras de todas as nações»
(artigo 3.º).
O comércio e
navegação de todos os rios e vias fluviais compreendidos nos territórios que a
Inglaterra reconhecia a Portugal no artigo 1.º eram de igual maneira abertos a
todas as nações Europeias em Africa sem qualquer monopólio, concessão exclusiva
ou qualquer outro estorvo, sem mais impostos do que os expressamente designados
no TRATADO, ou de futuro estabelecidos por comum acordamos entre as duas partes
(artigo 4.º).
2.2.- A REACÇÃO
EUROPEIA
As nações da europa,
que bem souberam aproveitar-se, em proveito do seu comércio com a África
usurpada, dos longos quarenta anos de oposição e guerra que os Ingleses moveram
a Portugal até o Tratado, não concordaram em que fosse a Inglaterra o único
árbitro dos seus interesses africanos. Isto mesmo fora pressentido durante as
negociações. Em 15 de Março de 1883, o Governo Inglês era de opinião que
deveriam associar-se ao tratado em estudo outras potências colonizadoras
interessadas em Africa. Granville, sempre receoso, tinha informações de Paris
que o preocupavam sobre a atitude dos países perante o tratado em Projecto
(12).
Sem uma saída para o
mar, todo o interior do Congo «não valia um penny» - dizia Henry Stanley (13).
E LEOPOLDO II havia de escrever mais tarde a BISMARK da Alemanha que
renunciaria à empresa africana se a Associação fosse cortada do mar (14).
Das partes costeiras
que poderiam servir à Associação, uma tinha sido ocupado pela FRANÇA, que
tomara LUANGO e PONTA NEGRA, isto é, desde o Gabão até ao paralelo 5.º 12’, e a
outra, preparava-se Portugal para a ocupar desde este paralelo até ao AMBRIZ,
ao abrigo do Tratado do Zaire com a Inglaterra. Sem uma parte da costa e a
cumprirem-se as palavras de Leopoldo II a Bismark, lá cairiam no olvido os fins
humanitários da Associação Internacional, tão altruístas, que ela desejava
levar a cabo.
Ignorassem ou não as
potências colonizadoras europeias os verdadeiros intentos do rei dos Belgas,
que, aquando da constituição da sociedade comercial de ROTERDÃO, quis nela
entrar (15), o que importava era levar avante a criação de um Estado no
interior da África, Estado neutro, espécie de propriedade colectiva de todos os
países, sem alfândegas. Quando estas mais tarde vieram a ser estabelecidas, só
a Holanda teve a ingenuidade de se admirar…
No entanto, conseguiu
a Associação levantar contra Portugal e a seu favor, primeiramente, o comércio
inglês e, depois, o comércio alemão, alcunhando Portugal de monopolistas, de
proteccionistas, apegados aos direitos diferenciais e aos privilégios de
cabotagem, amadores de tarifas exorbitantes, de rigores fiscais. E arvorava-se
então em paladina da liberdade de comércio. Desta propaganda contra Portugal
surgiu, principalmente, a oposição de Manchester ao TRATADO e o veto da
Alemanha, tão humilhante para Inglaterra.
A história aqui
contada sem perturbação, SEM
EMOÇÕES como o leitor pode ver, não se falava ainda da presença
de estrangeiros dentro dos limites fronteiriços da NAÇÃO
LUNDA TCHOKWE ou mesmo do lado do IMPERIO do
MUATIÂNVUA, neste pequeno período, entre 1884 à 1891 ou seja (7) anos depois da
realização da Conferencia de Berlim, também não há nenhuma presença de potência
Europeia no território, ou uma colonização declarada, ou influência alguma de
Portugal ou da Bélgica ou mesmo do senhor LEOPOLDO II.
Esta mistura de
pretensões e interesses deu à política colonial alemã um carácter de
contingência e de incongruência que bem podiam ter arruinado a sua colonização
em África.
Depois de uma guerra
contra a França, a Alemanha saía vitoriosa, unida e forte. Mas os receios da
França levavam-na a uma política de alianças, e a aliança com a Inglaterra na
Europa valia para o príncipe de Bismark mais do que a posse de toda a África
(18). Assim se compreende a política colonial que ambas as Potências vieram a
adoptar para com Portugal e PORTUGAL para com os infelizes e desgraçados estados
indígenas africanos.
O próprio Governo
Inglês, a abraços com viva oposição interna ao Tratado, não se importou nada em
contrariar também os direitos de Portugal. Demais, nem sempre conseguia
esconder as suas ambições de ligar pela GARANGANJA (Katanga) (19) a parte norte
com a parte sul do seu império africano. De facto, mais tarde tudo se dispôs em
LONDRES e em Bruxelas para o Estado Independente ceder aos Ingleses os seus
direitos de propriedade sobre esses territórios (20).
BIBLIOGRAFIA OU
FONTES
(9)…BANNING, Émile – Mémoires politiques et
diplomatiques, comment fut fondé le Congo Belge, p. 7.
(10)
…LAVRADIO, Marques do – Portugal em Africa depois de 1851, p. 81. Dizia a
moção:«No interesse do crescente comércio da costa ocidental da África, a Câmara
julga que o Governo não deve celebrar tratado algum que sancione a anexação,
por qualquer potência estrangeira, do território adjacente ao Congo».
(11)…LAVRADIO, Marques do – Ibidem, p.81
(12)…
ALMADA, José de – Tratados aplicáveis ao Ultramar, vol. VI, p.29
(13)…
OLIVEIRA, Fernando de - «Duas vitórias – O Princípio da Liberdade e igualdade
do comércio na bacia convencional do Congo e as reservas portuguesas de 1885 e
1919, Garcia de Orta, vol. 10, n.º 1, p.14. (14)…OLIVEIRA, Fernando de –
Ibidem, p.22. (17)… OLIVEIRA, Fernando de – Ibidem, p.16.
(15)…
Jornal do Comércio, n.º 9.365, de 14 de Fevereiro de 1885.
(16)…
Livro Branco sobre a Questão do Zaire (II), doc. n.º 1, pp. 5-7.
(18)…
«A partilha de África», Jornal do Commercio, n.º 11.223, de 30 de Abril de
1891. (20)… « A partilha de
África», Jornal do Commercio, n.º 11.223 de 30 de Abril de 1891.
(19)…
Do Catanga, o engenheiro-chefe da Forminiere, Baudine, hava de dizer mais tarde
que era um escândalo geológico».