segunda-feira, 29 de novembro de 2010
“A QUESTÃO DA LUNDA 1885 – 1894” Do conflito entre Portugal e a Bélgica de 1890 á convenção de Lisboa de 1891 sobre a LUNDA
“A QUESTÃO DA LUNDA 1885 – 1894”
Do conflito entre Portugal e a Bélgica de 1890 á convenção de Lisboa de 1891 sobre a LUNDA
Enquanto as expedições belgas e as expedições portuguesas na LUNDA tratavam de fazer ocupações e de justificá-las com TRATADOS DE PROTECTORADOS assinados com os potentados ou Soberanos LUNDAS, decorria em Lisboa a Conferência para solucionar a questão.
O Litígio foi-se resolvendo aos poucos: depois de muitas diligências de ambos os Governos, assinou-se o ACORDO para a negogociação direita; veio depois a Conferência, e, finalmente, a Convenção, que pôs fim ao diferento. É o que vamos descrever a continuação.
O ACORDO SOBRE A QUESTÃO DA LUNDA, ANTECEDENTES.
No prosseguimento das diligências havidas entre Portugal e o Estado Independente do Congo, e já descrita ao longo do dossier que temos vindo a divulgar neste Blog, propôs o Governo Portugués que, antes de tudo, fossem «EXAMINADOS DE BOA FÉ», e confrontados com ânimo conciliador, os títulos de “TRATADOS DE PROTECTORDOS CELEBRADOS ENTRE PORTUGAL E TODOS OS POTENTADOS LUNDAS” e fundamentos do direito que Portugal possuia com relações às terras do Muantiânvua, conjuntamente com aqueles que o Estado Independente do Congo pudesse produzir para justificar a resolução de estender a sua soberania, ou a sua esfera de influência, a esses territórios, compreendidos entre o curso do Cuango e o limite descrito na declaração de 1 de Agosto de 1885.
Para esse efeito poderiam reunir-se em conferência, em Lisboa, num prazo que o governo portugues estimaria que fosse breve, representantes devidamente autorizados de Portugal e do Estado Independente do Congo, assistidos por delegados técnicos particularmente versados nos assuntos relativos àqueles territórios.
No dia 12 de Novembro de 1890 o delegado de Portugal em HAIA Holanda, Visconde de Pindela, mandou ao ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros um telegrama em que lhe comunicava que um director da Companhia Africana do Roterdão, A de Bloeme, que tinha estado na Conferência de Berlim como delegado técnico da Holanda, se oferecia para prestar declarações sobre a questão de limites do CUANGO, afirmando que os limites do Estado Independente do Congo foram em Berlim determinados por ele e pelo General Strauch, agora afastado da Administração do Estado Independente do Congo.
Em resposta, no mesmo dia, o ministro dos Negócios Estrangeiros autorizou-o a aceitar a declaração, na conveniência de guardar absoluta reserva por causa das negociações em curso.
Em 15 do mesmo mês e ano de 1890, o Visconde de Pindela escreveu a A. Bloeme a solicitar as ditas declarações.
No dia 24 respondeu este, afirmando que em Berlim não houve qualquer questão para considerar « OS TERRITÓRIOS DO MUATIÂNVUA » dentro do Estado Independente do Congo.
No dia 17 de Dezembro de 1890, Barbosa du Bocage fez comunicar a todas as Legações de Portugal o conteúdo da questão e a posição Portuguesa. Esta decisão de informar os ministros de Portugal era de conveniencia e necessidade.
Na verdade, até pelo menos aos fins de Agosto 1890, o ministro da FRANÇA e o encarregado de negócios da ALEMANHA em Bruxelas eram completamente alheios e ignorantes da questão e desprovidos de quaisquer instruções especiais, no tocante ao assunto, dos respectivos governos.
O encarregado de negócios da Alemanha em Bruxelas, chegou a procurar o ministro dos negócios estrangeiros de Portugal naquela cidade, com o fim ostensivo de lhe pedir informações e esclarecimentos acerca da pendência para os enviar ao seu Governo.
No dia 20 de Dezembro de 1890, um telegrama de Legações de Portugal em Bruxelas para Lisboa informava que o ministro da Bélgica tinha dado PLENOS PODERES e entregue nota, declarando, em nome do Governo do Estado Independente do Congo, aceitar a negóciação direita acerca da “QUESTÃO DA LUNDA”, nos termos da proposta de Portugal.
Idêntica comunicação fazia Eduardo de Grelle Rogier, ministro da Bélgica em Lisboa, a Barbosa du Bocage, em que dizia:
«(...) Le gouvernement de Sa Majesté Le Roi Souverain accept le mode d’arrangement auquelle gouvernement de Sa Majesté Très-Fidèle a exprimé le désir de recourrir aplanir le différend qui s’est élevé au sujet de l’interpretation de la convention conclue le 14 février 1885 entre le Portugal et l’Association International Africaine pour la délimitation des frontiéres respectives.
Le Roi Souverain a daigné me confier la mision de signer, en qualité de plénipotentiaire de Sa Majesté, tout acte préalable aux négotiations qui devront s’ouvrir à Lisbonne eu vue de discuter les bases d’une entente de nature à mettre fin au conflit.
Les pleins pouvoirs que j’ai reçus à cet effet et que j’ai l’honneur de communiquer, sous ce pli, à V.E. m’autorisent en méme teps à représenter le gouvernement de l’Etat Indépendent du Congo dans la conférence à instituer dans le but d’examiner les droits de deux puissances à la possession du territoire du LUNDA, comme aussi à signer, sous réserve de l’approbation de Sa Majesté le Roi Souverain, les actes arrétés à la suite des négotiation poursuivies dans le cours de cette conférence.(...)
DOS ANTECEDENTES AO ACORDO, CONFERÊNCIA DE LISBOA
Antes de falarmos da conferência de Lisboa e das suas sessões de trabalho, gostaria resumir os resultados da conferência e o acordo entre os Governos de Portugal e do Estado Independente do Congo sobre a QUESTÃO DA LUNDA, assinado em Lisboa em 31 de Dezembro de 1890 por Barbosa du Bocage e Eduardo de Grelle Rogier.
PELO ARTIGO 1.º - ambos os governos diligenciariam « resolver por meio de uma negóciação directa, que teria lugar em Lisboa, a divergência acerca da interpretação da Convenção celebrada em Berlim em 14 de Fevereiro de 1885 entre Portugal e a Associação Internacional Africana, quando decorria a conferência da partilha de África, no que respeita ao exercicio da influência e ao direito da soberania nos territórios compreendidos entre o curso do Cuango e o 6º paralelo de latitude sul e a linha divisoria das águas que pertencem á bacia do rio Cassai entre os paralelos 6º e 12º de latitude sul».
«No caso dos (sic) plenipotenciarios respectivos não poderem chegar directamente a um acordo, o governo de Sua Majestade Fidelissima e o governo do Estado Independente do Congo comprometem-se á mediação de Sua Santidade o Sumo Pontifice Leão III» (artigo 2.º).
No caso de não se chegar por vía de mediação a estabelecer o acordo sobre o ponto em lítigio, comprotem-se os dois governos a submeter a questão à arbitragem de uma potência amiga (artigo 3º).
– Luciano Cordeiro em carta ao ministro e secretário dos Négocios Estrangeiros manifestou o seu desagrado deste modo (...) A notícia de se ter acedido a submeter esse direito a uma revisão arbitral, que lança a incerteza sobre os interesses da nossa quase exclusiva exploração e influência comercial naquela região, não pode deixar de sugerir inquietação (...).
A PRIMEIRA SESSÃO DA CONFERÊNCIA «o status quo»
Foi no dia 19 de Fevereiro de 1891 a primeira sessão da Conferência de LISBOA SOBRE A QUESTÃO DA LUNDA. Abriu-a Carlos Roma du Bocage, que começou por saudar os delegados belgas, e exprimiu o desejo « de ver as negóciações chegar a um resultado de natureza a estreitar os laços de amizade e de boa vizinhança entre Portugal e o Estado Independente do Congo».
Edouardo de Grelle Rogier agradeceu e declarou «que, por seu lado, o Governo do Rei Soberano, animado dos mais amigaveis sentimentos para com Portugal, desejava chegar a uma solução conciliadora».
A primeira questão de que se ocupou a Conferência foi a do “STATUS QUO” . O Plenipotenciario do Estado Independente do Congo propós o de 30 de Dezembro de 1890.
Roma du Bocage não concordou, por ser desconhecido o estado de coisas da LUNDA naquela data, e propós o “STATUS QUO” de 10 de Junho. Édouard de Grelle propós, então, a data do dia em que a Conferência tivera inicio, proposta com que o plenipotenciário de Portugal concordou AD REFERENDUM dos dois Governos, e acordou-se em que estes telegrafassem ás suas autoridades em AFRICA para que as expedições respectivas cessassem todos os actos ulteriores de OCUPAÇÃO.
Carlos Roma du Bocage declarou em seguida que o Governo Português não deixaria «de declarar formalmente que não reconhecia validade alguma, em matéria de direito, a nenhum acto que tivesse sido praticado nos (...) territórios da LUNDA em data posterior à do decreto de Sua Majestade o Rei Soberano de 10 de Junho de 1890 (...)», e que, « considerando o decreto precitado contrário ao espirito da (...)
Convenção de 14 de Fevereiro de 1885, não poderia admitir como fundados em direitos factos que resultassem de um documento contra o qual protestou (...)».
Édouard de Grelle defendeu-se, dizendo que o valor dos actos de possessões do Estado Independente do Congo que visava a declaração do plenipotenciário de Portugal, assim como dos actos anteriores a 10 de Junho de 1890, não podia ser contestado, qualquer que fosse a interpretação da convenção de 14 de Fevereiro de 1885.
Porquanto, a validade destes actos podia ser discutida se, como sustentava o Estado Independente do Congo, os limites das suas possessões haviam sido fixados em todo o CURSO DO CUANGO; válidos seriam ainda se, como pretendia Portugal, a fronteira deste Estado demorasse no paralelo 6º de latitude sul, «porque, nesta hipotese, nenhuma razão impediria o Estado do Congo de, ao mesmo título que qualquer outra potência, fazer actos de ocupação nestes territórios como em todos os outros ainda não ocupados.
Pelo contrário, os actos de ocupação de Portugal seriam, aos olhos do Estado do Congo, absolutamente nulos, visto que, segundo a sua interpretação da Convenção de 1885, ele os considerava como violação dos direitos que lhe reconhecia esta convenção».
Na sua opinião, não podia, portanto, o Governo Português contestar a validade dos actos de ocupação levados a cabo pelo Estado do Congo na Lunda, e não reconhecia este, por seu lado, qualquer valor aos que Portugal praticou anteriormente à data do STATUS QUO.
Carlos Roma du Bocage respondeu a Édouard de Grelle que só estavam em causa, na sua anterior declaração, os actos de ocupação realizados por via do decreto de 10 de Junho de 1890, publicados no dia 10 de Agosto do mesmo ano pelo jornal L’edependence.
Seguidamente, o plenipotenciário Português apresentou um projecto de instruções a fim de serem expedidas pelos dois Governos aos seus representantes em AFRICA, para suspenderem toda a ulterior ocupação na LUNDA, projecto esse que, no caso de aprovação pelos Governos, os plenipotenciários dos dois Estados acordariam na data da sua comunicação simultánea e telegrafica para a AFRICA.
(...)«Veuillez ordonner immédiatement au lieutenant Sarmento, représentant du Gouvernement Portugais dans les territories du Muatianvo, qu’il a’abstienne d’entreprendre, soit de nouvaux actes de souveraineté, soit de nouvelles occupations de territoires dans le PAYS DE LUNDA, afin d’éviter tout conflit, autant qu’il sera en son pouvoir, pendant la durée des négotiations qui viennent de commencer entre le Gouvernement de Sa Majesté et l’Administration Génerale de l’Etat Indépendant du Congo au sujet de l’exercise de la Souveraineté dans les dits territoires» (Livro Branco sobre a Questão da Lunda, doc. N.º 26, protocolo nº 1 pg.39) Era assim o projecto português.(...)
A QUESTÃO « DE DIREITO»
Mudando de assunto, Édouard de Grelle achou por bem que a Conferência se ocupasse da interpretação da Convenção de 14 de Fevereiro de 1885, e afirmou que ela, « no seu texto e no seu espirito, teve por fim fixar como limites entre o Estado Independente do Congo e Portugal todo o CURSO DO CUANGO, e que o decreto do Rei Soberano de 10 de Junho de 1890 não era senão a confirmação dos direitos que a convenção reconhecia ao ESTADO DO CONGO».
E não razões por que Portugal protestava contra o decreto.
Carlos Roma du Bocage argumentou com o facto de o Estado do Congo ter celebrado com outras Potências convenções que lhe marcavam o Cuango até ao paralelo 6º de latitude sul, tal como depois, em 1 de Agosto de 1885, ele tinha expressado na sua DECLARAÇÃO DE NEUTRALIDADE.
Édouard de Grelle observou que a Declaração de Neutralidade não podia ser tida como « uma constituição de território».
Leopoldo II, então, apenas queria assumir os encargos dela decorrentes onde ela pudesse tornar-se efectiva.
O DELEGADO PORTUGUÊS TROUXE EM SUA DEFESA AS CARTAS QUE ACOMPANHARAM OS ACTOS DIPLOMÁTICOS COM A FRANÇA E COM ALEMANHA, AS QUAIS LIMITAVAM O ESTADO DO CONGO PELO CUANGO. LEMBROU LOGO DEPOIS QUE «TODAS AS EXPEDIÇÕES COMERCIAIS E CIENTIFICAS QUE NA LUNDA TIVERAM LUGAR FORAM ACOMPANHADAS POR GUIAS PORTUGUESES E SERVIDAS POR RECOMENDAÇÕES DAS AUTORIDADES DE PORTUGAL», E QUE «A EXPEDIÇÃO DO MAJOR HENRIQUE AUGUSTO DIAS DE CARVALHO, EM 1884, (...) FOI ORGANIZADA COM O FIM DE TORNAR ESSES CONTACTOS EM LAÇOS DE SOBERANIA EFECTIVA». SE PORTUGAL NÃO TINHA FALADO EM BERLIM DESSA EXPEDIÇÃO, FOI PORQUE O SEU RESULTADO NÃO ERA AINDA CONHECIDO, MAS ELA, NA VERDADE, PROLONGADA ATÉ 1888, ERA UMA PROVA DE QUE O GOVERNO PORTUGUÊS NÃO CONSIDERAVA O CUANGO COMO LIMITE DA PROVINCIA DE ANGOLA.
O plenipotenciário do Estado Independente do Congo recordou os nomes de Wissman, Von François, Muller, Braconnier e Dhanis, que foram à Luanda por conta de Leopoldo II para contrabalançar a expedição de Major Henrique de Carvalho na Lunda.
E Cuvelier, delegado técnico, acorreu com a opinião de que o plenipotenciário de Portugal não devia seguir no terreno das explorações nos territórios em lítigio, porque a Conferência se tinha reunido nos termos do ACORDO de 31 de Dezembro para procurar de comum acordo a interpretação da convenção de 1885.
E para aclarar a Convenção e explicar a Declaração de Neutralidade, julgou que devia trazer à Conferência certos factos.
A Associação Internacional – continuou – tinha, de facto, celebrado tratados análogos com a Alemanha (8 de Fevereiro de 1884) e com a França ( 5 de Fevereiro de 1885).
Na carta anexa à convenção alemã, os territórios da Associação, eram limitados pelo paralelo de Nóqui, prolongado até Cuango, e na Carta da convenção Francesa, pelo paralelo 6º de latitude sul de uma e outra parte do Cuango.
E isto porque, por um lado, era justo que a Associação deixasse toda a liberdade de acção civilizadora à Alemanha para leste deste rio, onde tinham sido Buchner, Schutt, Wissman e Pogge, por outro, «era notório que Portugal não tinha na época qualquer pretensão sobre estes territórios interiores.
Como prova desta última afirmação, aduziu a celebração do Tratado de 26 de Fevereiro de 1884 com a Inglaterra, embora não ractificado, onde Portugal pretendia fosse reconhecida a sua soberania sobre a parte da costa ocidental de Africa entre os paralelos 8º e 5º 12’ de latitude sul, até Nóqui sobre o Congo, e até às fronteiras das tribos fixadas sobre a costa e nas margens do rio.
O motivo por que a DECLARAÇÃO DE NEUTRALIDADE – prosseguiu Cuvelier – fixava no Cuango as fronteiras do Estado Independente do Congo, explicava-se pela situação especial em que ele se achava perante a Alemanha de não fazer «prevalecer, ao olhar das Potências, logo na sua declaração de neutralidade, todos os direitos territoriais que lhe reconhecia o conjunto das suas convenções».
Demais, a declaração de neutralidade era um acto unilateral, e um TRATADO INTERNACIONAL não pode ser modificado por uma simples decalração de um dos contratantes.
Nesta declaração o Estado Independente do Congo programava em que territórios aplicavam o regime da neutralidade, «mas limites destes territórios neutros não os reproduziu na notificação da sua constituição onde se referiu à sua constituição territórial tal como foi estabelecida pelos tratados».
A Cuvelier respondeu Roma du Bocage, afirmando que tinha estado na conferência de BERLIM e conhecia quais as regiões de que se quis compor o Estado Independente do Congo. Nunca estivera no pensamento da Alemanha e da França atribuirém-lhe a LUNDA.
«Quando Portugal concluiu o TRATADO DE 1885 com a Associação do Congo pelo qual ele reconhecia o curso do Cuango como limite dos territórios da dita Associação, supunha implicitamente, como era conhecido dos actos anteriores, que se deveria entender esta fronteira no sentido em que tinha sido definida por estes actos, isto é, entre o paralelo 6º e o paralelo de Nóqui.
De Grelle, sem contestar o valor da opinião pessoal de Roma du Bocage, notou, porém, que o barão Lambermont era de opinião contrária. Mas passou à frente para dizer que o mapa COR-DE-ROSA, de 1886, não compreendia a LUNDA na esfera de influência portuguesa, o que provava que, nessa época, Portugal não passava nesses territórios.
Roma du Bocage, ao modo por que se defendera o delegado técnico do Estado Independente do Congo, acudiu dizendo que, no pensamento de Portugal, aquando da convenção com a ALEMANHA, esta era a única potência que tinha pedido reivindicar a LUNDA e essa convenção exprimiu justamente esse sentimento…Logo de Grelle lhe perguntou se, no caso de a Alemanha ter reivindicado a LUNDA, Portugal teria abandonado em seu favor as suas próprias reivindicações.
O plenipotenciário português respondeu que o Governo de Portugal nunca desistiria dos territórios do MUATIÂNVUA nem perante a Alemanha nem perante a França, e recorreu em seguida ao mesmo subterfúgio que servira ao delegado técnico do Estado Independente do Congo, de dizer que este, «na sua convenção com a Alemanha, não tinha reivindicado o território do MUATIÂNVUA porque lhe convinha respeitar as pretenções da Alemanha».
Este discorrer do plenipotenciário de Portugal não agradou a CUVELIER, que tomou a palavra para dizer que não era exacto o sentido que ele atribuía à sua intervenção. Ela simplesmente significava que, aquando da declaração de 1 de Agosto de 1885, o Estado Independente do Congo pôde, por razões de que só ele era soberano para apreciar, não invocar todos os seus direitos territoriais.
Roma du Bocage não deixou fugir a ocasião para resumir os meandros por que corria a politica do Estado Independente: « no espirito da Associação Internacional do Congo os seus territórios teriam duas fronteiras, uma alemã, outra Portuguesa». E foi com a contestação desta conclusão de Roma du Bocage por Cuvelier que se encerrou a primeira sessão da conferência ou a convenção de Lisboa sobre a LUNDA. Foram duas horas e meia de discussão animada.
A SEGUNDA SESSÃO. A QUESTÃO «de direito»
No dia 23 de Fevereiro voltou a conferência a reunir-se. Presentes os plenipotenciários e os delegados técnicos procederam-se à leitura do protocolo da sessão anterior, não sem algumas reservas depois feitas por Cuvelier sobre a sua redação.
De Grelle concordou que o status quo não tinha nada que ver com os actos de ocupação praticados antes dele, e Roma du Bocage, confirmando esta interpretação, acrescentou que o essencial era que as ordens dadas pelos dois Governos fossem idênticas e que o estabelecimento do stutos quo não implicasse a apreciação de qualquer acto anterior.
E voltou-se de novo à interpretação da convenção de 14 de Fevereiro de 1885. Cuvelier trouxe em sua ajuda o testemunho de alguns exploradores, geógrafos e escritores como GOTHA, KIEPERT, RAYNIER, PETERMANN, STIELER…que davam ANGOLA terminada no Cuango.
Citou a carta das possessões Portuguesas publicadas em 1862 pelo VISCONDE DE SÁ BANDEIRA e pelo coronel Costa Leal.
Voltou as explorações na LUNDA por conta da Associação Internacional antes e depois de 1885, neste caso, em seu entender, no prosseguimento da execução da Convenção de 1885. Falou da abertura, atrás indicada, para a delimitação das esferas de influências, cujo desaire atribuiu, ele mesmo, à atitude de intransigência do Estado Independente como de quem tem consciência de um direito exclusivo que lhe pertence (). Falou da lista das estações oficiais… que Portugal apresentou na Conferência de BRUXELAS como suas na LUNDA, e do protesto com que se saiu logo o Estado Independente, e, em seguida e finalmente, voltou-se para a questão de direito: a convenção de 1885, na sua letra e no seu espirito, fixava como limites das possessões respectivas dos dois Estados em África todo o curso do Cuango; depois de 1885, o Estado do Congo não fez mais do que permanecer fiel a esta maneira de ver.
____________.
(..) Atrás ficou exposto que os factos se passaram de modo diverso… Com efeito, Conde de Macedo, em Novembro de 1890, tinha apresentado na conferência de BRUXELAS a lista das estações oficiais que Portugal possui em Africa, que, em relação à LUNDA, indicava as do Cuango, Lóvua e Calanhi. A conferência limitou-se a registar este documento, por ele não ser objecto da sua competência, e os plenipotenciarios do Estado Independente do Congo formularam sobre ele expressas reservas (Livro Branco sobre a Questão da Lunda, doc.n.º 27, protocolo n.º2, p.46; Doc. n.º 30, protocolo n.º5 p.76)
______________.
Afirmou que a favor desta interpretação estavam a carta Africana Meridional Portugueza, de 1886 (da Comissão de Cartografia), a carta de Rouvier, publicada em 1887 e editada pelo Ministério das Cólonias e da Marinha de França, a carta inglesa Africa South of the Equator, de 1889, de EDWARD STANFORD…; que, se nunca o Estado Independente modificou este seu modo de ver, Portugal, por seu lado, nunca sustentou a tese que defendia agora.
De resto, as declarações feitas em nome do Governo Português, por ocasião da conclusão das suas convenções de 1886 com a França e com Alemanha, mostravam – seu entendimento – que Portugal estava bem longe de considerar a LUNDA ESPAÇO EFECTIVO DE ANGOLA, e nem tão-pouco a reserva para sua zona de influência.
Na sessão anterior, já o plenipotenciario português se tinha explicado sobre o motivo por que Portugal então excluirá a LUNDA.
Mas Cuvelier não se contentou com essa explicação, pois o Governo Português, a não reivindicar em BERLIM a LUNDA por não conhecer o resultado da expedição do major Henrique Augusto Dias de Carvalho, fazia valer os seus direitos de exercer a sua influência politica e estender o seu PROTECTORADO sobre os territórios entre Angola e Moçambique, porque neles, só por assim dizer, tinham penetrado viajantes e comerciantes portugueses, só Portugal ali exercia influência, justamente o mesmo título que agora invoca para a LUNDA.
Se Portugal, na convenção com a Alemanha, tinha excluido a LUNDA para não contraria suas possiveis pretensões a leste do Rio Cuango, agora, ao reivindicar esse território, mostrava-se convicto de que ela não pensava em estender-se nessas bandas.
Mas « c´était l’occasion la plus propice pour lui de faire état de ses prétentions sur le LUNDA, si réellement il ne gardait le silence à ce sujet que par considération pour les convenances de l’Allemagne»…
Roma du Bocage respondeu a Cuvelier com o argumento repisado de que a interpretação da convenção de 1885 era inseparável dos outros tratados que definiram os limites da Associação Internacional do Congo.
///continuação///...
OBSERVAÇÂO:
Veja a Convenção de 14/02/1885, Publicada neste BLOG dia 29 de Julho de 2010.
Fontes – AMNE – Caixa «Limites no Congo e na Lunda, maço n.º2, oficio reservado n.º 24 – A, de 24 de Agosto de 1890, de Conde de Macedo para o ministro e secretario dos NE.