sexta-feira, 29 de outubro de 2010
ASSEMBLEIA NACIONAL REVÊ A LEI DOS CRIMES CONTRA A SEGURANÇA DO ESTADO E DOS PARTIDOS POLITICOS
A Assembleia Nacional volta à actividade normal da III sessão da III Legislatura para discutir e aprovar em dois dias, 4 e 5 de Novembro, um conjunto de 17 diplomas legais, entre as que se contam a Lei dos Partidos Políticos e a dos Crimes Contra a Segurança do Estado, acerca das quais vários sectores da sociedade civil já se pronunciaram sobre a necessidade da sua adequação à Constituição em vigor.
De acordo com fontes de O PAÍS, a proposta de Lei dos Crimes Contra a Segurança do Estado, remetida à Assembleia Nacional pelo partido no poder, MPLA, já expurga o polémico artigo 26º que continha uma moldura penal para “todo e qualquer acto não previsto na Lei que ponha ou possa pôr em perigo a segurança do Estado”.
Esta disposição da lei em questão foi sendo objecto de contestação por parte de muitos advogados que evocavam a falta de clareza na tipificação do crime de que poderia ser alvo qualquer cidadão, tendo sido usado por vários tribunais angolanos para condenar cidadãos, o mais flagrante dos quais, segundo os mesmos juristas, o caso dos activistas cívicos de Cabinda.
Um recurso ao Tribunal Constitucional foi imediatamente interposto, segundo declarações dos advogados, na ocasião, e tudo indica, afirmam, que a decisão desta instância judicial pode ser favorável à defesa, o que, alegadamente, estará a implicar na alteração desta Lei para conformá-la com os preceitos da Constituição.
No discurso sobre o estado da Nação proferido pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, na Assembleia Nacional, na abertura da III sessão legislativa, sublinhava a necessidade de se fazerem alterações profundas ao actual Código Penal, o que pode, em certa medida estar em consonância com a necessidade de acautelar os direitos consagrados na Constituição.
Como bem vem expresso na fonte deste jornal “na verdade, entre os dois planos jurídicos, o constitucional e o penal, estabelece-se uma relação muito estreita que deriva do facto de o direito penal interferir com os valores essenciais da vida do homem inserido em determinada comunidade”.
Adianta que é da relação que o direito penal estabelece com estes direitos fundamentais, com implicações na protecção, limitação, imposição ou proibição de condutas e estabelecendo, em qualquer caso, penas para aqueles que violem os imperativos penais que resulta a sua subordinação e dependência próximas à Constituição do Estado.
Tomando isto por base, o Tribunal Constitucional poderá decidir pela absolvição do padre Raul Tati e coréus, já que foi exactamente o artigo 26º que esteve na base das suas condenações.
A Lei 7/78 de 26 de Maio também criminalizava o e o incitamento à greve, duas “gafes constitucionais” que só agora poderão ser revistas, já que desde o “abraço” ao multipartidarismo, as leis sindicais e do trabalho condenam o lock out e consagram a realização da greve como direito do trabalhador, podendo a mesma ser lícita ou ilícita, não se podendo entender como um crime contra a Segurança do Estado.
O ante-projecto também não considera justo integrar na categoria dos Crimes Contra a Segurança do Estado a troca de correspondência por parte de um cidadão angolano com nacionais estrangeiros ou qualquer pessoa residente em país estrangeiro.
Adianta o ante-projecto, no seu preâmbulo, que a não definição do conteúdo desta correspondência poderia levar, por exagero, “considerar como crime contra a segurança do Estado, por decisão do Governo, o envio de simples correspondência pessoal a pais ou filhos residentes em país estrangeiro”. Igual leitura é feita em relação ao artigo 5º da mesma Lei que previa o crime de passagem para país inimigo “sem que todavia ajude ou tente ajudar de qualquer modo o inimigo”.
De acordo com a fonte de O PAÍS, a Lei de 1978 foi concebida para responder a uma situação de grave emergência nacional, “foi conjugada com a acção de poderosos inimigos externos, numa violenta agressão armada contra o nosso país”, o que já não se coloca na situação actual em que Angola consolida, há mais de oito anos, um processo de paz e reconciliação nacional.
O actual ante-projecto traz uma formulação distinta em termos de conceituação do que representa um crime contra a segurança do Estado, entendendo como tal “os Crimes Contra a Independência e a Integridade Nacionais, aqueles praticados contra a Defesa Nacional e as Forças Armadas, contra os Estados Estrangeiros e os Crimes Contra a Realização do Estado”, que conformam quatro capítulos aos quais se associam um outro que trata de disposições comuns.
FONTE: O PAIS/ANGOLA24HORAS