Recomposição da direcção
do MPLA é "rutura substancial com passado" - Reginaldo Silva
Luanda - A nova direcção do MPLA, liderada por João
Lourenço, também Presidente de Angola, "aponta claramente para uma rutura
substancial com o passado", disse hoje à agência Lusa o jornalista e
analista angolano Reginaldo Silva.
Fonte:
Lusa
Questionado
pela Lusa sobre os novos nomes que integram sobretudo o novo Secretariado do
Bureau Político do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), hoje
aprovados, sob proposta de João Lourenço, o analista angolano disse que, ao
surgirem personalidades quase desconhecidas, a aposta parece ser a de
"democratizar o partido".
"A
recomposição da direcção aponta, claramente e antes de mais, para uma rutura
substancial com o passado do partido no poder que, até ao último sábado, teve
na figura e no poder pessoal de José Eduardo dos Santos uma referência
demasiado absorvente, para não dizer mesmo asfixiante, que condicionou
fortemente a democratização interna do MPLA", sublinhou Reginaldo Silva.
O
jornalista lembrou que foi com Eduardo dos Santos que se criou "um
verdadeiro culto da personalidade", alimentado "mais por medos e
receios do que propriamente por algum sentimento mais genuíno de admiração e
mesmo respeito pela sua liderança".
"Mas,
mais do que estar preocupado com o reforço dos seus poderes, penso que João
Lourenço, até provas em contrário, parece-me estar mais apostado em
democratizar internamente o MPLA, através do rejuvenescimento da sua direção
executiva, trazendo para a ribalta novas figuras que de facto nunca tiveram
qualquer contacto com o poder ao mais alto nível", analisou.
Para
Reginaldo Silva, o afastamento do Bureau Político de "praticamente todos
os 'maquisards'", com a exceção de João Ernesto dos Santos
("Liberdade"), é uma "referência política" que tem de
merecer o necessário destaque, que vem confirmar a dinâmica renovadora e
reformista que marcou o primeiro ano da sua liderança à frente do executivo.
Nesse
primeiro ano, João Lourenço "surpreendeu tudo e todos" pelas medidas
cirúrgicas que foi tomando, sobretudo por algumas delas terem posto em causa,
em toda a linha, "a herança e os interesses do até então todo-poderoso
Eduardo dos Santos", prosseguiu o analista.
"A
certa altura, [Eduardo dos Santos] pensou que, com uma espécie de controlo
remoto, poderia manter intacto, mesmo afastando-se da vida política ativa, todo
o seu poder e influência acumulados ao longo de 38 anos de poder",
acrescentou.
Para
Reginaldo Silva, antigo correspondente da imprensa portuguesa em Angola, o
importante são os "novos rostos" descobertos por João Lourenço, em
que o destaque vai para a nova vice-presidente do MPLA, Luísa Damião, uma
antiga jornalista da ANGOP.
"[Os
novos rostos] sabem que vão ter de se esforçar bastante para mostrarem o seu
valor e, sobretudo, para não deixarem os seus créditos, ainda não firmados, por
mãos alheias. Vão ter de dar o melhor de si, em condições políticas marcadas
por uma maior abertura, para provarem que sabem e podem fazer muito melhor que
os mais velhos e veteranos do MPLA que foram agora render. Sabem que o MPLA,
internamente, vai continuar a ser um terreno onde as areias vão continuar a ser
bastante movediças", sustentou.
O
antigo jornalista do Jornal de Angola e correspondente, entre outros, do Jornal
de Notícias e do Público, considerou também que este será um "forte
estímulo que vai condicionar pela positiva o desempenho" dos novos membros
do Bureau Político.
Questionado
se, com a nova composição do Bureau Político, a ligação a Eduardo dos Santos
fica definitivamente cortada, Reginaldo Silva disse ser ainda cedo para tentar
adivinhar como o ex-Presidente de Angola e agora também ex-líder do MPLA se vai
relacionar com a nova direção do partido.
"Mas
parece-me claro que João Lourenço vai assumir por inteiro, e com todas as
consequências, a sua nova condição de líder do MPLA, não permitindo que, do
exterior, movimentações de bastidores possam pôr em causa ou minar a sua
liderança", observou.
"Mas
continuo a pensar, mesmo depois do discurso feito sábado no Congresso, que
Eduardo dos Santos deixa a vida política ativa com algum arrependimento por ter
tomado uma tal decisão [deixar a presidência e a liderança do MPLA], o que
facilitou bastante todo o processo de transição política e geracional, que
agora está formalmente concluído e que, mais tarde ou mais cedo, iria ter
lugar", referiu.
A
transição, terminou Reginaldo Silva, foi um processo que o país "já há
algum tempo estava a precisar como de pão para a boca", pois estava a
ficar "demasiado evidente" que a gestão do anterior Presidente
"tinha entrado em rota de colisão".