Clinton passa no teste contra o
Dr. Donald e o Mr. Trump
Hillary
Clinton provou que domina os assuntos e que tem propostas concretas, mas é
difícil imaginar que Donald Trump tenha afugentado algum dos seus apoiantes.
Antes do primeiro debate entre Donald Trump e
Hillary Clinton, na madrugada desta terça-feira, vários analistas coçavam a
cabeça a tentar perceber que Donald Trump iria aparecer no palco da
Universidade Hofstra, em Nova Iorque: o desbocado e furioso magnata do
imobiliário que esmagou os seus adversários nas primárias do Partido
Republicano, ou o candidato mais moderado e presidenciável que muitos ainda
acreditam estar escondido dentro dele?
As dúvidas ficaram esclarecidas ao fim de
poucos minutos. De um lado esteve Clinton, focada em encaixar as suas centenas
de propostas em mensagens mais talhadas para a televisão e para o Twitter, e do
outro lado estiveram dois candidatos: enquanto o Dr. Donald ia conseguindo
apresentar argumentos eficazes em relação aos acordos de comércio e às suas
consequências negativas para uma parte da população norte-americana de
importantes estados do interior, o Mr. Trump estava sempre à espreita para
levantar a voz e falar por cima do moderador e da sua adversária.
No final, e ainda no meio da confusão das
análises ao que se tinha passado durante os 90 minutos de debate programado
(que se esticaram por mais uns minutos), a ideia geral era a de que as
sondagens pouco se vão importar com o que aconteceu no primeiro debate: sim,
Hillary Clinton provou que domina os assuntos e que tem propostas concretas
para atacar muitos dos problemas, mas é difícil imaginar que Donald Trump tenha
afugentado algum dos seus apoiantes.
Foi um debate com dois resultados. Numa época
já distante, quando Trump se dedicava apenas à construção de edifícios de luxo,
hotéis e casinos, talvez Hillary Clinton estivesse agora a ser levada em ombros
nos títulos dos jornais. Mas a política dos Estados Unidos com este candidato
do Partido Republicano é todo um outro universo: até ao dia das eleições, a 8
de Novembro, tudo o que Trump disser, certo ou errado, pode e vai ser usado a
favor dele pelos seus fervorosos apoiantes. E numa altura em que as sondagens
não sabem para onde se virar, é razoável admitir que Donald Trump não perdeu –
pelo menos, não por KO.
Até porque na primeira das três partes do
debate (dividido por temas e não por intervalos), o candidato do Partido
Republicano conseguiu repetir quase todas as frases que tem usado nos últimos
meses sobre o suposto estado miserável a que o país chegou por causa da
globalização, e que só são novidade para quem nunca tinha ouvido um dos seus
discursos ou entrevistas: “Os nossos postos de trabalho estão a sair do país.
Estão a ir para o México. Estão a ir para muitos outros países”; “Temos de
impedir as nossas empresas de saírem dos Estados Unidos, e de despedirem todos
os seus funcionários.” Esta ideia pode ser contrariada pelos mais recentes
números de redução da taxa de desemprego e ligeira subida dos rendimentos da
classe trabalhadora norte-americana, mas a verdade é que esses números ainda
não começaram a fazer diferença nos bolsos da maioria, o que mantém em
permanente estado de irritação muitos dos apoiantes de Donald Trump em estados
como o Ohio ou o Michigan.
A estas propostas aparentemente simples
junta-se a dificuldade de Hillary Clinton para explicar a sua mudança de
opinião sobre a Parceria
Transpacífico (TPP) – de defensora a opositora por pressão do seu
adversário nas primárias, Bernie Sanders –, e a sua ligação ao Tratado
Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA), negociado durante a Administração do
marido, Bill Clinton. Com estes ingredientes, a receita de Donald Trump é
simples: ele é o defensor dos operários que viram os seus empregos fugir para a
China, e ela é o demónio que só vai ajudar ainda mais os seus amigos de Wall
Street.
Dois países diferentes
Mais uma vez, ficou bem patente que os
eleitores norte-americanos têm este ano pela frente duas propostas de país
completamente diferentes. O de Hillary Clinton, que mantém o caminho das
últimas décadas de abertura ao resto do mundo, com a garantia de apoio aos seus
aliados, e o de Donald Trump, onde a prioridade será a “lei e a ordem” dentro
das suas fronteiras. Questionada sobre se queria responder à ideia de que
países como a China e o México estão a “roubar” os postos de trabalho aos
Estados Unidos, Hillary Clinton disse que os norte-americanos representam 5% da
população mundial, e que têm de “fazer negócios com os restantes 95%”.