ANGOLA: OGE PÕE MILHÕES NA GESTÃO UNIPESSOAL DO
PRESIDENTE JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS
A oposição angolana, a tal que aprovou
(explícita e implicitamente, apenas com excepção da CASA-CE) o novo Orçamento
Geral do Estado (OGE), diz que este documento colocará “nas mãos” do Presidente
Eduardo dos Santos mais de 15 mil milhões de euros para gestão directa, sem
fiscalização.
Orlando Castro - Folha 8
Diário
Agora,
dando uma no cravo e outra na ferradura, consideram que a concretizar-se será
um “atentado ao Estado de Direito”. Mas desde quando, nesta e em quase todas as
outras questões, Angola é actualmente um Estado de Direito?
A
Oposição diz que é como “passar um cheque em branco”. Pois é. Mas se é assi que
o regime quer, é assim que será.
A
crítica é da UNITA que, segundo a Voz da Alemanha, acusa o Governo de querer
pôr nas mãos do Presidente José Eduardo dos Santos, para gestão directa,
unipessoal, cerca de 19 mil milhões de dólares, mais de 15 mil milhões de
euros. Mas se ele é o Presidente da República desde 1979, sem nunca ter sido
nominalmente eleito, se é o Presidente do MPLA e chefe do Governo, o melhor –
aconselhará certamente Bento Bento – é comer e calar.
Trata-se,
oficialmente, de uma “Reserva Financeira Estratégica Petrolífera”, resultante
dos direitos patrimoniais do Estado angolano nas concessões petrolíferas, e que
servirá para financiar investimentos de longo prazo.
Parte desse dinheiro será gerido directamente pelo chefe de Estado, sem a fiscalização do Parlamento, critica o líder do grupo parlamentar do maior partido da oposição.
“Uma
parte pode ser 1% ou 99,99%”, diz Raúl Danda, acrescentando que “se os
deputados não podem fiscalizar a execução do Orçamento, ao entregar-se assim
dinheiro nas mãos do Presidente da República, que faz essa gestão sem prestar
contas, estamos mesmo a ver que espécie de transparência podemos ter neste
país.” Terá sido por levar em consideração essa “espécie de transparência” que
a UNITA se absteve na votação do OGE?
Por
sua vez o grupo parlamentar da CASA-CE não se opõe a que a reserva petrolífera
seja gerida pelo Presidente angolano, mas mediante um plano aprovado pela
Assembleia Nacional. Como anedota não está mal.
Este
foi, aliás, um dos motivos que levou o partido a votar contra o OGE para 2015,
explica o vice-presidente da bancada parlamentar da CASA-CE. Manuel Fernandes
diz que este OGE é “um atentado ao Estado de Direito”, que “quase amputa” o
papel fiscalizador dos deputados.
“Este
diploma é praticamente uma autorização legislativa para o Presidente da
República fazer tudo o que bem entender sem contra-peso. E nós, de facto,
estamos em completo desacordo”, afirma Fernandes.
A
preocupação do deputado da CASA-CE “é a questão da ‘Reserva Estratégica’, bem
como outras autorizações que estão a ser conferidas ao Presidente da República,
com altas somas monetárias, sem se ter tido em conta a Assembleia Nacional, que
é o órgão fiscalizador.”
Um
dos grandes problemas em Angola é que não existe fiscalização, sublinha ainda o
líder do grupo parlamentar da UNITA. Pois. A fiscalização só faz sento quando
há democracia, quando o país é um Estado de Direito.
“É
preciso prestar contas a alguém, o Presidente da República não pode ter verbas
avultadas e dizer que ele próprio estabelece as modalidades de prestação de
contas. Ora, como é que o fiscalizado vai estabelecer as regras da
fiscalização?”, pergunta Raúl Danda. “No entanto é isso que acontece neste Orçamento,
que tem um défice jamais visto neste país”, acrescenta para – crê-se –
justificar a abstenção da UNITA.
Para
Manuel Fernandes, o OGE para o próximo ano não é realista. Mais importante
seria empregar esforços para diversificar e “despetrolizar” a economia
angolana.
“Há
um excesso de expectativa. Já se sabe que há um decréscimo do preço do barril
de petróleo, por isso não se pode ser assim tão expectante e propor uma taxa de
crescimento de 9,7%”, afirma o deputado da CASA-CE, acrescentando que “este é
mais um folclore político que pretendem fazer e nós não estamos aqui para isso.
Por isso mesmo entendemos que tínhamos, de facto, de votar contra este
Orçamento, que está longe de corresponder às expectativas dos angolanos.”