Lisboa - Depois do “dia de raiva” ter levado mais de 20 mil paras as ruas de Sanaa, no Iémen, apelos lançados nas redes sociais estão a incitar os cidadãos sírios a manifestar hoje e amanhã o seu descontentamento para com o regime de al-Assad. O presidente não acredita numa revolta como a egípcia, mas já deixou uma mão cheia de promessas ao povo. Na Argélia, Bouteflika está disposto a levantar um estado de emergência de 19 anos.Manifestações marcadas por todo o Médio Oriente e Norte de África
Alavancadas pelos exemplos da Tunísia e do Egito, são várias as nações do mundo árabe que experimentam nestes dias um clima de mudança. As manifestações de rua, com protestos anti-governamentais, quebram uma barreira que muitos ditadores da região julgavam sólida.
Os protestos no Iémen, que ontem teve o seu “dia de raiva”, levaram dezenas de milhares para as ruas da capital. Reunidas no centro de Sanaa, as vozes prometem que apenas se calarão no dia em que o regime de Abdullah Saleh cair.
"Os tiranos têm medo, a Intifada avança"
A revolta egípcia contou esta sexta-feira com o apoio de um milhar de turcos que se concentraram junto a uma mesquita em Istambul, a capital económica da Turquia.
Com cartazes onde a fotografia de Mubarak era sobreposta pelos dizeres "os tiranos têm medo, a Intifada avança", os manifestantes gritaram palavras de ordem contra o regime do presidente do Egito.
"O faraó está em vias de ser postoa andar. Que isso sirva de lição a todos os líderes do mundo muçulmano que apoiam Israel", afirmou aos jornalistas da France Press Bulent Yildirim, presidente da associação humanitária islamista IHH.
A IHH foi um dos grupos que convocou a manifestação e o mesmo que em Maio passado viu atacado um seu navio de ajuda a Gaza. As forças israelitas mataram na altura nove passageiros do navio turco Mavi Marmara.
As revoltas que atravessam a região – nomeadamente na Tunísia e Egito - foram entretanto interpretadas pelo guia supremo do Irão como o “sinal do despertar islâmico” no mundo.
Durante a oração desta sexta-feira, na Universidade de Teerão, o ayatollah Ali Khamenei declarou que as revoltas representam ainda uma “derrota irreparável” para os Estados Unidos.
"Dia de raiva" na Síria
Hoje é esperado o início de uma manifestação de dois dias na Síria. Os críticos do regime de Bashar al-Assad - que há uma década sucedeu ao seu pai, Hafez al-Assad, no cargo de presidente – apontam problemas de corrupção e limitações no que respeita à liberdade política e Direitos Humanos.
Al-Assad afirma que a situação da Síria não é comparável àquela que se vive no Egito, pelo que acredita que não irá enfrentar uma contestação semelhante àquele a que tem de fazer face Hosni Mubarak.
Numa entrevista ao Wall Street Journal, o presidente sírio explicou que o seu país vive “circunstâncias mais difíceis do que a maior parte dos países árabes mas apesar disso a Síria é estável. E porquê? Porque devemos estar ligados àquilo que são as convicções do povo. Esta é a questão central. Quando há divergência entre a política de um país e as convicções e interesses do povo, então tem-se este vácuo que origina distúrbios”.
Os sinais conhecidos até ao momento suportam de alguma forma a teoria do presidente, já que os principais agentes da revolta estão sediados no estrangeiro: são sírios que deixaram o país e que, a partir do Canadá, Estados Unidos, Reino Unido, Suécia e Holanda, procuram encorajar aqueles que ficaram a manifestar o seu desagrado nas ruas.
Grupos organizados através do Facebook e de outras redes sociais estão a tentar mobilizar os sírios nas cidades de Damasco, Homs, Aleppo e Qamishli.
Apesar da aparente desvalorização de al-Assad, o presidente não está desatento à instabilidade que afecta já vários regimes árabes e deixou ao povo a promessa de reformas políticas ainda este ano (para preparar eleições municipais), garantindo mais poder às organizações não-governamentais e uma nova lei dos media.
Por mexer, fica o estado de emergência, em vigor na Síria desde 1963.
Bouteflika põe fim a um estado de emergência de 19 anos
Decisão diferente foi a do presidente argelino, Abdelaziz Bouteflika, que promete o levantamento do estado de emergência imposto em 1992 na sequência de uma luta contra movimentos radicais islamitas.
Com os ventos de liberdade a convergirem para as praças de Argel, o presidente viu-se obrigado a ceder perante as queixas do povo: os argelinos começaram por contestar a subida do preço dos alimentos e a falta de emprego.
Uma primeira vaga de protestos ocorreu ainda em janeiro, estando já marcada nova manifestação para 12 de fevereiro, o que vai contra o estado de emergência imposto desde há duas décadas. Encostado à parede, Bouteflika admite o direito à manifestação em todo o país, mantendo a restrição apenas para a capital.
O chefe de Estado argelino acrescenta que o fim definitivo do estado de emergência está para muito breve.