SUA MAJESTADE DUMDA WATEMBO, GRANDE DIGNIDADE
LUNDA TCHOKWE
O propósito deste texto
não é falar da localização geográfica das terras de Dumba Watembo, mas sim a
caracterização da sua personalidade, enquanto uma dignidade da Corte e um dos
Aristocratas Lunda Tchokwe no final do seculo passado, os seus feitos e suas
lembranças entre nós.
Relativamente ao
vestuário de Dumba Watembo, há a notar que a
cantaria CASSUNGO que lhe guarnecia o
casaco era uma missanga de bordar, de cores diversas, muito apreciada pelos
nativos Lunda Tchokwes, para a confecção de adornos. Era particularmente
aplicada nas interessantes e artísticas coroas em múltiplas palas, e nos
diademas, dos antigos chefes LUNDAS.
Com a mesma missanga
devia ser bordado o diadema que Dumba Watembo ostentava abaixo da coroa de
latão, e um pouco confundido com ela na descrição dos exploradores Europeus
durante as suas viagens no coração de África.
Quando á pequena pele
de antílope que usava, deve tratar-se duma pele de corça, animal em vários
aspectos muito consagrado aos simbolismos do Sobado Lunda Tchokwe ainda hoje.
No que se refere à coroa de latão, não apresenta ela correspondência de
qualquer ordem com tradições Tchokwes ou Lundas.
Tratando-se de obra
do próprio Dumba Watembo, devemos concluir
que a fez inspirando-se em objectos idênticos que conheceu, ou em imagem ou
ideia que lhe foi sugerida. Admitimos que se trate de influência de qualquer
modo proveniente de parentes seus, investidos em altas funções de chefia nos
Bângalas e na Jinga, em modos de realeza, e da nomeação dos Portugueses, como
fossem, pelo menos os JAGAS de CASSANGE,
originárias da família Lunda Tchokwe dos Konte, ou Tchingúri, parentes próximos
dos Tembos (Tchingúri ua Konte ou Kinguri dos Bângalas,
quando o Jaga de Cassange era irmão de Lueji ua Konte, governanta dos Lundas
anteriormente ao primeiro Muatiânvua, e ambos parentes de Dumba Watembo).
Em qualquer caso,
porém, o uso da coroa não podia de modo nenhum ser arbitrário, sem risco de
agravo das relações familiares e oficiais com o estado dos Lundas da Katanga,
seja com Muatiânvuas, e excede as dimensões previstas a esta nota
histórico-biográfica explicar as inúmeras razões porquê.
Também tal uso não
era um enjeite das normas tradicionais, e bem o comprova a presença do diadema
dos chefes Lunda Tchokwes, usando a par com a coroa metálica do Dumba. No
conjunto, devemos entender a presença de atributos de realeza tradicional dos
Tchokwes, com os duma nova realeza, instituída pelos portugueses no oeste. Em
um e outro lado tinha Dumba classificados parentes de cujas reciprocas
dignidades ia resumindo em si honras, senão direitos.
Quando ao colar com «dois
búzios e um pequeno chifre» deve tratar-se de N’zimbo
dos Olivancillaria nana, provenientes da Ilha de Luanda, e
dum chifre de corça (esta última peça geralmente recheada
de produtos de curandice ou magismo é usada como amuleto).
Com vista ao bordão
usado pelo Muene Dumba Watembo, e que muitas vezes lhe caia por terra, temos
que o seu uso era para o efeito de exibir com maior evidência as garras de
metal.
No que respeita aos
anéis de latão, que lhe guarneciam os dedos, estamos em presença de um velho
hábito de LUXO DOS TCHOKWES de categoria.
Conhecemos grandes dignidades Lunda Tchokwes de categoria como Muatchondo e
Tchilumba, em capaia que ostentavam anéis de latão e de cobre finamente
cinzelados, em todos os dedos de mãos e na maior parte dos dedos dos pés. Aliás
os nativos sabem-no bem, o metal amarelo e o cobre principalmente contrastam e
realçam a beleza do tom das peles melanodermes.
Finalmente, quando às
«longas
unhas»
de latão usadas por Dumba Watembo (melhor chamar-lhes
garras e lembrarmos que Dumba significa Leão) trata-se duma
exteriorização visível e tangível dos seus predicados de chefe poderoso, a que
o próprio nome DUMBA não é
estranho.
As garras do Dumba,
como leão e como chefe, expressam a força e o poder de Dumba Watembo, que já
traduzimos como LEÃO DE TEMBO
ou Watembo. Este facto está de acordo com certos estilos e conceitos da vida
Tchokwe, que levam os indivíduos a atribuir a si próprios os nomes e insígnias
que entendem definir ou vincar a sua personalidade, caracter ou acção.
Por via inversa,
também usam marcas ou símbolos que traduzem exteriormente os predicados do nome
ou a condição, ou de ambos os factos ao mesmo tempo. É este o caso das garras
de leão de Dumba Watembo, Rei dos Tchokwes, guerreiro contra os Minungos (guerras
intestinas entre as mesmas tribos Tchokwes), Régulo e senhor
das extensas florestas do mel, cabeça ornada com insígnias de duas realezas
para maior glória dos Tembos e mais temerosa fama dos «demónios
silículas do Tchiboco».
A titulo de pesquisa
genealógica dos antepassados de Dumba Watembo, complementarmente a este
registro histórico-biográfico, podemos acrescentar que, muito antes da presença
dos Tembos na LUNDA dos Muatiânvuas na Katanga Ocidental, onde seria já um
Tembo quem governava, no rio Lulua, um núcleo de povos que vieram mais tarde a
constituir os Tchokwes, o nome Tembo já surgia, nos caminhos do nordeste
Africano.
O QUE DIZ A TRADIÇÃO LUNDA TCHOKWE
Segundo tradições
orais Lunda Tchokwe, que largamente recolhemos durante muitos anos, Tembo
Kalunga (Thumba Kalunga) seria o nome
de um dos filhos, o primeiro deles, de Tembo e Samba,
os primeiros pais, ou pais edénicos, do povo Tchokwe, que tiveram por terra
natal o misterioso LUFANDJIMBA,
paragem que identificamos como sendo o Lago Vitória.
Encontra-se também o
nome Tembo no quadro de reis da UGANDA.
Ocupa o sexto lugar numa lista de 35, de acordo com Henry
Stanley,
“Através
do Continente Negro”, Lisboa, 1880,
Vol.II. págs.61. Tembo e Tembue são toponímicos, a meio da margem ocidental
do TANGANICA,
e na região do Lualaba-Lufira, próximo dos montes Kibara, encontramos mais uma
vez o nome Tembo sob esta e outras grafias, Hermann Baumann,
“Les
Peuples et les Civilisations d’Afrique”, Paris, 1943. Págs. 183.
Seguidamente,
descendo sempre na carta de África, encontramos o nome TEMBO
NA KATANGA, mais tarde no Tchiboco, e em outras regiões da
Lunda e Angola no geral, nestes casos já perfeitamente identificados com o Dumba
Watembo de que estamos a tratar neste texto.
Não podemos deixar de
dizer que esta pré-história dos Tembos é apresentada com todas as reservas.
Ressalvamos, no
entanto, a versão etno-histórica de Tembo Kalunga filho dos primeiros pais
Tchokwes, que é matéria de tradição e crença da própria tribo Tchokwe e Lundas,
e por isso aceitável como história do povo, aliás insistentemente repetida. A
partir daqui, assinalámos o nome Tembo, mas sem lhe podermos assegurar
relações, senão a partir da sua comprovada existência na Katanga, nos finais do
século XVI.
Em 1878 foi descrito
e retratado o Dumba Watembo do Tchiboco, figura central destas notas, algo
biografadas. Dele se pode dizer, que foi o primeiro e último de que se obteve registro.
Nele se resume aqui por esse motivo em certa medida, um esboço geral dos
Tembos.
De acordo com a
oralidade Lunda Tchokwe, Dumba Watembo que temos vindo a descrever é o tio
materno do Rei Muatchissengue Watembo, a linhagem da família real Tchokwe
segundo a genealogia.
Em 1946 visitámos a
zona original do velho estado do Tchiboco. Dos Dumba Watembo perdurava apenas
uma tradição, enfraquecida pela Grande Fome, mortificada pela praga da varíola
que em seguida assolou o território, conforme o relata a história tradicional
daquelas belas florestas, onde os narradores nos descrevem, viva e
dramaticamente, as funambulescas figuras humanas mumificadas pela fome no
período da grande praga.
Podemos localizar
aqui o epílogo do estado do Tchiboco o qual, e pelas razões já citadas, mesmo
sem aquele flagelo, nunca perdurariam, não obstante as garras de latão de Dumba
Watembo, ou de antecessores ou sucessores seus, que muito provavelmente as
tivessem usado também.
OBS:
Thumba Kalunga – Muacanhica,
Muambumba, Makhaia, Muandumba (Dumba) e Tembo, esta teve Muatchissengue e Kaita
Ka Tembo ou Watembo –a história continuará…TEXTO RECOLHIDOS, sobre a historia e
etnografia dos povos da Lunda.