NÃO HÁ INOCENTES NO MPLA SOBRE
AQUELES QUE FICARAM COM A MELHOR PARTE DO BOLO, OS QUE SE ENRIQUECERAM EM 43
ANOS...
Não há inocentes. JES e sua parentela ficaram com a melhor parte do bolo,
mas os outros não ficaram propriamente com migalhas. Por diferentes razões, os
coetâneos de JES são obrigados a seguir-lhe as pisadas. Deixarem também a cena
política.
Em Setembro, já está decidido, José
Eduardo dos Santos (JES) deixará a presidência do MPLA. O acto marcará o
epílogo da trajectória política de um homem que há 38 anos vem marcando a vida
dos angolanos. Representará, também, a partida de um cidadão que deu o seu
melhor quando se entregou a sério. Nacionalista, JES respondeu ainda jovem ao
apelo da terra, aderindo de corpo e alma à luta de libertação.
A sua partida representa, também, o
fim de um período cinzento na história de Angola. Se com uma mão fez o melhor
que podia, foi até ao limite, manteve este país unido, deu o peito às balas
quando a ameaça de desintegração provocada pela UNITA era inegável, com a outra
mão ele desfez quase tudo isso.
“Sequestrado” por uma parte da
família e pela sua entourage, JES fez do Estado angolano uma coutada privada. O
que se vê hoje à volta do Fundo Soberano, a tentativa de transferência de 1.5
biliões de dólares para a Grã-Bretanha, numa operação que tinha o filho varão
como sujeito e actor, a natureza dos contratos e adjudicações sem concurso
público que beneficiaram outros filhos, são algumas das provas de como José
Eduardo dos Santos se perdeu na caminhada. A forma como o general Kopelipa
transformou o novo aeroporto de Luanda numa obra faraónica e privada mostra o desvario
em que isto estava.
Para o bem de todos, este país não
pode permitir, por um minuto que seja, que alguém mais venha a dispor do poder
que JES dispunha até 26 de Setembro passado. Será bom para o país, como será
bom para quem ocupa a presidência ou quem vier a fazê-lo. O que se viu nesta
deriva mostra que não era apenas o país que precisava de ser salvo. JES
precisava também, ele mesmo, de ser socorrido da sua própria deriva. A
entourage e uma parte da família tomaram conta dele, tomaram conta do país,
dispuseram do que era de todos, mas isso não o iliba de nada.
"Independentemente das razões político-constitucionais que o levam a
sair, JES e a sua geração estão ligados por outra razão: cumpriram o seu papel!
A nação agradece o quanto deram, mas têm que aceitar que chegou a hora de
entregarem o testemunho."
Chegados aqui e perante o mal-estar
que se sente em relação à figura dele e de parte da família, é líquido
concluirmos que esta não era a forma como esperava sair de cena. JES percebeu,
finalmente, que ninguém mais porá o pescoço de fora por ele. O mal-estar em
relação a ele e aos seus acelerou o processo de transferência do centro de
gravidade.
Não esperava ser empurrado para
fora por imberbes como Anabela dos Santos e seguramente também não esperava que,
de todos quantos deu a mão, Norberto Garcia e João Pinto, os últimos a chegar –
na verdade de tão trôpegos e broncos nunca chegarão –, fossem os únicos (a par
de Tchizé e de Isabel) a sentir as suas dores. Outros como Pitra Neto, se não
se recolheram, “entregaram-se” às autoridades, como o fez Aldemiro Vaz da
Conceição.
Tudo o que disse até aqui, não
invalida o que disse em Agosto de 2001, quando, ao anunciar a sua primeira
tentativa de retirada efectiva da política, disse que a sua geração já tinha cumprido
o seu papel. Volvidos 17 anos, esta afirmação parece mais actual do que nunca.
É daquelas coisas que sobrevivem ao tempo. JES envelheceu, a sua geração
envelheceu, os que o ouviram dizer isso também envelheceram, mas a maldita
afirmação está aí de pedra e cal. Inamovível e sem ferrugem.
Por conseguinte e independentemente
das razões político-constitucionais que o levam a sair, ele e a sua geração
estão ligados por outra razão: cumpriram o seu papel! A nação agradece o quanto
deram, mas têm que aceitar que chegou a hora de entregarem o testemunho.
Roberto de Almeida deixou a vice-presidência do MPLA; aos 75 anos de idade
também deveria deixar o BP. França Ndalu tem 80 anos; deveria fazer o mesmo.
Aos 76 anos, Dino Matross não deve continuar a gerir um gabinete do
secretariado do MPLA; Magalhães Paiva “Nvunda”( 75 anos) e tantos outros
anciões que JES acomodou em embaixadas ou nomeou como consultores ou
administradores não executivos deveriam fazer o mesmo. Ao não seguirem o
exemplo de JES, esses anciãos estão a comportar-se como “donos” do MPLA, coisa
que muitos dele censuram em JES, o antigo dono disto tudo, DDT.
Se esses mais velhos querem
portar-se à altura do MPLA deveriam acompanhar JES na saída. Seria a melhor
homenagem que lhe poderiam prestar. Gente que gaba a sua magnanimidade deveria
exercer um pouco de grandeza. Seja por ele, seja pelo MPLA, mas que seja
sobretudo pela nação.
Por outro lado, se por acaso alguém
já não se lembra, recordemos. JES esqueceu-se de alguns companheiros de
jornada, mas ninguém deve ignorar o seguinte: não há inocentes. Como se diz na
obra de Pepetela “Jaime Bunda Agente Secreto”, quem parte e reparte se não é
burro, fica sempre com a melhor parte. Já sabemos quem ficou com a melhor
parte. Mas também é verdade que as outras partes não são exactamente migalhas.
Por conseguinte, caros “maquizards” façam o que a nação espera. Que ninguém
tome a saída de JES como uma oportunidade de mandar no MPLA. Que ninguém
menospreze as outras gerações. CA