SAHARAUI, ANGOLA, CABINDA
O
ministro dos Negócios Estrangeiros da República Árabe Saharaui Democrática,
Ould Salek (foto), solicitou, em Adis Abeba, Etiópia, apoio de Angola na
resolução do diferendo que opõe o seu país e o Reino de Marrocos. A experiência
angolana é, de facto, relevante. Veja-se o caso de… Cabinda.
Por Orlando Castro
Em
declarações à imprensa, à margem da 32ª Sessão Ordinária da Comissão Executiva
da União Africana (UA), Ould Salek disse que Angola tem boas relações com os
Estados membros da UA e pode jogar um papel determinante na resolução do
problema.
Sublinhou
que Angola continua a ser um Estado “líder” e influente em África, tendo
felicitado os angolanos pela solidariedade e pelo apoio prestado ao povo do seu
país.
Entretanto,
além de solicitar o apoio de Angola no processo de resolução do diferendo com
Marrocos, Ould Salek exigiu que a UA tenha um papel mais activo na resolução do
problema do Sahara Ocidental.
A
República Árabe Saharaui Democrática reivindica soberania sobre o território do
Sahara Ocidental, antiga colónia espanhola que, por sua vez, Marrocos reclama
como parte do seu reino. Algo semelhante, diga-se, ao que se passa com Cabinda.
“Marrocos
é agora membro da União Africana. Cremos que é dever da UA trabalhar para por
fim à ocupação de Marrocos ao território da República Árabe Saharaui”,
declarou.
Na
perspectiva do seu país, Marrocos “ocupa ilegalmente o território do Sahara
Ocidental”, desde 1976, na sequência da retirada da antiga potência colonial, a
Espanha.
Também,
do ponto de vista dos cabindas, Angola “ocupa ilegalmente o território de
Cabinda”, desde 1975, na sequência da retirada da antiga potência colonial,
Portugal.
Ould
Salek pediu que as Nações Unidas pressionem o Governo de Rabat (Marrocos) para
respeitar as resoluções do Conselho de Segurança, tendo sublinhando que nenhum
Estado africano deve colonizar um país irmão.
“África
não pode tolerar que um país africano colonize outro. Trata-se de uma violação
aos princípios fundamentais da UA”, declarou Ould Salek, que manifestou, por
outro lado, interesse de reforçar a cooperação com Angola.
Tibete, Timor-Leste e muito
mais
Um
dia depois de uma freira budista se ter imolado pelo fogo, e morrido, um
activista tibetano recorreu no dia 4 de Novembro de 2011 à mesma forma de
protesto em frente à embaixada da China em Nova Deli.
No
dia 16 de Julho de 2011, o presidente norte-americano, Barack Obama, manifestou
uma “preocupação sincera” sobre os direitos humanos no Tibete.
Saberão
os EUA o que é Cabinda? Não sabem, com certeza. Se até os presidentes do país
(Portugal) que assinou um acordo de protectorado com Cabinda não sabem…
Barack
Obama é “o presidente da maior democracia e, naturalmente, manifestou a sua
preocupação com os valores humanos fundamentais, com os direitos humanos e com
a liberdade religiosa”, disse na altura o líder espiritual dos tibetanos.
Recorde-se
que, segundo o conselheiro jurídico e político do líder tibetano, Michael Van
Walt, a proposta de autonomia apresentada pelo Dalai Lama à China “é muito
parecida à que José Ramos-Horta propôs à Indonésia” em 1995-96.
Michael
Van Walt considerava também que o que aconteceu em Timor-Leste e no Kosovo
“tornou as coisas mais difíceis para o Tibete”.
No
que a Cabinda respeita, Portugal não se lembra dos compromissos que assinou
ontem e, por isso, muito menos se recordará dos assinados há mais de 100 anos.
E, tanto quanto me parece, mesmo os assinados ontem já estarão hoje fora de
validade.
Portugal
não só violou o Tratado de Simulambuco de 1 de Fevereiro 1885 como, pelos
Acordos de Alvor, ultrajou o povo de Cabinda, sendo por isso responsável, pelo
menos moral (se é que isso tem algum significado), por tudo quanto se passa no
território, seu protectorado, ocupado por Angola.
Quando
o então presidente da República de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, dizia que
Angola vai de Cabinda ao Cunene estava, desde logo, a dar cobertura e a ser
conivente, como acontece com a China em relação ao Tibete, com as violações que
o regime angolano leva a efeito contra um povo que apenas quer ter o direito de
escolher o seu futuro.
Para
além do Tibete, não seria mau que Portugal olhasse para Espanha e Angola para
Marrocos. Ou seja, para a questão do Saara Ocidental, antiga colónia espanhola
anexada após a saída dos espanhóis, como parte integrante do reino de Marrocos.
Recorde-se
que o governo espanhol, na altura liderado por José Luís Zapatero, mostrou – ao
contrário de Portugal – coragem política não só ao reconhecer o direito do povo
saharaui à autodeterminação como ao levar a questão às Nações Unidas.
Mas
terá Cabinda similitudes com Timor-Leste? E com o Kosovo? E com o Saara
Ocidental?
Embora
a comunidade internacional (CPLP, União Europeia, ONU, União Africana e
similares elefantes brancos) assobie para o lado, o problema de Cabinda existe
e não é por não se falar dele que ele deixa de existir.
Cabinda
é um território ocupado por Angola e nem o potência ocupante como a que o
administrou pensaram, ou pensam, em fazer um referendo para saber o que os
cabindas querem. Seja como for, o direito de escolha do povo não prescreve, não
pode prescrever, mesmo quando o importante é apenas o petróleo.
Por
alguma razão, em 1975, o Governo de Lisboa reconheceu o MPLA como legítimo e
único governo de Angola, embora tenha assinado acordos com a FNLA e a UNITA. O
resultado ficou à vista nos milhares e milhares de mortos da guerra civil.
Cabinda
(se é que os governantes portugueses, sejam eles quais forem, sabem alguma
coisa sobre o assunto) também é um problema político e não jurídico, “embora
tenha uma dimensão jurídica de enorme complexidade”.
Segundo
os governos portugueses, no actual contexto geopolítico, Cabinda é Angola.
Amanhã, mudando o contexto geopolítico, Portugal pensará de forma diferente. Ou
seja, a coerência é feita – à boa maneira portuguesa – ao sabor do acaso, dos
interesses unilaterais.