PROCESSO DE MANUEL VICE PÕE EM
CAUSA EXPORTAÇÕES DE PORTUGAL PARA ANGOLA
Depois
de Portugal ter recusado transferir o processo de acusação contra Manuel
Vicente para Angola, João Lourenço ameaça avançar com um conjunto de medidas de
retaliação.
As
relações entre Angola e Portugal poderão estar prestes a passar por dias
turbulentos. Depois de a Justiça portuguesa ter recusado transferir o processo
que envolve o pagamento feito a Orlando Ferreira pelo ex
vice-Presidente angolano para obter decisões favoráveis, Luanda não está
contente com a decisão. Somado a consequências nas relações unilaterais e
bilaterais, está uma possível redução significativa das importações, para
além de outras medidas de retaliação.
O
caso remonta a 2016, mas os pagamentos terão acontecido muito antes. Na altura,
Orlando Ferreira assumia o cargo de procurador do Ministério Público no
Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), e terá aceite
um pagamento de 760 mil eurospor parte de Manuel Vicente para a obtenção
de decisões favoráveis. Esta é uma das muitas acusações que surgiram no âmbito
da Operação Fizz, onde constam como arguidos o advogado Paulo Blanco e Armindo
Pires, acusados de corrupção ativa e branqueamento de capitais em coautoria.
No
entanto, segundo apurou o Jornal de Negócios (conteúdo pago), Angola está
convicta de que o seu ex vice-presidente não será julgado no âmbito dessa
operação, devido o facto de o tribunal português ter falhado a notificação de
Manuel Vicente. Contudo, o caso não fica por aqui, nomeadamente no que diz
respeito às retaliações por parte de Luanda. Assim, restam duas hipóteses: ou
Manuel Vicente é julgado de forma separada dos restantes arguidos ou
é emitido um mandado de captura internacional.
Independentemente
disso, a postura do país africano não é das mais calmas. Após ter pedido a Portugal para o processo ser transferido para lá e a
Justiça portuguesa ter recusado, Angola passou a encarar isso como uma
“ofensa”, algo que trará implicações nas relações bilaterais. De
acordo com informações reveladas ao Negócios, o caso vai deixar uma
“ferida política” que terá impacto nas relações diplomáticas e econômicas
entre os dois países.
Portugal
é acusado pelo Governo angolano de não respeitar os acordos bilaterais e
unilaterais assinados no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
(CPLP), ao recusar o pedido de transferência do processo. João Lourenço, na
altura afirmou que a intenção não era livrar Manuel Vicente das culpas nem
pedir o arquivo do processo.
Para
além de uma possível saída de Angola da CPLP, as consequências poderão ir bem além disso. O país
está a pensar, segundo fontes ouvidas pelo Negócios, reduzir de forma
substantiva as importações, acabando por beneficiar outros países em detrimento
de Portugal, como por exemplo Espanha ou Itália. Angola representa um dos
principais destinos das exportações portuguesas, com mil milhões de euros
registados em 2016.
Para
além disso, poderá ocorrer um atraso nos pagamentos às empresas
portuguesas, um problema que já se colocou no passado, além de que
as empresas portuguesas podem passar a ser preteridas de forma sistemática
nos concursos e empreitadas lançadas pelo Governo de Angola.
Mais
ainda, poderão ser impostas barreiras aos bancos com capital português. O
Presidente angolano não falou sobre o assunto mas, num encontro com
jornalistas, deu a entender que essas medidas de retaliação estão pensadas:
“Não posso revelar”. Mas João Lourenço já mandou avaliar as participações detidas
pelo Estado angolano ou por empresas públicas em bancos nacionais e
estrangeiros, incluindo o Millennium BCP, a realizar por um grupo de
trabalho liderado pelo ministro das Finanças.
O
primeiro-ministro, António Costa, tem tentado colocar alguma água na fervura
neste dossiê, garantindo que “as relações entre Portugal e Angola vão decorrer
com toda a normalidade possível, num contexto em que há um problema“. Mas, o
caso parece preocupar o Ministro dos Negócios Estrangeiros. Augusto Santos
Silva disse estar “muitíssimo preocupado, porque há aqui um ‘irritante’
que afeta o relacionamento bilateral, com a agravante de que a solução não
depende do Governo português”.