E JÁ SÃO OITO DIAMANTES COM
MAIS E 100 QUILATES
A multinacional mineira
australiana Lucapa anunciou hoje a descoberta do oitavo diamante com mais de
100 quilates no campo diamantífero do Lulo, na província da Lunda Norte,
considerado como de “valor excepcional”, pela sua qualidade.
Trata-se
de um diamante de 129,58 quilates, recuperado num dos três aluviões do rio
Cacuilo e o sexto maior extraído no conjunto do campo do Lulo, localizado no
município de Capenda Camulemba, ladeado pelos projectos Cacuilo e Capenda, numa
sociedade constituída pela parceria entre a estatal Endiama (32%), a Rosa e
Pétalas (28%) e a Lucapa Diamond (40%), que é também operadora da mina.
“Continuamos
a avançar sistematicamente com esforços para localizar a fonte primária de
diamantes, com um programa de perfuração contínuo financiado com os fortes
retornos gerados pelas operações de mineração aluvial de Lulo”, explicou
Stephen Wetherall, director da mina, acrescentando que, de uma lista inicial
com mais de 200 anomalias, a prospecção centra-se actualmente em “70 alvos
prioritários de perfuração”.
“Continuamos
a avaliar maneiras de acelerar este programa de perfuração e amostragem
sistemática, uma abordagem que acreditamos oferece a melhor oportunidade para
desbloquear o verdadeiro valor do Lulo”, apontou ainda o responsável.
Este
anúncio, feito em conjunto com a descoberta de outro diamante de grandes
dimensões, com 78,61 quilates, num outro aluvião do Lulo, surge precisamente na
semana em que o maior diamante encontrado em Angola, no mesmo campo mineiro,
vai ser leiloado.
O
diamante foi comprado em 2016 pela joalharia suíça De Grisogono, de Isabel dos
Santos e Sindika Dokolo, respectivamente filha e genro de José Eduardo dos
Santos, e transformado numa jóia rara de 163,41 quilates que será leiloada na
terça-feira.
O
diamante, o 27º maior em todo o mundo, tinha originalmente 404,2 quilates e
sete centímetros de comprimento quando foi encontrado, em Fevereiro de 2016,
pela empresa mineira australiana no campo do Lulo.
Segundo
informação da Christie’s, que vai conduzir o leilão, a realizar em Genebra, o
diamante foi transformado por uma equipa de 10 especialistas e incorporado num
colar – constituindo duas jóias -, depois de os estudos realizados pelo
Gemological Institute of America (GIA), em Nova Iorque, terem comprovado a sua
“extrema raridade” e relevância.
Trata-se
igualmente do maior diamante do género a ser levado a leilão, segundo a
Christie’s.
Em
Maio de 2016, o empresário e coleccionador de arte Sindika Dokolo, marido da
empresária Isabel dos Santos, sócios na De Grisogono, confirmou que comprou,
através daquela joalharia suíça, o maior diamante encontrado em Angola.
“Confirmo
essa informação”, disse o empresário, sem adiantar mais pormenores,
nomeadamente os valores envolvidos no negócio.
As
companhias de diamantes angolana Endiama (estatal) e australiana Lucapa
anunciaram a 01 de Março, em comunicado, a venda deste diamante.
“A
pedra de 404 quilates vendeu-se por 16 milhões de dólares [13,6 milhões de
euros], o que representa um espectacular preço de 39,5 dólares por quilate, um
recorde para um diamante branco extraído da mina do Lulo”, lê-se no comunicado
da empresa australiana.
Aquando
da descoberta, a Endiama anunciou que a venda contribuirá para as contas do
Estado.
Depois
do petróleo – cujas receitas caíram para metade desde 2015, devido à crise da
cotação do barril de crude -, os diamantes são o segundo produto de exportação
de Angola.
… E por falar na De Grisogono,
Isabel e Sindika
Para
quem não sabe (isto é como quem diz!), Isabel dos Santos é filha do Presidente
do MPLA (José Eduardo dos Santos), do ex-Titular do Poder Executivo (José
Eduardo dos Santos) e do ex-Presidente da República (José Eduardo dos Santos)
que, aliás, foi quem a nomeou para Presidente do Conselho de Administração da
Sonangol.
Fundada
em 1993 e com clientes como Sharon Stone ou Kim Kardashian, a compra da
joalharia De Grisogono foi feita em 2012 através da empresa “Victoria Holding
Limited”, uma parceria entre a empresa do regime angolano Sodiam (Sociedade de
Comercialização de Diamantes de Angola) e uma empresa privada, “Melbourne
Investments”, que tem o marido de Isabel dos Santos, Sindika Dokolo, como o
único proprietário.
Segundo
a revista Forbes, “não é claro que Dokolo tenha feito algum investimento
financeiro na Melbourne Investments ou se a Melbourne contribuiu com dinheiro
para a compra”.
“A
Sodiam, enquanto empresa estatal (a sua equipa de gestão, o presidente e
director-executivo foram todos – até à chegada de João Lourenço à Presidência
de Angola – nomeados por José Eduardo dos Santos), é obrigada a declarar
publicamente todos os seus negócios no país e no estrangeiro, mas até agora a
parceria com Dokolo era um segredo”, escreveu a revista em 2014, dois anos
depois da compra.
No
ano passado, a De Grisogono comprou o diamante bruto mais caro do mundo, o
Constellation, de 813 quilates, por 63.1 milhões de dólares (cerca de 60
milhões de euros). Também em 2016, comprou um diamante de 404 quilates e sete
centímetros de comprimento, o maior alguma vez encontrado em Angola, por uma
quantia não divulgada. No mês em que foi encontrada esta pedra, outros sete
diamantes de grandes dimensões foram descobertos numa mina na província da
Lunda Norte, uma zona muito pobre onde não existe electricidade ou ligações
telefónicas em grande parte do território.
Na
campanha presidencial de 2012, no entanto, segundo o que foi divulgados
publicamente, também pelo Folha 8, o presidente José Eduardo dos Santos
queixou-se de que as receitas da extracção de diamantes na região não chegavam
“sequer para pagar as estradas”.
A
De Grisogono até há bem pouco tempo era uma pequena empresa onde trabalhavam
150 pessoas, em Plan-les-Ouates, perto de Genebra, na Suíça.
Com
boutique na Madison Avenue, em Nova Iorque, mas PME de importância mediana no
ramo da joalharia e relógios de luxo, de repente, eis que ficamos a saber que
essa “cambuta” ambiciona ser líder mundial desse sector.
A
razão foi (é) uma pedra, grande, um diamante que aterrou na sua mesa como que
caída do céu ou por encanto, dando origem a uma mega festança que reuniu 700
VIP’s, modelos de “passerelle” e actrizes, organizada em Maio de 2016 por
ocasião do Festival de Cinema de Cannes no Eden Roc e com ampla mediatização na
imprensa internacional.
O
fundador, PCA e director artístico da De Grisogono, Fawaz Gruosi, a partir daí
começou a ver o futuro da sua empresa em tons de azul e ouro, com notas verdes
pelo meio, depois de ter comprado a referida pedra, excepcional, um diamante
angolano de 404 quilates, então recentemente encontrado na mina de Lucapa,
província da Lunda-Norte.
“Estou
muito nervoso, este diamante tira-me o sono, é a primeira vez que me preocupo
por não ser capaz de fazer o que tenho que fazer. A minha responsabilidade é
enorme”, disse Fawaz Gruosi, solicitado a comentar, na sua boutique de Nova
Iorque, a descoberta do pedregulho. Responsabilidade tão grande que Gruosi não
se aventurou a lapidar o mambo sozinho e recorreu aos serviços do prestigioso
lapidário nova-iorquino Ben Green.
Compreensível,
pois a verdade é que, com o “404”, a sua empresa e ele próprio mudavam de
estatuto, como alegou um especialista do ramo diamantífero em Genebra. “Em
geral, este tipo de aquisição é reservado às maiores empresas, como a Graff ou
a Winston”, disse ele.
Trata-se,
de facto, de um golpe de mestre. O “404” era o maior diamante jamais descoberto
em Angola e nunca a marca De Grisogono tinha obtido uma pedra deste calibre.
Mas
vamos com calma… por essa altura, o que de maior reboliço e irritação grassava
na área diamantífera entre os concorrentes da De Grisonogo, era o ciúme, a sua
meteórica ascensão e a exageradamente dispendiosa maneira de divulgar a
existência desse diamante na supra-citada gala VIP no Eden Roc, organizada no
em pleno Festival de Cinema de Cannes, em Maio de 2016.
Por
outro lado, sejamos francos, a De Grisogono podia dar-se ao luxo de ser
generosa. Porque a sua marca, contas bem feitas, tem aliados que lhe permitem
desempenhar um papel de liderança.
Recapitulemos.
Em 2012, a empresa foi adquirida – por meio de uma montagem ad hoc, offshore –
pelo empresário Sindika Dokolo, marido de Isabel dos Santos.
Monsieur
Dokolo avançou com 100 milhões de francos suíços destinados a transformar a De
Grisogono num cliente privilegiado de diamantes angolanos destinados à
joalharia. Vai de si que, com a compra do “404”, esta visão estratégica se
concretizou na prática de maneira deveras espectacular.
Por
outro lado, Sindika Dokolo também está por trás da Nemesis, uma empresa de
diamantes em Dubai, nada de um parente 18 meses antes. De acordo com o seu
director, Nicky Polak, foi ela, a Nemesis, que comprou o “404” à empresa
estatal angolana, Sodiam, antes de vender os seus direitos à De Grisogono (que
não pagou nem um Luei, só pagaria no final da lapidação e receberá lucros que
se contam em milhões de dólares).
Portanto,
não é preciso ser perito em economia para ver neste lance que o diamante passou
de uma empresa do Estado, controlada pela filha do então presidente da
República, Sodiam, para as empresas privadas, Nemesis e De Grisogono, que são
propriedade de Sindika Dokolo, marido da dita filha do dito ex-presidente.
Entretanto,
perguntas ficam no ar: quantos milhões de dólares do Estado foram vazados para
bolsos privados neste lance? Quantos biliões de dólares, em nome da lei
instaurada por este regime, em nome dos usos, dos costumes e das velhas
técnicas arcaicas de enriquecimento, têm sido, ao longo de décadas, ou melhor,
ao longo de séculos, desviados em detrimento do verdadeiro dono do nosso país,
o povo de Angola? Ela, a lei, existe, isto não é roubo, é simplesmente um
histórico desfalque institucionalizado.
Folha
8 com Lusa