DOIS DISCURSOS, UM
SÓ PENSAMENTO – MIHAELA WEBBA KOPUMI
Luanda - Ao
terminar o ano de 2013, o Presidente da UNITA, Isaías Samakuva, propôs ao País
a abertura de um novo processo constituinte para a celebração do contrato
social angolano, visto que, como afirmou, “quer a proclamação da independência,
em 1975, quer a assinatura dos Acordos de Paz, em 1991, quer ainda a subscrição
do Memorando de Entendimento do Luena, em 2002, não produziram o Contrato
social angolano”.
Isaías
Samakuva e Lopo do Nascimento: Dois adversários unidos em torno de duas
teses fundamentais
Samakuva não podia
ser mais claro e objectivo sobre as razões para tal proposta, quando afirmou:
“Quando a Constituição é pisada todos os dias por quem a devia proteger, quando
o futuro dos filhos de uma Nação é sequestrado por quem o devia garantir;
quando o Governo entra em conflito aberto com o povo e passa a violentar a
dignidade da pessoa humana; quando a Presidência da República se torna o
epicentro da corrupção; enfim, quando o Estado deixa de ser uma pessoa de bem e
passa a viver à margem da lei e da ética, devemos concluir que a República ruíu
e o Estado faliu. A Nação precisa de celebrar um novo Contrato social”.
A classe política e
seus críticos da sociedade civil, não reagiram. Fiquei triste, porque esta foi,
creio, a proposta mais profunda e objectiva que já ouvi para a gênese dos
problemas do país. “Não perceberam, ou quê?” – perguntei-me.
Finalmente, na passada semana, e para minha agradável surpresa, uma voz se fez
ouvir. Pela primeira vez desde que nasci, na década da independência,
ouvi um político do MPLA a responder com igual profundidade e angolanidade ao
pensamento político da UNITA, segundo o qual “os angolanos precisam de
construir a sua nação”.
"Criamos os
Estados, fizemos os Governos, mas falta criarmos a Nação,” disse Lopo do
Nascimento, dirigindo-se supostamente aos jovens: ”Os vossos pais, os vossos
avós meteram-se na trilha da libertação que levou à independência de África.
Agora é altura de vocês meterem-se na trilha da construção da nação".
Não entendi as
palavras do Mais Velho Lopo como um simples discurso de despedida ou uma mera
‘mensagem aos jovens Deputados’. Pelo contrário. Entendi-as como um
posicionamento claro de um patriota que pretende não só assumir as suas
responsabilidades históricas como também contribuir para a construção do
futuro. Primeiro dentro do MPLA, posicionando-se como líder de uma corrente
nacionalista e patriótica. Depois, como ‘construtor dos alicerces da Nação’.
Comparei então os
vários pronunciamentos de Samakuva, ao longo dos últimos meses com o único
pronunciamento de Lopo e encontrei as seguintes ideias convergentes:
“Precisamos de uma nova matriz política, uma nova matriz económica, uma nova
matriz social para a construção da nação angolana”, afirmou Samakuva. “Temos de
pensar em novos modelos, novos rumos para a África”, respondeu Lopo. “Não há
saída para os problemas de Angola a não ser na democracia. Só a democracia, a
mais auténtica que conseguirmos construir, poderá resolver os problemas de
Angola”, asseverou Samakuva. “as eleições são necessárias, mas não são
suficientes”, respondeu Lopo.
Lopo procurou
explicar a exclusão (que o MPLA pratica) com a natureza
étnico-linguístico-cultural de muitos partidos políticos: “...As eleições são
um processo de exclusão, e precisamos em África de processos de inclusão....Em
África, a maioria dos partidos são muito assentes numa base
étnico-linguístico-cultural de modo que quando as eleições excluem um Partido
não é uma organização política que está a ser excluída mas sim um grupo social
étnico-linguístico-cultural; é esta exclusão resultados de processos eleitorais
fomentados do Norte que está na base de muitas situações que temos no
continente”.
Na resposta de
Samakuva, está implícita a tese de que as eleições só serão excludentes
se não forem democráticas: “A democracia é inclusiva por natureza, por isso não
pode excluir ninguém. A democracia é o único regime político que nos permite
divergir sem perder a capacidade de nos unir. Se juntos fomos capazes de construir
as Forças Armadas Angolanas –FAA, juntos seremos capazes de construir as
autarquias, as regiões autónomas, o Tribunal Eleitoral, as autoridades
administrativas independentes, a Alta Autoridade Contra a Corrupção e outras
instituições da nova República. E quando digo ‘juntos’, não me refiro apenas à
UNITA e ao MPLA, mas a todas as forças patrióticas do país, no litoral, no
interior e na diáspora”- afirmou Samakuva.
Lopo parece não
discordar com o essencial: nós é que precisamos de construir ‘a nossa
democracia, as nossas instituições, a nossa matriz, o nosso modelo: “Vocês,
jovens, têm de estudar em conjunto novos rumos para África, e não serem meros
papagaios repetindo o que vem do Norte".
Samakuva reconheceu
que as transformações que o país reclama são profundas e, por isso, concorda
com os que advogam a necessidade de uma ‘revolução democrática’ para Angola.
Tal revolução começa nas nossas mentes e objectiva criar “os fundamentos da
nova República”, consagrar “as opções para se efectivar, de facto, a
reconciliação nacional”; definir “os caminhos a trilhar para a
despartidarização e refundação do Estado”; consagrar o quadro institucional
para a “gestão da transição para a nova República”; “construir instituições
democráticas sólidas” e acordar “o calendário de implementação das reformas
políticas, económicas e culturais”. Estes são, segundo Samakuva, os conteúdos
do novo contrato social angolano para a construção da nação.
Lopo, naturalmente,
não foi tão objectivo, mas, no essencial, foi igualmente profundo ao reconhecer
que há necessidade de uma discussão profunda das questões verdadeiramente
importantes para o país: “A nação não é de nenhum partido, é obra de todos e
pertence a todos, e quanto mais um País africano avançar na construção da Nação,
menor será a possibilidade de surgirem as crises que têm afectado o nosso
continente... "”..O futuro deste país, cujo presente custou sangue, suor e
lágrimas está nas vossas mãos, e vocês, jovens, não podem perder-se em
discussões de infantários, que apenas vos dividem e impedem posições de acções
comuns em relação ao que é verdadeiramente importante para o futuro do
país".
Isaías Samakuva e
Lopo do Nascimento, dois nacionalistas, dois Partidos, dois discursos, mas um
só pensamento. Dois adversários unidos em torno de duas teses fundamentais:
1- Celebrar o
contrato social angolano para a construção da nação é tarefa prioritária, de
todos, e dispensa disputas partidárias.
2- A conquista
da democracia plena antecede as disputas eleitorais.
Se Lopo for capaz de
transformar as suas teses em teses do MPLA, Angola sairá a ganhar. Aliás, só
assim se poderá apreciar a bondade das palavras do Presidente da UNITA sobre o
MPLA: “Angola precisa do MPLA, mas já não precisa de JES”.
Afinal, é possível
construir a unidade das forças patrióticas para resgatar a Pátria, refundar o
Estado e construir a Nação, tal como propus, em Junho de 2011, na Conferência
sobre «Transparência, Corrupção, Boa Governação e cidadania em Angola», quando
dissertei sobre «A construção da Democracia e o fenómeno da corrupção na
República de Angola».
Aguardo,
ansiosamente, que outros nacionalistas se manifestem.
Viva Angola.