A EVOLUÇÃO POLÍTICA DE AFRICA E
A LUNDA 1884 – 1891 (PARTE V - FINAL)
5.-A
QUESTÃO DE PORTUGAL E A MEDIAÇÃO FRANCESA
5.1.-
OS INTERESSES COMUNS DE PORTUGAL E DA FRANÇA NA “QUETÃO DO ZAIRE”
As
negociações da Associação Internacional com a França e depois com Portugal
foram morosas, como era de prever. Para estes dois países não era bastante o
reconhecimento da bandeira da Associação. Qualquer convenção que se celebrasse
tinha necessariamente de incluir uma delimitação de fronteiras, delimitação,
essa que as ambições EUROPEIAS excessivas de Leopoldo II em África não
facilitavam.
Entre
a França e Portugal havia evidentemente interesse comuns no Baixo Zaire. E, por
isso, ambos acordaram em não concluírem qualquer convenção com a Associação sem
prévio aviso de um a outro país, trabalhando, porém, separadamente, sem se
perderem de vista. A própria «FRANÇA achava prejudicial que Portugal contasse
demasiado com ela» (49) – Marques do
Lavrador – Portugal em África depois de 1851, p.94.
As
negociações entre a Associação Internacional e a França decorriam em PARIS,
e para lá foi enviado o adido militar português em Berlim, capitão de
engenharia Carlos Roma du
Bocage.
A
posição da França, expressa por JULES
FERRY ao Visconde de AZEVEDO DA
SILVA, encarregado dos Negócios de Portugal em Paris,
parecia clara: «A França não reconhece nem deixa de reconhecer os direitos de
Portugal sobre o CONGO até 5º 12’, mas declara que não tem intenção nem irá
além deste paralelo» (50) – AMNE- Caixa
«Conferência de Berlim». Confidencial A, de 26 Dezembro de 1884, enviada de
París pelo Visconde de Azevedo da Silva ao ministro e Secretario de Estado dos
Negócios Estrangeiros.
As
exigências da Associação iam até ao ponto de pedir à França, em troca das suas
estações sobre o NIERI, a margem esquerda do Congo, junto de STANLEY-POOL,
e quinze milhões de francos…(51)-Jornal
do Commercio, n.º 9.340, de 14 de Janeiro de 1885. Ferry, por isso, achava indispensável que Portugal
e a França se opusessem vivamente às manobras do rei LEOPOLDO II,
embora fosse de opinião que era necessário fazer-lhe algumas concessões, «Já
que a Associação havia empregado esforços e dinheiro desde que adquiriria
terrenos em África» (52)- Livros
Branco sobre a questão do Zaire II, doc. n.º 79, p.105.
Contudo,
aos delegados da Associação declarava que tinham de contar com o Governo
Português, visto que «si le
Portugal n’est pas une grande puissance
– dizia -, il a des droit e
til saura les défenndre» (53) – Livro Branco sobre a questão do Zaire II,
doc. n.º 79, p.105.
Nestes
termos, a missão do Carlos Roma du Bocage era principalmente a de demonstrar a
FERRY que os Portugueses estavam «de acordo quanto à vantagem de trabalharem
separadamente, embora para o mesmo fim, empregando cada um todos os seus
esforços, porque os interesses de Portugal nesta conjuntura eram análogos» (54) – ibidem,
doc. n.º 78, p.104., se a França se
separar de Portugal, tanto quanto se sabe, o isolamento podia ser fatal para
ambos. No
dia 31 de Dezembro de 1884 chegava a Paris o adido militar de Portugal em
Berlim. À uma hora e meia ele foi apresentado ao Presidente do Conselho de
Ministros Francês pelo visconde de Azevedo da Silva. Ferry e Bocage ficaram de
acordo no plano de acção já antes delineado perante a Associação.
Na
entrevista havida no dia 8 de Janeiro, Ferry perguntou quais as concessões que
«Portugal podia ou desejava
fazer à Associação». O visconde de
Azevedo da Silva respondeu que «era
preferível esta sociedade primeiro declarasse o que pretendia». Disse então o presidente do conselho «que lhe parecia que ela desejaria a cessão de
toda a margem do Zaire, Noki, e a faculdade de construir um caminho-de-ferro na
margem esquerda».
Esta
ideia de um caminho-de-ferro marginal no Congo tinha sido trazida à Conferência
de Berlim na sessão de 27 de Novembro de 1884 por iniciativa de SANFORD
(56) – Livro branco dos protocolos da
conferência de Berlim, protocolo n.º 3, p.30.
Mas tal
proposta era apenas o propósito de conseguir em Berlim a adesão das Potências
Europeias ao que andava preocupando LEOPOLDO
II havia quase dois anos. Com
efeito, LEOPOLDO II desde Fevereiro de 1883 que se mostrava empenhado
em formar uma companhia anglo-francesa-belga para explorar o Congo (Zaire) por
meio de um caminho-de-ferro.
(57) – Vid. ANSTEY, Roger – Britain and the Congo in the nineteenth
century, pp.182-209.
Nas
conversações com Ferry, Portugal protestou sempre nos direitos que possuía
sobre os territórios de Cabinda e Molembo (58),
com base no principio de serem
eles enunciados na Carta
Constitucional, como partes
integrantes da Nação Portuguesa (59). As
pretensões da Associação Internacional reclamava de Portugal toda a margem
direita do Congo e um caminho de ferro – já se disse – na margem esquerda até
sítio de fácil acesso como porto (60).
(58).- Livro Branco sobre a Questão do Zaíre (II),
doc.n.º 92, p.106.
(59).- A
Carta Constitucional de 1826 dizia assim:
«ARTIGO 2
– O seu território forma o Reino de Portugal e dos Algarves e compreende:
§ 1.º - Na Europa, o Reino de
Portugal, que se compõe das Províncias do Minho, Trás-os-Montes, Beira,
Estremadura, Alentejo e Reino do Algarve e das Ilhas Adjacentes, Madeira, Porto
Santo e Açores.
§ 2.º - Na África Ocidental, Bissau
e Cacheu; na Costa da Mina, o Forte de S.João Baptista de Ajudá, Angola,
Benguela e suas dependências, Cabinda e Molembo, as Ilhas de Cabo Verde e as de
S. Tome e Príncipe e suas dependências; na Costa Oriental, Moçambique, Rio
Sena, Sofala, Inhambane, Quelimane e as Ilhas de Cabo Delegado.
§ 3.º - Na Ásia, Salsete, Berdez,
Goa, Damão e os estabelecimentos de Macau e das Ilhas de Solar e Timor.
ARTIGO 3 – A Nação não renuncia o
direito, que tenha a qualquer porção de território nestas três partes do mundo,
compreendida no antecedente artigo.»
(60) – Livro Branco sobre a
Questão do Zaire (II), doc, n.º 83, p.107.
OBSERVAÇÃO: como o leitor pode observar,
em 1826, EUROPEU nenhum havia cruzado nas
terras da LUNDA, aqui esta a prova material, porque a CARTA CONSTITUICIONAL
PORTUGUESA NESTA EPOCA ESTA BEM CLARO nos
seus artigos 2.º e 3.º. Durante a evolução política da África entre 1884 à
1891, período em que se esta a decorrer a conferência de Berlim, Henrique
Augusto Dias de Carvalhos e outros exploradores Europeus ainda estavam a percorrer
o interior da LUNDA, entretanto não foi a Conferência de Berlim que fixou
limites fronteiriços da Nação Lunda, vamos nos bater até o processo chegar as
Nações Unidas e ao Tribunal Internacional em Haia.
5.2.-
A PRIMEIRA PROPOSTA DE ACORDO DE JULES FERRY
Esta
proposta da Associação, relativa ao Baixo Congo, considerava-a também Ferry
inadmissível e não teve ele coragem para no-la apresentar. No seu critério, se
Portugal reduzisse os direitos de trânsito, as nações estariam dispostos a
reconhecer de Portugal nos seguintes territórios:
«1.º Cabinda e Molembo, com algum território em
redor destes dois pontos, que estão inscritos na Carta Constitucional
Portuguesa:
2.º A margem esquerda do Zaire, desde um ponto a
determinar em frente de Boma até à foz do rio, e, desde a foz, toda a costa até
ao Ambriz;
3.º Finalmente uma extensão de terreno no interior
até à parte navegável do Cuango com um porto sobre o rio.» (61) – Livro
Branco sobre o Zaire (II), doc, n.º 85, p. 109 -112
Na
ideia de FERRY, era «necessário que Portugal abandonasse uma
parte considerável das suas reclamações quanto aos territórios do Congo ou
Zaire se quisermos, e, concedesse ao comércio internacional grandes vantagens;
de outro modo a sua insistência poderia irritar as Nações, e com especialidade
a Alemanha, que desejava criar na África novos mercados para os seus produtos.
Com
uma entrada no Congo e o reconhecimento pelas potências Europeias de uma grande
parte dos territórios reclamados, Portugal devia considerar-se satisfeito, pois
desta forma evitaria o descontentamento das Nações. E o grande argumento de que
as potências Europeias se serviam era que Portugal não estava no Congo (Zaire).
E de facto, Portugal não estava no Congo.
Em
Dezembro de 1884, Portugal reclamava os Tratados de Protectorado Assinados com
os indígenas, reconhecidos e garantido pelas Potências Europeias, de modo a
permitir uma expansão para o interior, para além das fronteiras de Angola ou
dentro do coração de Africa e em Moçambique, que seria uma justa compensação da
parte que Portugal pudesse ceder no Congo. (63)
– AMNE – Caixa «conferência de Berlim, telegrama de 18 de Dezembro de 1884 do
ministro e secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros para Serpa Pimentel.
No
dia derradeiro do ano de 1884, em telegrama para o encarregado de Negócios de
Portugal em Paris, admitia «na última
extremidade» a cedência do Boma
por troca do reconhecimento deste «PROTECTORADO» (64).
A
Associação teimava nas suas ambições, e Carlos Roma du Bocage chegou a ser
autorizado a propor a arbitragem da França, que servia de medianeiro, para a
resolução da pendência (65).
(64)- Ibidem, telegrama de 21 de Dezembro de 1884
(65).- Ibidem, telegrama de 11 de Janeiro de 1885
do ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros para o encarregado
de Negócios em Paris.
5.3.- A SEGUNDA
PROPOSTA DE ACORDO DA FRANÇA
Logo a seguir, em 21
de Janeiro de 1885, propôs a França que Portugal ficasse com a costa do Ambriz
na margem esquerda até 13º de longitude (66),
daqui
até cerca de 6º de latitude e depois até ponto a determinar perto do 16º
meridional «para daí se traçar uma linha diagonal até
encontrar o rio Cuango, zona navegável» (67). Para a Associação
Internacional ficaria tudo o mais. A esta proposta,
respondeu, no dia seguinte, Carlos Barbosa Roma du Bocage,
que Portugal não poderia celebrar com a Associação Internacional qualquer
acordo que implicasse a sua perda de NOQUI,
de MOLEMBO
e CABINDA.
Ao mesmo tempo, o
ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal manifestava a sua confiança no
apoio desinteressado da França e lembrava que esta proposta era quase idêntica
à primeira que FERRY considerava
inaceitável.
Entretanto, o
governo da província de Angola que, nos fins do ano, tinha
recebido de LISBOA instruções
confidenciais para ocupar alguns pontos de território do Zaire a fim de evitar
que a Associação Internacional os ocupasse primeiro e desalojar p ela força os
agentes da Internacional que pretendessem manter-se dentro dos domínios de
Portugal, cuidou de anular em BOMA
os contactos fraudulentos impostos por DELCOMUNE
às autoridades gentílicas da região (68).
(66),(67) e (68).- O Doc. n.º87 do Livro Branco
sobre a Questão do Zaire (II), traz latitude, o que é manifesto lapso.
P.109-112
5.4.- A
TRANSFERÊNCIA DAS NEGÓCIAÇÕES DE PARIS PARA BERLIM
Em Berlim, o barão de
Courcel apresentara aos delegados de Portugal uma nova proposta da Sociedade
Africana, mais conciliadora que as anteriores: a Internacional desistia então
de Nóqui, de Cabinda e Molembo e pretendia apenas a margem direita do Congo (69) – doc, n.º 72 à 89, p.100-113.
No dia 5 de Fevereiro
de 1885, a França assinava com a Associação uma Convenção em que reconhecia
esta como Estado amigo e se fixavam os limites da fronteira entre os dois
Estados. No dia seguinte JÚLIO FERRY
comunicava ao ministro de Portugal a sua assinatura e aconselhava Portugal a
aceitar a proposta da Internacional, em que ela renunciava a Nóqui,
Cabinda, Molembo e LÂNDANA.
Continuava o
presidente do conselho da França a afirma que Portugal não estava lá e que a
Europa não só, não queria que uma nação ocupasse todo o estuário do rio, mas
também preferia atribuir uma das margens à Sociedade Africana, «o
mais
fraco
de todos os Estados» (70)
– doc, n.º 90, p.114. Mas Portugal não queria deixar nas
mãos da Associação os portos de Boma e de Banana.
Tão grandes
divergências levaram o QUAI d’ORSAY
a transferir para Berlim a sua mediação e a confiá-la ali ao seu embaixador, o
barão de Courcel.
Se era certo que até
2 de Fevereiro não havia potencia Europeia, como tal, que defendesse
abertamente os interesses da Associação Internacional (71) –doc, n.º 92, pp.115-117,
a verdade também foi que dai em diante as várias Nações começaram a
impacientar-se com a demora que as negociações se iam arrastando.
No dia 3 de Fevereiro,
o barão de Courcel enviava ao marquês de Penafiel uma carta em que lhe dizia
que LORD
GRANVILLE o encarregara de manifestar o desejo do Governo Inglês
de que Portugal chegasse o mais cedo possível a acordo com a Internacional. A
Inglaterra conservava-se de parte até então, e tanto o subsecretário Alemão
como o embaixador Francês tinham assegura a Portugal que os seus governos não
exerceriam sobre Portugal pressão alguma.
Mas agora era a
França no dia 7 de Fevereiro (72),
e o Chanceler Alemão também no dia 7 de Fevereiro (73), a aconselhar Portugal
a que arrumasse quanto antes a questão com a Internacional. Todavia, enquanto
os Governos Francês e Alemão o tinham feito em termos muito amigáveis e
efectuosos, EDWARD B. MALET no dia 7
também de Fevereiro (74), segundo
as instruções de LORD GRANVILLE,
fê-lo num tom frio e seco ao modo de quem se esquecia das humilhações por que
passara no caso de Angra pequena, no abandono do TRATADO DO ZAIRE
a um simples aceno de BISMARK,
da tomada de KHARTUM por Madhi.
Portugal não podia
esperar mais nada dos seus velhos ALIADOS…
mas a atitude da Alemanha era de nítida compreensão e simpatia para com os
direitos de PORTUGAL em Africa, -fim…(75)
(72).-
Era do seguinte teor a Carta do Embaixador da França: «Monsier le Ministre; Je
suís charge par Lord Granville, à qui j’ai fait savoir que les négotiations
afin d’arriver à une entente entre le Portugal et l’Association Internationale
du Congo, se poursuivent ici, d’exprimer
à V.Ex la ferme opinion du Gouvernement de Sa Majesté, qu’il est désirable que
cette entente se fasse aussitôt que possible. J’ai en même temps l’honneur
d’informer V.Exe que Mr. Petre, Ministre de S.M. à Lisbonne, a été charge de
faire la même communication au Gouvernement de S.M. T.F.» Livro Branco sobre a
Questão do Zaire (II), doc, n.º 92 –C, pp.118-119.
(73).-
O Chanceler escrevia: « Le Gouvernement Impérial partage l’opion que le
Gouvernement Portugais ne devrait pas hésiterà s’arranger avec l’Association
sur cette base, en se désistant de toute prétention sur des territoires situés
au nord du Congo en dehors des 2 districtes susmentionés (Molembo et Cabinda)
auxquels le Portugal attaché une value particulière. En suivant ce conseil, le
Portugal aurait l’avantage de voir sa souveraineté reconnue sur des vastes
territoires oû elle était géneralement contéstée jusqu’á ce jur.» Livro Branco
sobre a Questão do Zaire (II), doc, n.º92-E, p.121.
(74).-
Ibidem, doc, n.º 92-D, pp119-120.
(75).-
Jornal do Commercio, n.º 9.350, de 27 de Janeiro de 1885.
Este texto descreveu
ao longo de 5 partes, toda a conversa que deu origem a conferência de Berlim e
a divisão de Africa que muitos Governantes, dizem que é aqui onde reside as
actuais fronteiras africanas em que reclamam o direito de territórios como uno
e indivisíveis, se formos honestos, sérios, sem espirito colonialista, as
fronteiras da conferência de Berlim 1884-1885 e as zonas de africa envolvidas
estão aqui bem documentadas, logo aqueles territórios que não conste das actas
ou das conversas de Berlim, são livres e independentes, não podem ser anexadas
nem reclamadas como direito de terceiros, esta prova e as suas fontes é
irrefutável.
Em 1945 começa a
descolonização dos países em Africa e em 1964, no Cairo
Egipto,
alguns chefes de Estados e Governos Africanos Independentes, produziram uma
resolução, denominada = AHG/16 =
baseada nos princípios de “Uti possidetis juris”
e, sucessão Jurídica de Estados recém independentes, que ficam obrigados de
respeitarem as fronteiras deixadas pelas Potências colonizadoras Europeias.
Os Europeus não
deixaram fronteiras em Africa, mas sim esferas de influências, ou zonas ditas
suas para o controlo do comércio internacional africano, isto sim é que é a
verdade, porque o colonizador não deixa fronteira, ele quer mais e mais
terrenos a custo zero, impondo a força a sua cultura, línguas e costumes,
algumas vezes com justificação, para a civilização dos indígenas…
Os graves “ERROS”
da
conferência de Berlim de 1884 – 1885, realizou-se
na
EUROPA
sem a presença de Africanos nem o seu consentimento, estes nem sabiam se quer, que
se estava a fazer uma conferência para lhes dividir ou criar países artificiais
e ditarem regras artificiais da sua convivência futura.
Terminado o texto
sobre “A
evolução política de Africa e a Lunda entre 1884 á 1891”,
os próximos textos serão dedicados a “ORIGEM DA CHAMADA
QUESTÃO DA LUNDA 1885 - 1894” que é desconhecida por muitos
leitores e ignorada por pesquisadores e historiadores africanos ou
colonialistas usurpadores.