SUMBULA : O GARIMPEIRO PCA DA ENDIAMA
Por Rafael Marques de Morais , abril 11, 2013 ·

Em Janeiro passado, o ministro da Geologia e Minas, Francisco Queiroz afirmou, em declarações à Angop que “a exploração ilegal de diamantes, atingiu proporções preocupantes no país” e “é imperioso combater a prática ilícita do garimpo, nos domínios da produção, comercialização [...]”.
Enquanto isso, da parte do governo e da comunicação social do Estado, não tem havido qualquer denúncia sobre o envolvimento de dirigentes no negócio do garimpo. Ao invés, a prática institucional tem sido responsabilizar apenas os garimpeiro.
Perante este silêncio, Maka Angola revela agora ao público mais um caso de corrupção e abuso de poder: a participação do Presidente do Conselho de Administração (PCA) da Endiama, António Carlos Sumbula, no negócio directo com garimpeiros, para seu enriquecimento pessoal.

A Endiama é a empresa estatal que detém, na qualidade de concessionária nacional, a exclusividade sobre os direitos mineiros de prospecção, pesquisa, reconhecimento, exploração, tratamento e comercialização de diamantes em todo o país. O Código Mineiro, como é conhecida a Lei n.º 31/11, estabelece, como obrigatória, a participação do Estado, através de uma empresa pública, nas sociedades comerciais que se dediquem à exploração e comercialização de diamantes ou outros minérios. Essa participação, por lei, não pode ser inferior a 10 porcento do capital da empresa comparticipada.
No entanto, a prática é outra. A 28 de Agosto de 2006, António Carlos Sumbula criou formalmente a empresa privada Mi Diamond, Limitada, com o seguinte objecto social: “comercialização de diamantes e outros recursos naturais, prospecção, pesquisa, produção de recursos mineiras, construção civil e obras públicas, agricultura, pescas, hotelaria e turismo e imobiliária”.
O capital social da empresa é detido, em 99 porcento, por António Carlos Sumbula, enquanto a um outro sócio, Miguel António Chambole, cabe simbolicamente um porcento do negócio.
A nomeação de Sumbula, em 2009, para PCA e director-geral da Endiama, marcou a implementação da Mi Diamond nas principais zonas de compra de diamantes produzidos por garimpeiros.
Para o efeito, a Mi
Diamond estabeleceu-se nas Lundas através de uma parceria com a Sodiam, empresa
detida pela Endiama em 99 porcento. O Instituto Angolano de Participações do
Estado (IAPE) detém o restante um porcento da Sodiam. Logo, a Sodiam é uma
empresa pública cujo conselho de administração é nomeado pelo Presidente da República.
É ilegal a parceria
entre a Sodiam e a Mi Diamond. António Carlos Sumbula está proibido, pela Lei
da Probidade, de ser sócio privado da Endiama, empresa que dirige enquanto
servidor público. A Sodiam é, para todos os efeitos, uma subsidiária da
Endiama. De um modo geral, a lei proíbe os gestores públicos de fazerem
negócios privados com o Estado para enriquecimento pessoal.
A 1 de Abril deste ano, o director nacional de Minas, Miguel Paulino, esclareceu à Rádio Nacional de Angola os termos do direito de exclusividade detido pela Sodiam na venda de diamantes. “A comercialização de diamantes é feita pela Sodiam, que é o canal único para vendas. É evidente que ela tem as suas parcerias e é no âmbito destas parcerias que surgem outros agentes, mas sempre associados à Sodiam”.
Em Cafunfo, no centro da zona mineira na província da Lunda Norte, a Mi Diamond passou a ter mais de 10 casas de compra. Estes “contuários”, como são chamados os postos de compra, são encabeçados por cidadãos libaneses, um belga, um francês e um brasileiro. O principal impulsionador no estabelecimento da rede de negócios de Sumbula com os garimpeiros foi o então Boss Mouien, um libanês que se assumia como o principal comprador de diamantes do garimpo no Cuango. A empresa de Sumbula também tem contuários no vila do Cuango, em Xamiquelengue e Muxinda, outros postos de grande actividade do garimpo.
O esquema de compra de diamantes do garimpo, até à presente data, é simples. O garimpeiro vende os diamantes à Mi Diamond sem qualquer registo de transacção e a preço de cartel. Estes valores de compra são acordados entre os vários contuários, em prejuízo dos garimpeiros, e sem qualquer correspondência ao valor real dos diamantes transaccionados.
“Se o garimpeiro entregar uma pedra de grande valor, para pesar, o comprador da Mi Diamond pesa e tranca logo o diamante no cofre e discute com o vendedor o preço que ele impõe. Se o garimpeiro recusar, então o comprador confisca a pedra. O garimpeiro não tem nenhum direito”, explica o activista local Salvador Fragoso.
Por sua vez, o Corpo de Segurança de Diamantes, que emite as credenciais dos compradores da Sodiam e da Mi Diamond, não fiscaliza a acção destes. Há ainda o envolvimento directo de compradores, como o belga Cixten, como é conhecido localmente, no patrocínio directo de grupos de garimpeiro, sobretudo nas áreas de Kavuba e Ngana Canga.
A ausência de registo de transacções facilita o desvio das pedras de maior valor para a República Democrática do Congo, através de correios humanos, e a perda incalculável de receitas para a estatal Sodiam, que deveria comercializar toda a produção no exterior do país. Essa prática viola o Sistema de Certificação de Kimberley, que exige o registo de todas as transacções de diamantes desde a origem, incluindo a primeira venda após a sua extracção. O Sistema de Kimberley é um processo de certificação que visa eliminar a introdução de diamantes de sangue no mercado internacional.
O envolvimento dos compradores no patrocínio ilegal de grupos de garimpeiros viola também o Código Mineiro, que proíbe a aquisição de diamantes produzidos por garimpeiros ilegais. No entanto, a Mi Diamond continua a comprar deste grupo, uma vez que os garimpeiros licenciados são em número simbólico e ainda sem áreas definidas de exploração artesanal.
Para além de todas esta ilegalidades, acresce, de forma inequívoca, o crime de corrupção e a violação da Lei da Probidade, uma vez que Sumbula acumula um cargo público, de PCA da Endiama, com a função privada de sócio-gerente da Mi Diamond, que mantém até à data presente.
A Lei da Probidade também proíbe os gestores públicos de fazerem negócios com entidades estatais, no exercício das suas funções, para enriquecimento pessoal.
Nem a Direcção Nacional de Investigação Criminal (DNIC) nem a Procuradoria-Geral da República se dignaram até ao momento a investigar mais estes crimes públicos.
Sumbula goza do alto patrocínio do Presidente da República e do ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança da Presidência, general Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, pelo que as suas contravenções à lei são plenamente justificáveis e aceites.
O próprio Presidente José Eduardo dos Santos autorizou, formalmente, em 2000, a constituição da Ascorp, uma empresa em que a sua filha Isabel dos Santos detinha 25 porcento do capital, inicialmente como cartel exclusivo para a compra de diamantes do garimpo. A Endiama mantém igual percentagem no negócio, enquanto Lev Leviev e o israelita Sylvain Goldberg, repartem a outra metade do negócio. Em 2004, Isabel dos Santos, preocupada com a sua imagem, transferiu as suas acções para a titularidade da sua mãe Tatiana Kukanova Cergueevna Ragan.
Pessoalmente o general Kopelipa também está envolvido no negócio dos diamantes, como sócio da Lumanhe, um empresa constituída exclusivamente por generais que, por sua vez, é sócia da Endiama em vários projectos diamantíferos nas Lundas.
No Cuango, a Sociedade Mineira do Cuango, no qual a Lumanhe é detentora de 21 por cento das acções, os seus sócios e gestores são responsáveis por graves violações dos direitos humanos contra garimpeiros e membros das comunidades locais, incluindo homicídios, tortura e expropriação coerciva de terras aráveis.
À luz do modelo político de corrupção institucional que norteia o governa do Presidente José Eduardo dos Santos, quem merece a sua confiança ou sirva os seus interesses é brindado com o selo da impunidade.
Ironicamente, os maiores garimpeiros de Angola são aqueles no poder.