domingo, 10 de julho de 2011

A PENETRAÇÃO EUROPEIA NA LUNDA ATÉ 1890 – PARTE V

Mapa da cidade da Mussumba do Imperio LUNDA 1885 - 1894


A PENETRAÇÃO EUROPEIA NA LUNDA ATÉ 1890 – PARTE V

O texto que temos vindo a publicar, esta bem claro que as expedições europeias na Lunda, eram meramente de caracter ciêntifico, estudos etnograficos e história tradicional dos povos sob dominio do Muatiânvua, outros ainda estavam interessados pelo comércio de marfim, porque a partir do ano de 1880 já não existia mais o comercio de escravatura, em nenhum momento havia intenções de ocupação colónial por parte, seja ela de Portugal, da França, da Alemanha ou da Inglaterra, no Império LUNDA do MUATIANVUA.

5.- ESTRANGEIROS EM EXPEDIÇÕES NO INTERIOR DA LUNDA
5.1.- DR. PAUL POGGE E A. LUX
5.1.2.- O INTERESSE SOBRE A LUNDA 1875

Não havia interesses especificos na Lunda de nenhuma potência Europeia. O interesse maior sobre a exploração da Lunda começa no ano de 1875, uma terra desconhecida e mal estudada há menos de 9 anos para a realização da CONFERÊNCIA DE BERLIM de 1884-1885.

As terras da Lunda eram até então alheias às preocupações dos exploradores estrangeiros, mormente a Europa. E, porque eles eram a guarda avançada dos interesses politicos dos seus Estados, não podiam estes alimentar, por isso, ambições sobre os territórios do Muatiânvua. No entanto, a partir de 1875, principiam a entrar na LUNDA expedições de estrangeiras Europeias, Alemães e Belgas sobretudo, expedições essas que estão na base das reivindicações que vieram a anunciar-se a seu tempo (A QUESTÃO DA LUNDA 1885-1894) e que parecem explicar os meandros bem tortuosos por que passou a DELIMITAÇÃO DE FRONTEIRAS DO ESTADO INDEPENDENTE DO CONGO na conferência de Berlim – tratado de 14/02/1885.

A Lunda foi tida durante muitos anos como um dos maiores armazéns de marfim de toda a Àfrica.

A pouco a pouco, com a caça indiscriminado que se davam ao elefante, este animal foi rareando e internando-se cada vez mais para norteste. Em 1859, segundo relatos, ainda se caçava entre o Cuilo e o Lulua, do 9º da latitude sul para o norte. Em 1868, já os caçadores não encontravam elefantes senão para lá do Chicapa e nos territórios de MUSSENVO, do 8º de latitude sul para o norte; dez anos depois, só nas bandas do 7º.

Mas o Muquengue (terras do lubuco) continuavam ainda abundante de marfim. Talvez isto explique um pouco certas preferências de exploradores, comissionados de sociedades de geografia e de casas comerciais europeias, alcançarem o lubuco depois de 1876.

Durante muitos anos, mesmo após a abolição do infame tráfico da escravatura, as caravanas comerciavam assim; levavam da costa atlantica ou indica produtos e trocavam-nos por escravos e marfim, e eram os próprios escravos que conduziam depois o marfim. Era deste modo que TIPPU-TIB fazia o seu negócio...

Abolido o tráfico dos escravos negros, os Europeus deixavam de contar com os réditos que dele advinham, e foram-se só em busca de marfim, borracha e demais produtos que a África podia oferecer de interesse. Mas agora urgia tratar o comércio por modo diferente. Era dificil o engajamento de carregadores. Era preciso ocupar, instalar armazéns de compra e venda e drenar os produtos para a costa por outros processos.

Além disso, mas valia ter a propriedade do que a posse ou o seu uso. Poe isso, os Estados Europeus se lançaram em Africa numa furiosa corrida, que sabia aliar aparentes intenções altruistas com evidentes intuitos politicos e comerciais.

Foi grande o desapontamento de STANLEY quando verificou que à saida do Zaire havia cataratas... Se as suas intenções eram diferentes, era para alargar-se, pois que as cataratas são o maior deleite que um rio pode causar aos homens...

5.1.2.- O INTERESSE SOBRE A LUNDA A PARTIR DE 1875

O certo é que a partir de 1875, a Lunda começou a despertar a «curiosidade» dos Europeus que iam a África também para explorar.

Durante muitos anos os BÂNGALAS opunham em Cassangue séria oposição à passagem de caravanas, mesmo que fossem pequenas comitivas de Ambaquista (Ambaca), Calandulas, Bondos ou outros nativos Africanos ou Brancos vindos da província de Angola para a Lunda, com o receio de concorrência no interior.

Até 1882, as expedições portuguesas da provincia de Angola para a Lunda que pretendiam atravessar o rio Lui e o Cuango para lá, faziam-no no porto chamado do Caminho grande, o caminho de Quimbundo, ou de Munene Quissesso [Senhor Machado (Saturnino)]. Mais ao norte, perto de Quitamba-cá-Quimpungo, de Ambanza IMBUA, havia um outro porto, onde algumas comitivas passavam sem dificuldades levantadas pelo Ambanza (Descrição da viagem á Mussumba do Muatiânvua, vol. I, p.273).

5.1.3.- DR PAUL POGGE E A: LUX

Em 1875 o Dr Paul Pogge e o tenente A. Lux, passaram no primeiro porto no Lui e Cuango. Iam estes dois exploradores da parte da Sociedade de Geografia de Berlim. Entraram na província de Angola com a protecção do Governo Português. Dirigiram-se a Malanje, e ali encontraram a hospitalidade e a protecção da casa comercial dos irmãos Machados e souberam, com grande pasmo, que « todos os portugueses (dali) estavam em directas relações comerciais com os principais potentados de todo o Estado da LUNDA e com o próprio imperador Muatiânvua e tinham de aprender a língua portuguesa para se poderem fazer compreender naqueles estados.

Acompanhados por negociantes ambaquistas, rumaram em direcção ao Muana Tximbundo (monaquimbundo) onde tiveram hospedagem na feitória de Saturnino Machado.

O tenente A. Lux regressou, e o Dr Paul Pogge, com pombeiros deste comerciante e com o Cacuata Vunje, então Xanama do Cassai e súbditos, portanto, do Imperador Muatiânvua, dirigiu-se à Mussumba pelo caminho antigo, bem trilhado pelas caravanas comerciais portuguesas. O próprio Saturnino recomendou o Dr Paul Pogge ao seu enviado na Mussumba, o velho Lourenço Bezerra, para que estivesse sempre ao seu lado e o avisasse de tudo quanto se passasse na Corte do Imperador Muatiânvua que lhe dissesse respeito.

Em 1876, um ano depois, o Dr Paul Pogge retira, sem poder passar à outra costa, o indico como era seu desejo. Promete voltar com um companheiro que se dispusesse a fazer esta travessia, e, com esse intento, volta a Berlim.



5.1.4.- OTTO SCHUTT E SILVA PORTO

Em 1877, chega a Malanje, recomendado a Custódio Machado, outro explorador Alemão comissionado da Sociedade de Geografia de Berlim. Era Otto Schutt, que se propunha ir também à Mussumba.

A conselho de Machado, quis seguir outro caminho, por o antigo estar explorado, não haver nele comércio e estar infestado de Tchokwes salteadores de caravanas. Pretendeu passar, mas não o conseguiu, não obstante ter pago avultadas quantias de fazendas. Aborrecido, retirava já para Malanje, quando no caminho encontrou Saturnino Machado e seu empregado João de Carvalho (vulgo João da Catepa), que o animaram a prosseguir.

Por influência deste passou o Cuango, e, com o João da Catepa, chegou a Muana Tximbundo (Mona Quimbundo ou Muatximbundo). Daqui rumou pela margem direita do Rio Chicapa, na companhia de João, a quem depois dispensou de o acompanhar, por se julgar seguro e certo de atingir a Mussumba.

Mas os carregadores, ao ouvirem falar do negócio do Lubuco, convenceram Schutt a desistir da Mussumba e a ir antes ao Muquengue. Ao chegar à sanzala Mahi Munene, este não o deixou passar o Cassai, por querer fazer ele o negócio com Schutt. Entretanto, chegou ao Luachimo o Muata Mussenvo e, procurando o explorador, participou-lhe que o Imperador Muatiânvua, que tinha muito marfim para lhe dar, o mandava ir, e que a oposição do Mahi provinha apenas da ordem do Muatiânvua para não deixar passar nenhum Branco com receio de os canibais o comerem, e «ele não queria ter má fama como Muene Puto».

Todavia, tudo isto causou tanta perplexidade em Otto Schutt que, quando numa noite ouviu um tiroteio de fusilaria, o tomou por ameaça à sua pessoa, e retirou.

Ainda antes, ao passar o 9º de latitude para o norte, os Tchokwe de Sua Majestade Muatchissengue disputaram-lhe a passagem e a pendência arrastou-se por dias. Estava então já perto de si uma grande caravana de Silva Porto que, vindo da sua casa do Bié, subia pelo Chicapa. Mas, quando este chegou a Sua Majestade Muatchissengue (Watembo), já Otto Schutt regressava a Malanje.


Silva Porto deixou no potentado Muatchissengue parte das cargas e atravessou o Luachimo, o Chiúmbue e o Chicapa, e no Estado de Congolo, recebeu a companhia de António Bezerra. Atravessam de novo o Chicapa, em Anguina Ambanza, segue o Luachimo, depois o Chiúmbue, passam o Cassai no porto de Cambundo Mulonde, chefe de um grupo de Bachilangues, e continua para o norte até 5º de latitude sul.

Com os Tchokwes manteve Silva Porto boas relações. No Lubuco, fez negócios com os Balubas, Baquetes, Bacubas, e ali encontrou um grande número de angolanos do norte do Cuanza. Dr Otto Schutt não teve nenhum encontro com a Mussumba.

5.1.5.- DR MAX BUCHNER E SUA MAJESTADE MUATCHISSENGUE

Em Dezembro de 1878 desembarcava em Luanda o Dr Max Buchner, comissionado pela Sociedade Africana Alemã, que fazia parte da Associação Internacional, fundada pelo rei dos Belgas LEOPOLDO II.

De Luanda dirigiu-se a Malanje, recomendado pela secção africana da Sociedade de Geografia de Berlim a Custódio Machado. Aqui aprendeu os indispensáveis rudimentos da língua portuguesa e, em fins de Julho de 1879, seguiu para Muana Tximbundo, onde foi hospedado por Saturnino Machado.

No potentado Muatchissengue teve que travar luta com os Tchokwes, que intentavam impedi-lo de continuar para a Mussumba na corte do Imperador Muatiânvua. Ajudado pelos 40 negociantes ambaquistas que se tinham agregado à expedição, conseguiu impedir o ataque, e o potentado Muatchissengue propôs a PAZ.

Dr Buchner seguiu avante, e, no dia 10 de Dezembro de 1879, quatro meses e meio depois da partida de Malanje, entrava na Mussumba do Muatiânvua, depois de atravessar os rios Lui, Cuango, Cuilo, Chicapa, Luachimo, Chiúmbue, Luembe, Luia, Cassai, Lulua e Luisa.

Na corte do imperador Muatiânvua, que era então XANAMA, não gostou o Dr Max Buchner da maneira de fazer negócio. Era uso negociar o comerciante a sua «factura» com o potentado: entregar-lhe toda a fazenda e aguardar pacientemente o pagamento. Deste modo, o negociante ficava na dependência dele para retirar.

E, porque este Muatiânvua era «talvez mais avarento do que seus antecessores», não ouviu com agrado os planos do Dr Max Buchner de ir dali ao Cassongo de Cameron (Nhangoé) e sair pela costa oriental. « Lá não se pode ir, há muito má gente, muito feitiço e fome. Lá, tu vais morrer e depois os brancos dizem que fui eu que te matei» - disse-lhe o Muatiânvua. E, não pode Dr Max Buchner realizar o seu intento de sair pela outra costa.

Dr Max Buchner demorrou seis meses na Mussumba, e aproveitou o cacimbo para empreender a sua viagem de regresso.

Atravessou o Lulua e rumou para noroeste. Partindo do CAUNGULA, na margem do Lóvua, intentou penetrar nas terras do Muata Cumbana, para descer pelo Luangue até ao Zaire e alcançar a costa Atlântica. Mas os tucuatas, que por ali andavam por via de uma revolta havida dias antes por cobrança dos tributos, intimidaram os carregadores com a ideia de virem a ser comidos pelos canibais e incitaram os Tucongo a fazer-lhe guerra.

Dr Max Buchner não teve outra alternativa senão a de regressar a Malanje pelas terras de CAPENDA CAMULEMBA.

Em Fevereiro de 1881estava ele em Malanje e, no dia 1 de Setembro do mesmo ano, era recebido em Luanda na SOCIEDADE PROPAGADORA DE CONHECIMENTOS GEOGRAFICOS AFRICANOS, onde pronunciu discurso de agradecimento aos Portugueses e relatou a sua viagem no interior da LUNDA.