terça-feira, 16 de agosto de 2016

A lenta agonia dos jornais privados angolanos

A lenta agonia dos jornais privados angolanos



Os jornais privados angolanos enfrentam dificuldades financeiras para se manterem no mercado. Com a crise económica, os custos de produção subiram. Os responsáveis dos jornais queixam-se da falta de apoios do Estado.



A atual situação financeira que o país vive esteve na base do encerramento de vários jornais tradicionais como o "Agora", o "Angolense", "A Capital", entre outros. O mais recente caso de semanários falidos é o caso da “Visão”, que não teve capacidade de sobreviver na atual conjuntura.



Outros jornais como o “Manchete", o "Liberdade" e o "Folha 8” (este último pioneiro na imprensa privada em Angola) imprimem exemplares "em miniatura", ou seja, em dimensão reduzida e, na maioria das vezes, sem a qualidade exigida.



Custos de impressão elevados



Em Angola os custos para a impressão de um jornal são considerados muito elevados. Numa gráfica angolana, a edição de três mil jornais pode facilmente custar cerca de um milhão de kwanzas (o equivalente a cerca de cinco mil euros).


A Lei de Imprensa em vigor prevê a atribuição de subvenções a órgãos privados por parte do Estado, mas apenas alguns meios de comunicação social beneficiam, de facto, desses mesmos apoios.



Albino Sampaio, chefe de redação do semanário “Liberdade”, lamenta o facto de o governo não prestar apoio a todos os órgãos independentes como, manda a legislação.


“Infelizmente, daquilo que sabemos, o Estado só entregou dinheiro a Ecclésia", afrma o jornalista. "Temos dificuldades em mantermo-nos no mercado, principalmente neste período, em que as gráficas aumentam os seus preços consideravelmente. Temos, pois, encontrado imensas dificuldades. Temos de multiplicar os esforços com vista a nos mantermos no mercado”.




Dificuldades de acesso a papel



O acesso ao papel para a impressão de jornais está difícil nas gráficas de Luanda. A situação levou à diminuição das tiragens da maior parte dos jornais privados angolanos. Outro problema: a falta de publicidade institucional.


Francisco Kabila, diretor geral do semanário “Manchete”, disse à DW Africa que a perda de poder de compra dos leitores também se associa a este problema.


“Nós já não vendemos ou não colocamos a disposição dos leitores o número de exemplares que colocávamos, por exemplo, há um ano ou há nove meses. Os leitores também perderam o poder de compra. No entanto isto obrigou a que o Manchete fizesse uma engenharia, no sentido de se reduzir a sua tiragem, mas continua a fazer chegar a informação aos seus leitores semanalmente”.


Nova lei agrava situação

O exercício da atividade jornalística está em crise em Angola, e a situação provavelmente agravar-se-á com a entrada em vigor do pacote legislativo que poderá vir a ser aprovado já esta sexta-feira, 12 de agosto de 2016, na Assembleia Nacional.


Os diplomas legais têm sido contestados pela classe jornalística que acusa o poder político de pretender restringir a liberdade de imprensa no país.


A futura legislação prevê, entre outras situações, a obrigatoriedade de as rádios e estações televisivas publicarem em direto as mensagens do Presidente da República.


Falando num colóquio sobre imprensa realizado, na última quinta-feira (10.08), pelo MISA-Angola (Instituto de Comunicação Social da África Austral, órgão independente de acompanhamento dos media, criado no âmbito de um projeto apresentado pela UNESCO), o jornalista Ismael Mateus disse que a nova lei pode constituir uma “intromissão abusiva na autonomia editorial dos órgãos”.



“Aparentemente isto é tranquilo. Só que não é tão tranquila assim. É, sim, uma intromissão abusiva na autonomia editorial. Quem decide o que transmite e o que não transmite é o editor e não devemos abrir mão disso. Ninguém nos pode obrigar, por lei, e impor o que devemos transmitir”, conclui o jornalista sénior angolano, Ismael Mateus.