sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

DOIS DISCURSOS, UM SÓ PENSAMENTO – MIHAELA WEBBA KOPUMI

DOIS DISCURSOS, UM SÓ PENSAMENTO – MIHAELA WEBBA KOPUMI





Luanda - Ao terminar o ano de 2013, o Presidente da UNITA, Isaías Samakuva, propôs ao País a abertura de um novo processo constituinte para a celebração do contrato social angolano, visto que, como afirmou, “quer a proclamação da independência, em 1975, quer a assinatura dos Acordos de Paz, em 1991, quer ainda a subscrição do Memorando de Entendimento do Luena, em 2002, não produziram o Contrato social angolano”.



Isaías Samakuva e Lopo do Nascimento:  Dois adversários unidos em torno de duas teses fundamentais



Samakuva não podia ser mais claro e objectivo sobre as razões para tal proposta, quando afirmou: “Quando a Constituição é pisada todos os dias por quem a devia proteger, quando o futuro dos filhos de uma Nação é sequestrado por quem o devia garantir; quando o Governo entra em conflito aberto com o povo e passa a violentar a dignidade da pessoa humana; quando a Presidência da República se torna o epicentro da corrupção; enfim, quando o Estado deixa de ser uma pessoa de bem e passa a viver à margem da lei e da ética, devemos concluir que a República ruíu e o Estado faliu. A Nação precisa de celebrar um novo Contrato social”.



A classe política e seus críticos da sociedade civil, não reagiram. Fiquei triste, porque esta foi, creio, a proposta mais profunda e objectiva que já ouvi para a gênese dos problemas do país.  “Não perceberam, ou quê?” – perguntei-me.  Finalmente, na passada semana, e para minha agradável surpresa, uma voz se fez ouvir.  Pela primeira vez desde que nasci, na década da independência, ouvi um político do MPLA a responder com igual profundidade e angolanidade ao pensamento político da UNITA, segundo o qual “os angolanos precisam de construir a sua nação”.



"Criamos os Estados, fizemos os Governos, mas falta criarmos a Nação,” disse Lopo do Nascimento, dirigindo-se supostamente aos jovens: ”Os vossos pais, os vossos avós meteram-se na trilha da libertação que levou à independência de África. Agora é altura de vocês meterem-se na trilha da construção da nação".



Não entendi as palavras do Mais Velho Lopo como um simples discurso de despedida ou uma mera ‘mensagem aos jovens Deputados’. Pelo contrário. Entendi-as como um posicionamento claro de um patriota que pretende não só assumir as suas responsabilidades históricas como também contribuir para a construção do futuro. Primeiro dentro do MPLA, posicionando-se como líder de uma corrente nacionalista e patriótica. Depois, como ‘construtor dos alicerces da Nação’.



Comparei então os vários pronunciamentos de Samakuva, ao longo dos últimos meses com o único pronunciamento de Lopo e encontrei as seguintes ideias convergentes: “Precisamos de uma nova matriz política, uma nova matriz económica, uma nova matriz social para a construção da nação angolana”, afirmou Samakuva. “Temos de pensar em novos modelos, novos rumos para a África”, respondeu Lopo. “Não há saída para os problemas de Angola a não ser na democracia. Só a democracia, a mais auténtica que conseguirmos construir, poderá resolver os problemas de Angola”, asseverou Samakuva. “as eleições são necessárias, mas não são suficientes”, respondeu Lopo.



Lopo procurou explicar a exclusão (que o MPLA pratica) com a natureza étnico-linguístico-cultural de muitos partidos políticos: “...As eleições são um processo de exclusão, e precisamos em África de processos de inclusão....Em África, a maioria dos partidos são muito assentes numa base étnico-linguístico-cultural de modo que quando as eleições excluem um Partido não é uma organização política que está a ser excluída mas sim um grupo social étnico-linguístico-cultural; é esta exclusão resultados de processos eleitorais fomentados do Norte que está na base de muitas situações que temos no continente”.



Na resposta de Samakuva, está  implícita a tese de que as eleições só serão excludentes se não forem democráticas: “A democracia é inclusiva por natureza, por isso não pode excluir ninguém. A democracia é o único regime político que nos permite divergir sem perder a capacidade de nos unir. Se juntos fomos capazes de construir as Forças Armadas Angolanas –FAA, juntos seremos capazes de construir as autarquias, as regiões autónomas, o Tribunal Eleitoral, as autoridades administrativas independentes, a Alta Autoridade Contra a Corrupção e outras instituições da nova República. E quando digo ‘juntos’, não me refiro apenas à UNITA e ao MPLA, mas a todas as forças patrióticas do país, no litoral, no interior e na diáspora”- afirmou Samakuva.



Lopo parece não discordar com o essencial: nós é que precisamos de construir ‘a nossa democracia, as nossas instituições, a nossa matriz, o nosso modelo: “Vocês, jovens, têm de estudar em conjunto novos rumos para África, e não serem meros papagaios repetindo o que vem do Norte".



Samakuva reconheceu que as transformações que o país reclama são profundas e, por isso, concorda com os que advogam a necessidade de uma ‘revolução democrática’ para Angola. Tal revolução começa nas nossas mentes e objectiva criar “os fundamentos da nova República”, consagrar “as opções para se efectivar, de facto, a reconciliação nacional”; definir “os caminhos a trilhar para a despartidarização e refundação do Estado”; consagrar o quadro institucional para a “gestão da transição para a nova República”; “construir instituições democráticas sólidas” e acordar “o calendário de implementação das reformas políticas, económicas e culturais”. Estes são, segundo Samakuva, os conteúdos do novo contrato social angolano para a construção da nação.



Lopo, naturalmente, não foi tão objectivo, mas, no essencial, foi igualmente profundo ao reconhecer que há necessidade de uma discussão profunda das questões verdadeiramente importantes para o país: “A nação não é de nenhum partido, é obra de todos e pertence a todos, e quanto mais um País africano avançar na construção da Nação, menor será a possibilidade de surgirem as crises que têm afectado o nosso continente... "”..O futuro deste país, cujo presente custou sangue, suor e lágrimas está nas vossas mãos, e vocês, jovens, não podem perder-se em discussões de infantários, que apenas vos dividem e impedem posições de acções comuns em relação ao que é verdadeiramente importante para o futuro do país".



Isaías Samakuva e Lopo do Nascimento, dois nacionalistas, dois Partidos, dois discursos, mas um só pensamento. Dois adversários unidos em torno de duas teses fundamentais:


1- Celebrar o contrato social angolano para a construção da nação é tarefa prioritária, de todos, e dispensa disputas partidárias.


2- A conquista da democracia plena antecede as disputas eleitorais. 
Se Lopo for capaz de transformar as suas teses em teses do MPLA, Angola sairá a ganhar. Aliás, só assim se poderá apreciar a bondade das palavras do Presidente da UNITA sobre o MPLA: “Angola precisa do MPLA, mas já não precisa de JES”.


Afinal, é possível construir a unidade das forças patrióticas para resgatar a Pátria, refundar o Estado e construir a Nação, tal como propus, em Junho de 2011, na Conferência sobre «Transparência, Corrupção, Boa Governação e cidadania em Angola», quando dissertei sobre  «A construção da Democracia e o fenómeno da corrupção na República de Angola».


Aguardo, ansiosamente, que outros nacionalistas se manifestem. 
Viva Angola.